19.4.08

Sobre o entretenimento

Devido à discreta polêmica causada pela descrição de meus sonhos e seus temas, entre eles a literatura de entretenimento, faço alguns esclarecimentos.
1) Não sou uma erudita em termos literários, ao contrário. Ler, para mim, é, antes de tudo, prazer. O que me entedia, só leio por obrigação profissional ou educacional, jamais para meu engrandecimento pessoal. Estou na metade de minha vida útil e não gosto de perder preciosas horas com aborrecimento.
2) A gente tende a considerar literatura de entretenimento aquilo que é produzido descompromissadamente. Para surpresa dos nossos intelectuais mais embasados, os países onde literatura é consumida em larga escala, os livros que mais vendem são os de "entretenimento", tais como O Caçador de Pipas ou O Código da Vinci. Vez por outra, entram na lista de best sellers obras de escritores de maior profundidade. Mesmo a lista de não-ficção fica coalhada de biografias. E sempre que vemos turistas estrangeiros de livro na mão, eles estão sempre com um romance bobalhão, um thriller, algo sem tanto conteúdo assim.
3) Sou ardorosa fã de policiais, dos grandes (Hammet, Chandler, Patricia Highsmith, Ruth Rendell e Agatha Christie, indispensável na formação do jovem leitor) aos menores, como o Mistério Magazine de Ellery Quinn. Aliás, tive minha fase Erle Stanley Gardner, e li muitos autores tipicamente "pulp fiction". Ou seja, sou uma consumidora assídua de entretenimento, sim.
4) Quando menina, li muita fotonovela no quarto das empregadas, e muita Barbara Cartland e outras grandes autoras de romances rosa de péssima qualidade. Comprei muita Sabrina, Júlia e outras publicações mulherzinha de banda de jornal (tudo escondido de meus pais, cultérrimos).
5) O contato com boa literatura contemporânea e clássica me tornou uma leitora exigente. Cansei de ser vítima de presentes bem-intencionados, porém inócuos, como a obra completa de Sidney Sheldon (um grande roteirista de TV - fez Jeannie é um Gênio - e que ganhou um Oscar pelo roteiro de uma comédia com Cary Grant e Myrna Loy - não me lembro o nome). Os livros dele são daqueles perfeitos para a leitura em férias chuvosas na praia. Eu adorava ler também as coletâneas de best-sellers resumidos da Seleções do Reader's Digest.
6) Posto que não sou uma leitora tão cult assim, devo dizer que acho melhor que se leia qualquer coisa, para exercitar raciocínio e facilitar as sinapses do que render-se apenas à TV. Mas, infelizmente, minha dependência química da leitura não chega ao ponto de me levar à leitura de Paulo Coelho. É o mesmo que ouvir canções sertanejas. Para mim, funciona como lobotomia cultural.
7) Agatha Christie, descrevendo um personagem em uma de suas histórias, fala "ele lia policiais e biografias". O interlocutor conclui, então: "Ah, era um leitor comum". É isso que eu sou, embora minha leitura não se limite a dois gêneros. Porque a arte, mais do que nos levar a refletir, a registrar momentos históricos ou apenas a nos fazer suspirar, tem é que divertir, intrigar, interessar, provocar, exigir reações. O que nem sempre se consegue com um simples desfile de teses.

3 comentários:

Eduardo Graca disse...

Só para matar as saudades: ilhado em mais um hotel em Los Angeles, estou me deliciando com 'Dois Irmãos', de Milton Hatoum, vc já leu? Estou nas páginas finais, já triste por saber que a história está para acabar. Beijos hollyúdicos!

Jôka P. disse...

Também li muitas fotonovelas e a tal literatura de escada de serviço.

Anônimo disse...

Pois é, Olga, é que durante muito tempo essa dita "literatura de entretenimento" fez muito a minha cabeça. Comecei nos quadrinhos norte-americanos, o que foi um pulo para a ficção científica, gênero sempre considerado menor. Tinha uma certa vergonha em admitir esses gostos, quando entrei para a vida universitária. Depois desencanei.

E outro dia estava vendo um documentário sobre Mário de Andrade e o professor e poeta Frederico Barbosa falou uma coisa que me agradou muito ( era mais ou menos isso): "é preciso ler Macunaíma porque aquilo é muito divertido". Ou seja, além de ser uma obra formadora da literatura brasileira, também pode ser apenas entretenimento.

Mas você se referia aos livros orientados pela lógica do mercado, feitos de forma quase industrial, por exemplo, alguns best sellers. Isso dá margem para muita discussão e esse comentário já está muuuuito longo. Um abraço.