24.3.09

Breu

Então, tá combinado! Dia 28, quem quiser aparecer, apague a luz de casa entre 20h30 e 21h30, no evento monumental A Hora do Planeta. É pra conscientizar todos quanto à importância de economizar energia e preservar o meio ambiente. O Cristo ficara às escuras. O Pão de Açúcar também. E a orla de Copacabana também.
Ou seja, o bairro, que já anda em guerra, terá uma área escurinha, bem propícia a assaltos.
Operadoras de telefonia anunciaram que vão apagar as luzes de seus edifícios-sede. Será que aquela árvore de Natal que é o edifício da Petrobrás ficará acesa? A matéria no Globo On diz que boutiques internacionais uma empresa que promove viagens a locaisde luxo se envolveu de "forma criativa" na campanha, encarregando-se de celebrar a Hora do Planeta em locais remotos da África, "inclusive em reservas silvestres e no Rio Nilo".
Já abracei a Lagoa, já vesti roupa preta quando o Collor pediu que todos usassem verde, mas, na boa, tô muito velha pra esse oba-oba sem sentido. Cansei dos deslumbrados. Sou do tempo em que no Brasil até minuto de silêncio era vaiado.
Agora, só me elucidem uma dúvida: reserva silvestre tem iluminação?

20.3.09

Olha o outono aí, gente!!!


Refrescou, sim. Mas no supermercado, o clima é sempre esquentadinho.
Vejo a velhinha, imediatamente me sinto condoída. Solitária, roupinhas surradas, conta uns trocados no porta-níqueis. Velhinha sempre tem porta-níqueis.
Empurro meu carrinho, passo ao lado da velhinha. Minha bolsa esbarra nela, eu me viro para pedir desculpas e ouço uma sequência impublicável de impropérios.
A frágil figura se vira para mim e grita: "Falta de educação!!! Vai se ... Esse supermercado já é um inferno. Vem você, com seu carrinho e seu peso pra cima de mim. Vai tomar no ..".
Indignada, bradei: "Foi apenas a minha bolsa que encostou na senhora e eu já me desculpei. Sua idade não lhe dá o direito de ser grosseira e sair ofendendo os outros, não".
E a velhinha seguiu com sua ladainha, despejando uma torrente de palavrões pelos corredores.
Agora, pode ser velhinha, pode ser esclerosada, mas tinha que me chamar de gorda, pô?

Simplesmente Feliz


O release de Simplemente Feliz anuncia o filme como uma comédia sobre diversão, procura de amores e aproveitar a vida.
Comédia de Mike Leigh é para deixar qualquer um com um pé atrás. É claro que Simplesmente Feliz não tem qualquer cena hilariante. A personagem é tão viciada em alegria que tira o humor e o ânimo de boa parte da platéia. Não que o filme seja longo. Tem cenas deliberadamente entediantes, uma sequência inexplicável, outra didática - a visita das doidivanas, porém cumpridoras de seus deveres, à casa da irmã careta. E cenas tensas, sempre com Eddie Marsan ao volante ou ensinando a dirigir. Um instrutor de direção talhado para o trânsito carioca.
Sally Hawkins dá um show. Sua Poppy chega a ser desconcertante, na sua busca por diversão. Uma balzaquiana que se veste como adolescente amalucada, patética no riso fora de hora e de lugar, que só fica séria quando precisa resolver problemas graves. Descerebrada, sem conteúdo, numa vidinha besta e aparentemente imatura. Mas é a vida que ela escolheu. E isso o filme defende bem, o direito de se viver da forma que mais agrada a cada um, mesmo que irrite um pouquinho quem está por perto.

Seis graus de separação

Tive uma criação democrática e humanitária. A imbecilidade humana era vista como doença a ser tratada, mesmo que isolada. Tortura, pena de morte, linchamento nunca foram aceitos, sequer para punir quem cometia barbaridades.
Nos noticiários on line colho as mais terríveis opiniões sobre o caso do psicopata austríaco que manteve a filha e os netos/filhos em cativeiro. Além de odes à morte com requintes de crueldade como pena ideal a ser inflingida ao monstro - eu não sei o que é pior: estuprar uma filha seguidamente ou manter uma família isolada do mundo -, sempre há analogias com a política brasileira.
O que me impressiona é que a menção de que o psicopata sugeriu usar sua casa como museu, para angariar fundos e sustentar a família (esse cara está em êxtase absoluto por haver atraído a atenção do mundo inteiro) dá margem a paupérrimas e descabidas analogias com os desmandos e roubalheira dos políticos brasileiros. Sim, tudo na vida pode ser ligado a política, mas a pobreza desses sofismas mostra que há algo de muito perverso na ausência de educação de nosso povo, que teve um sistema de ensino massacrado durante os anos de chumbo. A apatia dos jovens em relação à política, o yuppismo exacerbado das classes média e alta, o desprezo pela piedade e a solidariedade que só existe para os seus pares me apavoram. Cada vez mais se acirram as diferenças, separam-se universos. Os 'outros' são o inimigo, grupos dos quais precisamos nos proteger e firmar barreiras intransponíveis, reservando a eles as funções de serviçais.
Os famosos seis graus de separação só são invocados para nos ligar a celebridades cada vez mais ocas, que vivem personagens e nada contribuem para a História.

19.3.09

Bodas de Ouro

O Dia de São José, o santo protetor da família, foi escolhido por meus pais para se casarem em 1959.


Michelangelo via assim, a família composta por dois primos, ele bem mais velho do que a mulher.

Um artista bizantino anônimo imaginou a família mais uniforme, com mantos se confundindo por trás do filho.
As doces cores de El Greco trazem um menino faminto, santos humanizados.

Prefiro esta família de um filme italiano prá lá de péssimo, com Alessandro Gassman (filho do grande Vittorio) como Giuseppe, o carpinteiro. Lindos e felizes.

Natasha Richardson


18.3.09

Eu, tijucana


Eu não sei por que a Tijuca recebeu tal nome, que significa água suja em tupi. Parece que isso se referia mesmo era à lagoa de Jacarepaguá, lá na Barra. Coisas dos índios que perderam as terras pros homens brancos.

Este post se deve aos comentários do Ricardo, Mônica e Jôka, abaixo, quanto ao eu ser ou não tijucana.

Bem, não sou. Nasci em Santa Teresa, dali saí com um dia de vida para Ipanema, onde vivi por 26 anos até me mudar para... a Tijuca! Minha permanência foi brevíssima. Diziam que ali era Rio Comprido - na Barão de Itapagibe, encosta do Turano. No IPTU, à época, era Tijuca, único local em que um casal de classe média da Zona Sul conseguia financiamento para comprar apartamento. Não cheguei a completar um ano de Tijuca, passando o financiamento pra frente e vindo para Botafogo.

Não, eu não gostei da Tijuca de então. Era um bairro IMENSO, eu não conhecia ninguém e, principalmente, tudo saía muito caro, se comprássemos por lá, já que também não tínhamos a menor idéia dos pontos mais baratos.

Foi o único apartamento de primeira mão em que vivi. Pequeno, novinho, bonitinho. Paranóicos - era primeiro andar sobre um playground -, mandamos instalar grades de ferro. O serralheiro era um colega, jornalista, que decidira investir em uma "empresa própria", algo muito em voga naqueles tempos de Plano Cruzado. Na véspera de meu casamento, passei pelo apartamento, ao sair do jornal e encontro os serralheiros lavando o chão da cozinha. Eu pensei que estivessem lavando o chão, mas estavam recolhendo a água, pois um deles deixara uma torneira aberta - acho que faltara luz e a bomba d'água não funcionava, uma coisa do gênero. Só não inundou o andar, mas sim o poço do elevador. O apartamento era todo acarpetado e eles tiveram que passar uma máquina para absorver a água toda. Tivemos mofo pelas paredes durante meses, mas éramos jovens e fumantes, então, não havia grandes problemas na vida.

A Tijuca era perto do Centro, a grande vantagem que encontramos. Mas era longe de nossas vidas pregressas. Como o condomínio era na encosta do morro, de onde desciam cabrinhas para o playground, havia uma horda de seguranças. Uma vez, esquecemos a chave dentro de casa, quando descemos para acompanhar os visitantes até a entrada do prédio. Tivemos que invadir pela área de serviço, que ainda não tinha esquadrias, tomando o cuidado de avisar aos seguranças antes, temendo sermos alvejados e confundidos com arrombadores. Foi nesse prédio que decidi jamais voltar a viver em edifício com playground. Uma festa na piscina, com churrasco e sambinha, começou às 10 da manhã e terminou por volta de 4 da madrugada, depois que chamamos a Polícia, já que os donos da festa não aceitavam reduzir os decibéis da algazarra. Foi lá também que descobri que cortinas japonesas são transparentes. Quando já havíamos vendido o apartamento, fomos dar uma voltinha pelas áreas comuns e percebemos que elas eram meramente decorativas, o que explicava os largos sorrisos que eu recebia dos porteiros e faxineiros à minha passagem quando os encontrava. A Tijuca é quente e eu andava numa fase de naturismo doméstico.

A Tijuca, para mim, era e continua sendo, um outro local, com costumes diferentes do canto onde sempre vivi. Hoje, tem o agravante da violência crescendo vexaminosamente. É o único bairro do Rio que tem morador com gentílico - tijucano. Botafoguense é torcedor do Botafogo, Flamenguista, do Flamengo. Só o tijucano é reconhecido por sua moradia. E, pesquisando na Internet, descubro que o bairro tem um brasão. Se outros, no Rio, têm, desconheço. Não aparecem as cores do brasão. Mas devem estar esmaecidas como o cuidado que as autoridades do município dispensam à Tijuca.

11.3.09

Uma homenagem do Vaticano ao dia da Mulher.
O melhor comentário à sandice da Igreja Católica está no Av Copacabana, do Jôka.

9.3.09

A que ponto chegamos

A moda verão chegou às malditas portas de banco. Qualquer cliente, principalmente se for negro, é considerado suspeito nos bancos brasileiros. Uma senhora despiu-se em Jundiaí, coitada, durante um ataque de nervos. Esse moço aí em cima, fez o mesmo, aqui no Rio. É um técnico de eletrônica e estudante de jornalismo, que tentava entrar numa agência do Itaú, em Campo Grande. Abriu bolsa, depositou tudo o que pôde naquela infame caixinha, mas, mesmo depois de fazer isso duas vezes, não conseguiu permissão para entrar, sequer pela gerente do banco. Tirou a roupa e chamou a polícia. Registrou queixa contra o banco e vai processar a instituição por discriminação racial.
A pergunta é: os assaltos a bancos diminuem por causa dessa traquitanda toda ou ela só causa constrangimento aos clientes? Afinal, os assaltos continuam acontecendo em maior ou menor escala? Essas porcarias só servem para dar pequenos e podres poderes a autoridadezinhas circunstanciais, como os seguranças das agências.

Pra casar

Jack Johnson. Rico, bonito e com jeito de bom moço.
Este papa vai conseguir destruir 2 mil anos de instituição católica. A frase não é minha, mas concordo em gênero, número e grau.
Não obstante eu considerar mais do que previsível a grita da Igreja quanto ao aborto - e totalmente inócua para a maioria das pessoas que estão envolvidas nele ou que decidem fazer um -, a última gracinha do pontificado desse Ratzinger é de matar: a máquina de lavar roupas fez mais pela liberação feminina do que a pílula.
Tudo bem que eu vivo sem pílula, mas não sem máquina de lavar roupa, visto que a contracepção tem diferentes métodos, enquanto roupa só fica limpa se alguém for pro tanque ou se jogarmos na máquina.
A tese, uma linda homenagem ao Dia da Mulher, saiu no L'Osservatore Romano, o jornal do Vaticano.
Que coisa mais besta...
Não bastassem 2 mil anos tomando conta da sexualidade feminina...
Vade retro, Ratzinger. Mas o que ele diz, pra mim, tem tanta relevância quanto as palavras de qualquer aiatolá, pai-de-santo, monge tibetano, pastor evangélico ou sacerdote supremo do Santo Daime. Libertador, para boa parte da humanidade, é viver sem reverenciar mitologias.

7.3.09

Excomungado

"Excomungado", quando eu era criança, só ouvi minha babá, Maria, falar. Xingamento que acompanhava todos os sinônimos possíveis para "desclassificado". Naquela época de inocência, eu era católica, mas jamais apostólica ou romana. Achava os atos dos apóstolos o livro mais chato da Bíblia, minha literatura durante o decoreba do catecismo - a única aula em que eu podia ler sem ser incomodada pela professora (houve um tempo em que ler era proibido em sala de aula! Eu me lembro do dia em que acabei um exercício de Biologia e puxei uma revista, por baixo da carteira, para ler enquanto não voltava a aula. A revista foi apreendida por D. Ruth, a professora, que só a devolveu quando tocou o sinal. Hoje, tenho certeza, ela se congratularia por alguém estar quietinho, lendo no seu canto). E era muito mais grega que romana.
Agora, num mundo totalmente laico, ouço a indignação de quem soube da excomunhão dos envolvidos no aborto dos bebês de uma menininha de 9 anos, estuprada pelo padrasto em Recife. Não quero nem discutir se o aborto era conveniente, moralmente aceitável, o melhor para todos etc e tal. Só acho que qualquer um que faz aborto - grávida, médico ou "entendida" - está careca de saber que a Igreja condena veementemente o aborto. Então, indignar-se com a excomunhão é ridículo. Tão ridículo quanto o bispo que excomungou todo mundo, menos o padrasto estuprador. Este não cometeu um pecado tão grave quanto o assassinato dos bebês, diz ele.

Eu, hein? O pivô de tudo, que é esse padrasto pedófilo, tarado, que cometeu um crime bárbaro, não merece a excomunhão também? Não que eu ache que excomungar tenha alguma importância pra quem entrou nesse imbroglio, mas, convenhamos, o tarado não merecia apenas a prisão. Porque excomungado ainda é um bom xingamento. Aliás, é só um xingamento. E mais nada.

5.3.09






Já fui morena de praia, meu habitat natural e obrigatório em dias de sol a partir das 9 da manhã, quando solteira, até as 10 após a maternidade, ou em horários os mais diversos quando já não precisava mais proteger as suaves peles de criancinhas.
Aos poucos, preguiça e distância se configuraram em sólidos argumentos para me afastarem do encontro com o mar, ao qual me rendo, quando cooptada por meu amigo Eduardo, em suas passagens pela cidade. Há mais ou menos um ano, isso aconteceu, assim como no início desta semana.
Bem que pensei em comprar um filtro solar novo, mas decidi arriscar-me e experimentar um tal Cenoura & Bronze, parente próximo do felizmente finado Rayto de Sol, um produto que se dizia bronzeador e argentino, popularíssimo na década de 70, marcando vítimas para a eternidade. Eu, que era neguinha, ficava embaixo da barraca, distante dessas bobagens escurecedoras (se usava de tudo, incluindo coca-cola, óleo de aviação, urucu, sempre com conseqüências desastrosas), o que me rende elogios de dermatologistas encantados com minha pele sem sardas, manchas e poucas rugas - isso eles é que dizem; eu vejo marcas pavorosas se avolumando ao redor de meus olhos - diante de tanto tempo de exposição ao sol.
Então, confiei no Cenoura & Bronze e expus exatamente metade de meu ser à incidência solar de Ipanema, mantendo o resto do corpo embaixo da barraca. Mar de águas cristalinas, biscoito Globo, mate, ventinho, todos os calouros de universidade esmolando moedinhas para encher a cara de cerveja, a constatação de que durante a semana a praia fica entregue a menores de 20 anos... Dia lindo, papo bom, tudo ótimo pra quem precisa de um recreio na vida.
Eu só não me lembrava da Era pré-filtro solar, em que a camada de ozônio era compacta e, mesmo assim, a gente respeitava o sol. Há três dias visto muito pouca roupa e, mesmo assim, só de suaves malhas fininhas, de algodão. Basicamente, pijaminhas de dormir, nada além. Meu lado esquerdo está moreno. O direito é vermelho-mogno. Dói. Tudo incomoda. Tornei-me uma cenoura bronzeada.
Assim fica difícil eu voltar a me viciar em praia!

2.3.09


O sono que me delicia é o cochilo das tardes quentes, embaixo de um ventilador não muito eficaz, que refresca, mas não esfria, espantando um pouco do ar abafado.
Acho que é o sono dos trabalhadores de Van Gogh, aquela sesta que hoje a Ciência diz ser benéfica para a produtividade - embora ainda não tenha ouvido falar de corporações dotadas de redes para uma boa cochilada pós-almoço.
Sobre a produtividade, pouco sei, mas esse desligamento, essa languidez de suspiro profundo imerso em um silêncio que acolhe barulhinhos suaves, trinados de pássaros, o ressonar de alguém ao seu lado... isso, sim, é o sono dos justos, aquele da paz de criança dormindo.

1.3.09