19.12.12

Balanço

Eu acho que já peguei uns três ou quatro fins do mundo.
Um foi no dia da inauguração da usina nuclear de Angra 1. Eu tinha uns 20 anos, começava meu estágio na TV E. Foi quando conheci o samba de Assis Valente "E o mundo não se acabou", porque já havia presságios do fim dos tempos décadas antes. Como disse um colega, então, o mundo acabava, mas o Brasil teria uma usina nuclear.
Depois, vieram outras datas, sempre com uma preparação de seitas como os Borboletas Azuis, que viviam numa comunidade perto de Brasilia.  E haja Assis Valente para ouvir. Precavida, jamais peguei na mão de quem não conhecia, nem beijei a boca de quem não deveria.
Só em 2012, houve uns dois anúncios de fim do mundo - um deles eu nem sabia que estava marcado. Agora tem a data final do calendário maia.
E mesmo com o prognóstico de explosão do planeta, eu vivi 2012 sem qualquer proveito extra, dada a possível proximidade do apocalipse. Foi mais um ano em que não emagreci 20 quilos, em que não fiz ginástica, em que não acabei de reformar a casa (devo recomeçar em janeiro), em que não escrevi um livro, em que não me livrei dos gatos, em que não viajei, nem fui a exposições de arte, sequer a boas festas. Aliás, foi um ano em que não dei festas!
Então, no sábado, eu continuarei vivendo, esperando que em 2013 eu consiga fazer um pouco do que pretendia em 2012.  Isso se não tiver um livro e uma rede me convidando para me embalar, de papo pro ar...

4.12.12

No Valor Econômico. hoje

Parece brincadeira, mas é a realidade com outras cores

Por Olga de Mello | Para o Valor, do Rio
Ailton de Freitas/Folhapress / Ailton de Freitas/FolhapressKafka, sobre a transferência de culpa: "É menos importante encontrar soluções do que ter bodes expiatórios"
Uma dose de irreverência temperada com personagens fictícios ou reais, políticos e ainda artistas pode ajudar a traduzir a dureza dos temas econômicos para leitores que se interessam pelo assunto, mesmo sem dominar o jargão técnico do setor. Foi pensando nesse público leigo que o economista Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central, compilou observações sobre episódios diferentes e as reações - quase sempre semelhantes - de quem decide e movimenta os caminhos da economia brasileira. As anotações, coletadas ao longo de quatro décadas, estão em "As Leis Secretas da Economia - Revisitando Roberto Campos e as Leis do Kafka".
A inspiração para o livro veio de um artigo dos economistas Roberto Campos e Alexandre Kafka, publicado, em 1961, na revista "Senhor". Os autores afirmavam, então, que a economia brasileira não obedecia a nenhuma das leis conhecidas, cabendo, portanto, investigar as normas secretas que a regiam. Algumas das dez leis estabelecidas por Campos e Kafka, que retomaram o tema em outras publicações, não integram o livro de Franco, já que alguns dos tópicos perderam a atualidade.
"Muito do que eles abordaram ficou datado. Na época da hiperinflação, ninguém se indignava com aumentos de 5%. Hoje, esses percentuais são preocupantes. Há situações que simplesmente deixaram de existir. Ainda se discute privatização no país, a inflação permanece incômoda, porém o enfoque é outro", observa Franco.
Se a vida mudou nos últimos 50 anos, há situações que se mantêm praticamente imutáveis, como a descrita pela Lei do Kafka nº 10 - Da Conservação do Ente Burocrático. A ementa define: "O ente burocrático é indestrutível, ou o instrumento é mais importante do que os objetivos, ou o fim serve aos meios. Parágrafo único: Toda vez que dois órgãos públicos precisarem examinar o mesmo processo em separado, nenhuma decisão será tomada. E quando se tornar imperativa uma decisão consensual e negociada, ela terá o condão de manter tudo exatamente como sempre foi".
Outra lei de Kafka que permanece atual é a nº 9, que trata da transferência da culpa, e diz que "é menos importante encontrar soluções do que ter bodes expiatórios".
Há ainda observações do próprio Franco que desafiam a passagem do tempo, como a Segunda Lei das Fusões Bancárias, pela qual em toda fusão de banco apoiada pelo Banco Central ao menos um dos "nubentes" está quebrado.
O tom informal e profundamente ácido do texto segue o estilo empregado por Campos e Kafka. "É irônico, porém, não fiz brincadeiras superficiais. Todas as leis existem e têm respaldo em teses econômicas comprovadas, como aponto na bibliografia", diz Franco.
As dez leis originais se estenderam a 74, que, agrupadas em capítulos que tratam de finanças públicas, mercado, bancos, globalização e câmbio, entre outros temas, apresentam o panorama da vida econômica brasileira nas últimas décadas. Não houve uma ordem de valores nem de cronologia, apenas a intenção de criar um panorama que ajuda a compreensão da economia por leitores que estão distantes da angústia que o tema já provocou, quando a busca por informações era no afã de encontrar "respostas para sobreviver", diz Franco. Esse novo leitor, que tem, segundo o economista, uma visão mais positiva da economia, combina com uma tendência na literatura econômica acentuada a partir de 2008.
"A crise mundial levou a uma profusão de documentários e livros explicando a história financeira em termos abrangentes, de fácil compreensão para a maioria do público. Incluí ilustrações no texto que, além de trazer leveza ao volume, também têm a intenção de cativar o público não habitual de economia, sem abrir mão, no entanto, do pensamento econômico sólido", explica Franco.
A crítica à linguagem dura e, por vezes, vazia dos economistas e acadêmicos, está em diversos trechos do livro, como o pequeno glossário do "Teorema do Esquimó", que determina que "o número de palavras incompreensíveis, em economês, de índices de inflação e de pessoas envolvidas com o assunto, é proporcional ao quadrado do índice da inflação".
Referências à cultura pop mais recente, utilizando personagens de séries televisivas, como o médico Gregory House, ou de cinema - "Forrest Gump" e "Kagemusha" - para dar nome a leis, teoremas ou axiomas, juntam-se a citações tiradas de obras dos escritores favoritos do autor, entre eles William Shakespeare, Ernest Hemingway, Carlos Drummond de Andrade e Mario Vargas Llosa, exemplificando ou esclarecendo as estranhas normas que regem o Brasil, não apenas no campo econômico. As reformas sociais empreendidas por Mikhail Gorbachev e o romance "O Velho e o Mar", de Ernest Hemingway, são unidos no Teorema de Hemingway-Gorbachev, que prevê o desgaste progressivo e irreversível dos governantes reformadores, que acumularão inimigos até entre os beneficiários de suas iniciativas, "incapazes de perceber que a melhoria de seu padrão de vida se deve aos reformistas".

"As Leis Secretas da Economia - Revisitando Roberto Campos e as Leis do Kafka"

Gustavo H. B. Franco. Editora: Zahar. 216 págs., R$ 39,90

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30.11.12

No Valor Econômico, hoje


A vida é um livro aberto
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Por Olga de Mello | Para o Valor, do Rio
Dois romances e um ensaio já iniciados aguardam o retorno de Alberto Manguel à sua casa, em Poitiers, na França. Nas últimas semanas, o escritor e ensaísta compareceu a eventos literários no Chile, na Inglaterra e na Itália até chegar ao Brasil, onde veio abrir a 7ª Bienal do Livro de Campos dos Goytacazes, no norte do Estado do Rio. "Os escritores se transformaram em caixeiros-viajantes que ganham a vida em leituras e palestras. Isso acaba prejudicando o trabalho de quem precisa escrever", lamentou Manguel, em entrevista ao Valor, no Rio, onde, na noite anterior, esbanjava simpatia no encontro com cerca de cem leitores na pequena Biblioteca Popular de Botafogo.

As viagens abalam a rotina deste argentino naturalizado canadense, que gosta de ler Dante Alighieri diariamente e escrever durante as manhãs. Por falta de tempo, recusa boa parte dos convites que recebe. A princípio, rejeita qualquer atividade de promoção de livros nos Estados Unidos.
"As 'book tours' começaram no século XIX. Era um acontecimento na vida de escritores como Charles Dickens. Mas eles participavam de uma, no máximo duas, dessas viagens. No século XX, elas tomaram um vulto empresarial nos Estados Unidos, onde, atualmente, os agentes literários e as editoras montam sessões contínuas com diferentes escritores se apresentando ao público em grandes livrarias. Não faço mais isso. Hoje, quem quiser ver e ouvir um escritor entra no YouTube", diz.
Em sua 30ª vinda ao Brasil - sempre a trabalho -, atendeu ao chamado para falar sobre a leitura como patrimônio pessoal na era das virtualidades. "Essa profusão de festas literárias em diversos lugares é excelente para os leitores e uma oportunidade para os escritores trocarem ideias, pois, cumprindo agendas lotadas, mal podem se ver", observa Manguel, que aproveitou o festival L'Altra Metà del Libro, que organizou há duas semanas, em Gênova, para se reencontrar com amigos, como os romancistas Ian McEwan e Daniel Pennac. Nos próximos dias, já tem outro compromisso em Paris. E no ano que vem coordenará outro festival, na cidade francesa de Nantes.
O calendário apertado não o convenceu a adotar comodidades como celular e e-mail, embora escreva em computador. Quando viaja, dita os artigos a um digitador, que os envia para quem o contrata. Reconhece a utilidade da tecnologia, mas prefere permanecer distante de algumas facilidades, evitando a leitura em ambientes virtuais.
"Meu filho assiste a filmes numa tela do tamanho de um selo. Eu não consigo. O e-reader é prático para o leitor que vive em trânsito, que não precisa carregar peso na bagagem, mas eu gosto do contato com o livro sólido, físico. A experiência de ler no papel é totalmente diferente da leitura na internet, que acaba dispersando o leitor", diz Manguel, que cultiva hábitos quase anacrônicos, como o de trocar cartas com amigos escritores. Na biblioteca que construiu em Poitiers tem cerca de 40 mil volumes, "todos abertos, nem todos lidos", organizados por temas nem sempre tão eruditos como se imagina de um dos mais reconhecidos especialistas em história da leitura e bibliofilia. Ao lado de livros sobre as lendas de Don Juan e do Judeu Errante, há muito sobre gastronomia e novelas policiais. "Só leio por prazer, o que acontece nas minhas leituras diárias de Dante e também quando pego um livro de Agatha Christie, que escrevia bem. Entretenimento não precisa ser vazio."
É com paixão de militante que ele fala contra o mercado editorial que privilegia a publicação de conteúdos medíocres. Fora do Brasil, afirma, os melhores textos têm sido lançados por editoras universitárias, enquanto as demais preferem publicar gêneros de boa vendagem, seguindo a tendência do momento.
"Uma editora deveria ter o compromisso de formar leitores. Eu me preocupo em ver que elas se tornaram cúmplices da formação não de leitores, mas de consumidores para a sociedade. Quando elas se tornam empresas gigantescas que compram editoras pequenas, estão destruindo a literatura. Seis meses antes de ganhar o Nobel de Literatura, em 2007, Doris Lessing me contou que sua última novela estava prestes a ser recusada por seus editores nos Estados Unidos e na Inglaterra, porque ela escrevia textos muito longos para ser apreciados por um público mais jovem. Isso é um desrespeito com uma escritora de 88 anos, então, com uma contribuição inestimável à literatura britânica. Aí veio o anúncio da premiação e, naturalmente, a situação mudou", lembra-se.
A incorporação de pequenas editoras e livrarias pelos gigantes do mercado também contribui para a perda de qualidade da literatura. O tratamento impessoal dispensado ao leitor nas grandes livrarias mostra o interesse em fomentar só o consumo, diz Manguel, que não se deixa levar pelo discurso de que os livros comerciais sustentam a publicação dos que têm mais qualidade. Falta espírito crítico aos leitores, afirma o escritor, que se surpreendeu com o sucesso de livros eróticos entre mulheres jovens, quando as tramas enfatizam o arquétipo das protagonistas submissas.
"Se as mulheres são 70% dos leitores, deveriam repudiar histórias que vão contra tudo o que se fez para estabelecer a posição feminina na sociedade patriarcal do Ocidente. A maior violência nesses romances não é sexual, mas o fato de impedirem as heroínas de questionar as ordens que recebem dos homens. Isso reforça o mito da inferioridade feminina em pleno século XXI, como se as mulheres não tivessem autonomia para tomar decisões plenamente. Homens e mulheres devem, juntos, como leitores, membros da sociedade, refletir sobre essa literatura que nega ao personagem o direito ao questionamento", diz.
Apesar das políticas públicas de incentivo à leitura, a sociedade desestimula os leitores, acredita Manguel: "A criança que gosta de ler é rotulada como 'nerd' pelos colegas na escola. Isso porque a leitura exercita o cérebro e vivemos uma época em que se recomenda ao jovem que evite as dificuldades, entre elas ler o que vai desafiar seu intelecto. Cada vez mais se compram livros superficiais, de textos curtos. Os leitores têm um poder que eles próprios desconhecem. Deixar de lado livros sem conteúdo forçará o mercado a procurar mais qualidade nas publicações".

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27.11.12

Erótica

Recebo um release de livro pornô para mulheres. Aparentemente, o romance deve ser tão fraco quanto o texto do release, que o pobre assessor de imprensa teve de penar para transformar em algo legível. 
Agora que as editoras mundo afora descobriram que as mulheres gostam de sexo, cada vez mais a dita "literatura feminina" será composta de romancezinhos água-com-açúcar enfatizando a dominação masculina, com heroínas jovens abobalhadas que adoram ser maltratadas. Sadomasoquismo foi alçado ao panteão de grande símbolo de iconoclastia, mas, por enquanto, a submissão é feminina e o príncipe encantado continua sendo o objetivo de vida das mulheres. 
Coisa mais ridícula...

Ainda mais...

Chegaram os dias abafados, que chuvinhas não refrescam. A transpiração ajuda a reduzir a pressão do corpo, mas se torna mais uma camada sobre a pele. Ainda é época de sentir arrepio ao abrir o chuveiro, igual ao primeiro mergulho nas mar gelado de Ipanema, mas acabou o tempo de tomar longos banhos quentes. Bate uma estranha melancolia enquanto me delicio sob a ducha gelada, pensando em tantos que nem água têm para beber. Antes, era só a pressão da cultura judaico-cristã que me deprimia. Agora tem a filosofia politicamente correta pra alimentar a culpa.

11.11.12

Versace, sempre um perigo!



O que o designer ensandecido da Versace imaginou ao criar este pavor, uma elegia a nereidas e a Maria Bonita, talvez?  Parece figurino daqueles projetos televisivos-artísticos com poesia de Ariano Suassuna.
A roupa é de mau gosto tão avassalador que ganha qualquer Troféu Helena Boham-Carter/Bjork/Cher de trajes típicos para tapete vermelho.
Se nem a Heidi Klum, que é alta, magra, linda e poderosa, fica bonita nisso, imagina uma mortal qualquer.

9.11.12

No Valor Econômico, hoje

Aqueles dias todos escuros

Por Olga de Mello | Para o Valor, do Rio
Reprodução / ReproduçãoDilma Rousseff mencionou Freitas (foto) em seu primeiro discurso de campanha
A lembrança mais antiga da jornalista Cristina Chacel relacionada aos tempos de regime militar é a de ver seus pais queimando livros, "provavelmente de conteúdo classificado como subversivo pela repressão, logo após a decretação do Ato Institucional nº 5, em 1968". Pouco depois, a família foi viver na casa de seu primo, o crítico de arte Mário Pedrosa, então exilado no Chile. Se alguém perguntasse por Pedrosa, Cristina seguia à risca a recomendação de informar que ele estava viajando e que não sabia quando retornaria.
"Ninguém explicava por que tínhamos de agir assim. Viver aos cochichos era comum durante a ditadura", afirma Cristina, autora de "Seu Amigo Esteve Aqui" (Zahar, R$ 42), a biografia de Carlos Alberto Soares de Freitas. Conhecido como Beto, Freitas, dirigente da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares), um dos grupos que lutaram contra o governo militar, desapareceu em 1971.
Entre outros militantes ligados a Freitas estava a então estudante Dilma Roussef, que mencionou Freitas em seu primeiro discurso como candidata do PT à Presidência da República. Em 2009, ainda como chefe da Casa Civil, Dilma recebeu Cristina, para falar sobre o amigo, figura influente na sua formação política.
"Ela ficou muito emocionada ao conversar comigo, demonstrando que eram realmente muito próximos. Os amigos, parentes e ex-companheiros deram depoimentos comoventes sobre Beto. São pessoas muito marcadas pelo período de militância, quando, por norma de segurança, pouco sabiam sobre a vida dos outros. Isso ficou para a vida toda deles, tanto a discrição em torno dos assuntos pessoais quanto a confiança nesse grupo que não se dissipa, que está unido para sempre", diz Cristina.
Convidada por amigos e companheiros de militância de Freitas para escrever o texto, em 2009, Cristina sabia que não podia contar com registros oficiais sobre sua prisão ou morte, ocorrida, possivelmente, em maio de 1971, na chamada Casa da Morte - local de prisão de presos políticos -, na cidade de Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro. O título do livro vem do comentário de um sargento do Exército para Inês Etienne Mourão, também presa na casa.
"Essa foi uma das poucas notícias sobre o destino de Beto, dada pelo sargento que, hoje, não fala sobre o assunto. É muito estranho para um jornalista não ouvir os dois lados de uma história, mas não sei quanto vale a palavra de um torturador. O governo militar nunca admitiu a prisão de Freitas, embora a União tenha concedido uma indenização a seus pais, em 2005, considerando que era um desaparecimento político", diz Cristina.
O projeto de pesquisa foi financiado com parte da indenização recebida por Sergio Campos, o último dos companheiros de militância a ver Freitas vivo. O livro conta a vida de Freitas desde a infância em Minas Gerais, passando pelo envolvimento com política, a imersão na clandestinidade, até o dia em que se despediu de Sergio Campos, ao saltar de um ônibus em Copacabana, no Rio. Também acompanharam a coleta de material e as entrevistas um primo de Freitas, Sergio Ferreira, e a jornalista Flavia Cavalcanti, outra ex-militante da VAR-Palmares. "Só eu assino o livro, mas este é um projeto de todos que se empenharam em relatar lembranças sobre o Beto, a fim de tirar do anonimato alguém duplamente desaparecido - da vida e da história. Este é um momento importante no resgate da história dos derrotados, em que a Comissão Nacional da Verdade busca levantar o sentido de um período em que os militares brasileiros não reconheceram os crimes hediondos que praticaram", diz Cristina.

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Ai, ai...

Experimentando remédio de lá pra cá, pareço melhor. Mas se eu for listar as mazelas que me acometeram de uns anos pra cá, estava perdida. Prefiro ler sobre a aristocracia inglesa da primeira metade do século XX e sonhar que um dia não fui serva, mas tinha quem me servisse.
Ah, como cansa ser da classe trabalhadora. Dá orgulho pelas conquistas, mas uma exaustão...


7.11.12

Farmacolover

Posso ter nascido em ano do rato, mas eu não sou cobaia, não!!
A médica desistiu do remédio novo, depois que eu arfei, chiei e apitei igual a uma cambada de gatas no cio. Mudou pra algo mais tradicional e tascou mais corticóides. Resultado: estou levitando.
Cortisona é praticamente pomada Minâncora, serve pra tudo! De leucemia a processos alérgicos, contenção de tumores a artrite. A bula é literatura de amplo aspecto.
Ultimamente, andava muito cansada. Acreditava que era excesso de peso e idade. Mas era falta de ar mesmo. Incrível como respirar mal cansa! Incrível que eu, tão culta e brilhante, jamais consegui perceber isso. Incrível como fico animada com cortisona.
Meu filho Oto era assim. Tinha crise de asma, parecia que ia morrer sem ar. Na segunda dose de cortisona, pulava pela casa inteira.
Tomara que me reste algum ânimo semana que vem, quando o tratamento já estiver acabado.Porque hoje, comemorando a reeleição de Obama, inspirando profundamente e expirando silenciosamente, nem chorei muito pela perda dos royalties do petróleo que a Câmara garfou do Rio. Espero que Dilma e o STF consertem isso.




6.11.12

Direto do Canteiro 2 - O condomínio

Parece título de filme de terror, mas é apenas o início das obras no meu edifício setentão (72 anos, para ser mais precisa), que agora passa por intervenções urgentes, reestruturando reboco desgastado pelo tempo. Começou a retirada dos cacos de parede e, imediatamente, meu organismo, que se assanha a cada revoada de poeira, manifestou-se.

A asma me acompanha há tanto tempo que nem dou mais bola pra respirar mal e viver arfando, cansadíssima. Ontem, toda ruim, acabei numa clínica de alergias, onde constatou-se que estou cheia de porcarias nas vias respiratórias e que tenho de tomar um bocado de remédios. Comecei à noite, com o primeiro das bombas e... amanheci toda congestionada, com gripe!

Como doente crônica e alérgica a diferentes tipos de medicamento, sou partidária da cura pela paciência. Meu filho Hugo percebeu que lá em casa só vamos ao médico depois de três dias de febre ou qualquer sintoma que persista depois do uso de Paracetamol, pomada Minâncora, Luftal, antialérgicos ou sal de frutas. É sério. Uma vez, um dos meninos tinha como dever de casa listar os remédios que tínhamos em casa. Para fazer "volume", incluímos o Puran que Mamãe tomava para a tireóide.

Mas os médicos não acreditam que meu organismo fique bom sozinho e insistem em me receitar quatro diferentes remédios, como a médica que consultei ontem. Ora, ela, igual a todos os imunologistas, acredita que a gente 


1º ) está doidinha pra ser cobaia de novos medicamentos;
2º) tem uma fortuna para gastar em medicamentos que não têm patente quebrada;
3º) dispõe de criados para a assepsia de sua residência ou pode deixar a casa permanentemente imunda, já que um alérgico não deve: varrer, tirar pó, lavar, arrumar, tocar em poeira;
4º) jogará na rua todos os livros, as plantas e os animais domésticos que provocam alergias.
5º) viverá em ambiente limpíssimo, com móveis que jamais acumularão qualquer resíduo, com uma estética de filme de ficção científica das antigas (os atuais são todos sombrios e cheios de imundice).

E, at last, but not least, vai tomar miraculosas vacinas que acabarão com a asma pro resto de nossas vidas.

Então, em nome dos outros seres que necessitam sobreviver da melhor maneira possível, informo que:
1º) não sou cobaia;
2º) não tomo remédios caros por falta de recursos para tal (R$ 105 pratas somente UM deles!!!)
3º) meus filhos são a última geração que conheceu empregada doméstica - agora temos faxineira quinzenal, então...
4º) não viverei sem meus livros, minhas plantas e não há quem queira meus gatos;
5º) moro em Botafogo. A fuligem cobre qualquer milímetro do ar e das paredes de casa.

E, finalmente, não tomo vacina miraculosa.

Ou seja, a luta continua, companheiros! 

4.11.12

Amélia

Enquanto as mulheres não acreditarem na capacidade masculina de cuidar dos filhos e da casa, as tarefas domésticas permanecerão sob responsabilidade feminina. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), que há 44 anos observa as condições de vida no País, apontou que na última década a contribuição dos homens no trabalho de casa aumentou 8 minutos. Em 2001, mulheres dedicavam 24 horas semanais às tarefas domésticas; já os homens, dez horas (e eu acho que esses números são tão falsos quanto a quantidade de conquistas amorosas masculinas, sempre superestimadas pelos autores). Em 2011, as mulherem reduziram em duas horas a carga de trabalho em casa. Os homens, por sua vez, fazem 10 horas e oito minutos semanais.

E isso mereceu uma interessante matéria no Globo , que, no entanto, peca pela utilização de termos empregados ainda hoje pelas mulheres. Maridos "ajudam" em casa. (A foto, claramente montada para a matéria, retrata a tranquilidade  do homem, refestelado no sofá, em frente à TV, enquanto a mulher passa roupa!) Ora, quando esta terminologia é usada, significa que as mulheres consideram os homens inaptos para desempenhar as funções tradicionalmente atribuídas a elas. E não só os homens. Os filhos brasileiros, enquanto vivem com os pais, têm os mesmos privilégios. Naturalmente, às meninas cabe algum tipo de "ajuda" às mães, maior do que a dos meninos. 

Mais de um ano atrás, fiz uma matéria para o Valor tratando deste mesmo tema, devido à pesquisa de uma antropóloga britânica sobre mulheres que investiam em beleza e cultura como o chamado "capital erótico", que garante aos maridos poderosos uma companheira encantadora. A tese era que mulheres cultas estavam trocando o mercado de trabalho pelo casamento, mais vantajoso economicamente. Isso, a grosso modo. Naturalmente, estamos falando de classe média. Porque mulheres pobres, em qualquer canto do mundo, sempre trabalham dentro e fora de casa.

"A empregada doméstica, no Brasil, amortece a batalha das tarefas domésticas", disse-me, então, uma das mulheres que entrevistei. A economista Hildete Pereira de Melo lembrava que o número de empregadas estava caindo vertiginosamente, um fenômeno comum do crescimento econômico. O serviço cada vez mais caro precisa ser desempenhado pela família. Aí é que começam os dramas na classe média. Quem vai ficar com toda a carga de trabalho doméstico?

Nos tempos em que passou Avenida Brasil, a novela-sensação, uma das observações era de que as mulheres suburbanas trabalhavam em casa e na rua, sem discutir com os maridos, que assumiam as tarefas como naturais, algo não incorporado pelas moças da Zona Sul carioca. Embora em tom de farsa, não há como perceber que o fenômeno existe: as mulheres foram convencidas de que são as escravas dos lares. Quando os homens assumem tais tarefas, ainda que esporadicamente, são, imediatamente glorificados e celebrados, mesmo que o trabalho se resuma a trocar uma fralda suja do filho.

Tive empregadas que saíam de casa de madrugada e, ao voltarem à noite, tinham que cozinhar, varrer e lavar roupa de marmanjos desempregados - fossem maridos, filhos, enteados ou irmãos. Em Rio das Ostras, uma delas levou para casa um marido novo com filho e cunhado. Nenhum dos homens trabalhava. Nem na rua, nem em casa. 

Há 25 anos, quando me casei, fui claríssima ao informar que não precisava de "ajuda" nas tarefas domésticas, mas sim que cada um fazia a sua parte. Acho que fui pioneira e solitária nessa cruzada, mas, enquanto fui casada, deu certo.Já convencer meus jovens príncipes a assumirem cuidados higiênicos com a casa é mais difícil do que ensiná-los a escovar os dentes. Um dia, a gente percebe que eles, sim, tomam banho sem que ninguém mande, escovam os dentes sozinhos - ao se levantarem e depois de todas as refeições também! Por que, então, não lembrá-los desde pequenos sobre a existência de pratos a serem lavados, de que a cama pode e deve ser arrumada diariamanente? Resmunguem, briguem, eduquem! Abaixo a indiferença quanto às tarefas de casa!

Porque, Amélia, querida, seus filhos são da última geração que conheceu empregada doméstica. Podem ser a última, também, que conheceu mães-domestdicadas.


20.10.12

Fechando as observações dos enlutados pelo fim de Avenida Brasilm a novela, festejemos a longa vida ao folbhetim. Esta foi a terceira vez em que acompanhei com regularidade uma novela. Comecei a assistir por acaso, apenas porque achei interessante a fotografia e Adriana Esteves dardejando desaforos à criadagem. Em dois dias assinei o contrato de fidelidade - a novela já estava nos "tempos atuais", ou seja, sem aquela idiotice de criancinhas casadoiras.
Da novela tiro a experiência antropológica de dividir impressões com quase desconhecidos, de pertencer a uma confraria de cúmplices, encantada com as situações pouco verossímeis, mas louváveis - do ponto de vista educativo, levando a literatura para a cena - como a de um jogador de futebol interessado em Flaubert.
E viva o folhetim!

18.10.12

Ismael, Ahab e a baleia

161 anos de lançamento de Moby Dick, aquele que já aproxima o leitor do narrador - e enlouquece os tradutores - na mais conhecida abertura da literatura: "Call me Ishmael".


(Tá bom, a mais conhecida abertura literária é "E no princípio era o Verbo", que enlouquece crentes, ateus, filósofos e leitores: e, tá bom, pra muitos chamar livro bíblico de literatura é depreciá-lo, mas, para mim, é elevá-lo a categorias mais que divinas).

9.10.12

Fantasmagórica

Há dez anos escrevi um artigo para uma revista de circulação restrita. O artigo foi assinado por outra pessoa. Era minha primeira experiência em ghost writing - e a única dolorosa. Eu trabalhava como assessora de imprensa de uma respeitável instituição de saúde. A médica em questão não tinha tempo para escrever. Sequer me deu diretrizes do que abordar. E eu nem vi onde foi publicado meu texto malhando a indúsria do tabaco, comparando-a a governos que empregam assassinos de aluguel.
O cigarro, no artigo, era elegante, charmoso e letal como 007, que, por baixo do smoking (olha a outra associação lógica...), não passa de um agente da morte. E, como James Bond, o cigarro também ganhava um selo de aprovação da Casa de Windsor para ceifar vidas em nome da liberdade do mercado capitalista.
Metáforas pueris à parte, o texto ficou bom, a médica gostou e ele se foi. Senti-me como o personagem do Gene Kelly em Um Americano em Paris, pintor que vê suas obras serem negociadas e nunca mais deverá tê-las sob os olhos.
Não sei se é pior ver nossa criação premiar outrém ou ser alguém sem ideias próprias, laureado pelo talento que aluga. Fiz outros ghost writings de menor alcance ainda - dois livros pavorosos sobre terapias de vidas passadas. Não compreendo como alguém entrega seu próprio discurso a outra pessoa. No mínimo, tem que rascunhar seu pensamento e passar o texto final ao redator.
Eu morro é de inveja do que já escreveram antes de mim.

3.10.12

52


Amanhã completo 52 anos com um aspecto que não combina, definitivamente, com minha imagem mental de mim mesma.
Primeiro, eu não sabia que viria a ter cabelos opacos, finíssimos e tão lisos.
Nem que a pele se tornaria opaca, fina, seca e manchada nesta etapa da vida.
O pescoço tornou-se invisível sob uma papada histriônica, que não enfeita, só entristece.
Os olhos foram cercados por pálpebras inchadas. Vez por outra alguém percebe que eles têm um tom verde água bonito.
As unhas são mais quebradiças do que antes. A boca carnuda reduziu-se.
E minha alma se circundou por tecido flácido, adiposo. Camadas e camadas. Que se nutrem do ar que eu respiro, se preciso for, para aumentarem ainda mais.
Os joelhos e os dedos dos pés sofrem de dores constantes.
A respiração é fraca, graças à asma e a tantas alergias.
O cansaço perene não impede a mente de trabalhar e de obrigar o corpo calejado a se movimentar.
Aprendi a tirar fotografias sorridente, esticando o pescoço pra frente como tartaruga. Ao menos na foto não pareço ter uma gola de papada.
Os truques de maquiagem se tornam cada vez mais necessários no dia a dia.
Pinto os cabelos em casa a cada três meses. Aparo as pontas, sempre em busca do corte perfeito, que disfarçará a decadência.
Já  não enxergo bem nem de perto nem de longe, mas me esqueço de fazer todos os exames que os médicos prescrevem.
Envelhecer é resistir.
Eu só queria ter uma garrafa igual à da Jeannie pra acordar daqui a dez mil anos e me espantar com o mundo do qual daqui a pouco terei que me despedir.
Meio século passou rapidamente demais.
Bom senso e censura são dois conceitos completamente diferentes. Bom senso é não expor crianças a violência, estupidez, grosseria. Censura é impedir que crianças saibam que existe violência, estupidez e grosseria - o que em nada contribuirá para o desenvolvimento delas no mundo real. Bom senso é dizer que caçar animais por esporte é crueldade, mas que sua prática sempre foi disseminada como um ritual para assegurar a virilidade dos homens que trucidam elefantes, onças, raposas, touros e outros bichos. Censura é proibir que qualquer forma de arte reproduza a tal prática.

Meu preâmbulo é a explicação do texto que publiquei duas semanas atrás na minha coluna Para Ler na Rede, que sai no Portal de Anna Ramalho e nos sites Cinema.com.br e Investimentos e Notícias. A coluna está nos links, mas também abro aqui, porque a polêmica é ridícula, forjada por grupos que buscam a notoriedade, ainda que momentânea, acusando o Monteiro Lobato de racismo. Eu diria que ele foi um homem de sua época.
E segue a coluna (A charge do Ziraldo, acima, é a do bloco Que Merda é Essa?, que dedicou o desfile de 2011 à discussão sobre Lobato, o preconceituoso):


Lobato, o racista, e os cocorocas de Stanislaw


Monteiro Lobato não me inoculou o vício da leitura, mas foi um marco no meu aniversário de sete anos, quando ganhei a coleção que li e reli anos seguidos, descobrindo a mitologia grega, a História, Dom Quixote e Peter Pan. Passou o tempo e Lobato, o escritor que usava a boneca de pano Emília para clamar contra a guerra, o racismo e a falta de nacionalismo, que criou o Jeca Tatu, o caipira largado à própria sorte por um governo que ignorava o homem do campo, virou um perigoso subversivo que difundirá o racismo entre o público infantil, além de contribuir para a difusão de crimes ambientais, entre eles a caça à onça-pintada.





Ver em Caçadas de Pedrinho um incentivo a safaris é o mesmo que considerar Moby Dick (Landmark, R$ 49), de Herman Melville, um manual de caça à baleia. O mesmo poderia ser dito sobre O Velho e o Mar (Bertrand Brasil, R$ 31), de Ernest Hemingway. Além de delinquente ambiental, Lobato estimularia o racismo em diversas de suas obras, entre elas o primoroso conto Negrinha. A protagonista é uma menina órfã, que vive na casa de Inácia, uma viúva sem filhos que se compraz em torturar a criança diariamente. Negrinha só conhece a alegria quando as sobrinhas de Inácia a convidam para brincar. O conto, curtinho, pode ser lido aqui http://www.bancodeescola.com/negrinha.htm. Lobato, o racista, assim descreve Inácia:



“Excelente senhora, a patroa. Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos padres, com lugar certo na igreja e camarote de luxo reservado no céu. (...) Uma virtuosa senhora em suma — “dama de grandes virtudes apostólicas, esteio da religião e da moral”, dizia o reverendo. (...) Era mestra na arte de judiar de crianças. Vinha da escravidão, fora senhora de escravos — e daquelas ferozes (...). Nunca se afizera ao regime novo — essa indecência de negro igual a branco (...)”.



Se este trecho não demonstra o repúdio do escritor à Inácia, se não configura uma crítica violenta ao racismo, realmente, não sei mais ler. Também já se atribuiu o pejo de racista a Manuel Bandeira pelo belo poema Irene no Céu, em que “Irene Preta/Irene boa/Irene sempre de bom humor” chega ao paraíso, pedindo “licença, meu branco” a São Pedro. Este responde que ali ela não precisa pedir licença. Bandeira estaria disseminando a submissão dos negros perante os brancos. Quem levanta tais questões só merece ser classificado de “cocoroca”, como Stanislaw Ponte Preta definia os implicantes sem imaginação ou espírito crítico. Algo comum aos não leitores. Não há o menor risco de Monteiro Lobato ou Manuel Bandeira estimularem ideias racistas. A imensa maioria dos brasileiros da atualidade não os leu nem jamais os lerá.



É pena que Lobato e Bandeira sejam desconhecidos para muitos. Uma pena, também, que poucos saibam quem foi Stanislaw Ponte Preta, pseudônimo do jornalista Sérgio Porto, autor do divertido Febeapá – O Festival de Besteira que assola o País (Agir, R$ 63,90). Lançado em 1966, o primeiro volume foi um sucesso e teve duas edições nos anos seguintes, sempre com coletâneas das bobagens proferidas por brasileiros. Talvez hoje a ironia de Sérgio Porto não se adequasse aos tempos politicamente corretos. No entanto, muito do que ele registrou é semelhante ao que continua se falando Brasil afora. Podem conferir!



"O mal do Brasil é ter sido descoberto por estrangeiros" (Deputado Índio do Brasil, Assembleia do Rio).

O Diário Oficial publica "Disposições de Seguros Privados" e mete lá: "O Superintendente de Seguros Privados, no uso de suas atribuições, resolve (...), "Cláusula 2 — Outros riscos cobertos — O suicídio e tentativa de suicídio — voluntário ou involuntário".

A Polícia de Mato Grosso não é nem mais nem menos brilhante do que as outras polícias. Tanto assim que um delegado de lá, terminou seu relatório sobre um crime político, com estas palavras: "A vítima foi encontrada às margens do rio Sucuriu, retalhada em 4 pedaços, com os membros separados do tronco, dentro de um saco de aniagem, amarrado e atado a uma pesada pedra. Ao que tudo indica, parece afastada a hipótese de suicídio".Em Campos (RJ) ocorria um fato espantoso: a Associação Comercial da cidade organizou um júri simbólico de Adolph Hitler, sob o patrocínio do Diretório Acadêmico da Faculdade de Direito. Ao final do julgamento Hitler foi absolvido.




2.10.12

Despedida

Hoje faz onze anos que enterrei minha mâe. Coincidentemente, meu primo, que tem uma oficina mecânica, foi pegar meu combalido carrinho, que estava há 21 anos em minha companhia. A velha Elba Weekend, que começou sendo chamada de Llorca, por ser verdíssima, transformou-se em Abatida (devido às numerosas batidinhas e batidonas que apresentava), passando por Ruína e quase virou uma Relíquia.

Foi a relação mais estável que tive nos últimos tempos. Ela chegou num 13 de agosto, dia de aniversário de minha mãe, no mesmo ano em que meu pai morreu. A primeira viagem foi para Rio das Ostras, de onde saímos às pressas, quatro dias depois, para o enterro do pai de Martha, minha querida amiga. Foi o carro da família, o único em que eu enfrentei viagens além de 100 quilômetros no volante.

Nele peguei incomensuráveis engarrafamentos pelas estradas fluminenses, chuvarada, sol abrasador, geralmente com as crianças cantando no banco de trás. Foi lá que Jùlia começou a emitir sons. Os meninos cantavam Old McDonald  e Júlia, bebê, na cadeirinha, bradava "Ia-ia-ôô!". No início, era apenas uma cadeirinha, que Oto ocupava, Artur já amarradinho aos cintos. O rádio logo se quebrou, mas não havia problema. Oto conversava o tempo todo. Quando Artur dormia, ele cantava. Se havia silêncio no carro, era o sinal de que Oto também adormecera.  Depois, foi a fase das duas cadeirinhas, com o nascimento de Hugo. Elas permaneceram no banco traseiro por um bom tempo, mas acho que só tenho foto do Hugo sentado em uma delas.

E nele, viajamos, passeamos, andamos muito. Enfrentei enchentes no Rio de Janeiro, entrando com o coitado em lagos formados pela chuva. No último, Artur já era homem e teve que se enfiar na água para empurrar o pobre, que engasgou na poça. E teve a vez, anos antes, que ele morreu totalmente, numa noite em Rio das Ostras, só eu e Danúzia para empurrarmos, sem luz na cidade. Praticamente me joguei em frente de um carro, pedi ao motorista que viesse empurrar conosco (tinha uma pequena elevação na entrada da garagem), enquanto falava o tempo inteiro "Fique tranquilo, os cachorros são bem treinados. Calma, Trovâo, calma, Lua, é amigo, amigo". Os cães, nem tentaram colaborar com minha criação dramatúrgica para assustar o desconhecido que, poderia ser um perigosíssimo assaltante, segundo Danúzia.


Com meus filhos, gostávamos de dar voltinhas à noite pelas ruas da Urca, olhando as casas de um bairro em que jamais iríamos morar. Às vezes, subíamos pelas ruas com casinhas no Jardim Botânico, no Horto. E também íamos para Santa Tereza, em busca de um Rio de arquitetura mais aconchegante, amigável.  

Bem, chegou a hora. Não haverá outro carro tão cedo. Talvez nunca mais. Hoje, me locomovo de táxi, se precisar viajar, posso alugar um carrinho. Junto com o Llorca se vai a meninice de meus filhos e um bocado de nossa história. Desapegar é difícil. Principalmente porque o carro estava em nome de minha mãe. Era o único objeto dela que ainda estava comigo. Acho que hoje eu deixei Mamãe sair de minha vida.

24.9.12

Emmy 2012


Foi uma festa coloridíssima e de moda pouco ousada, quase austera. Geralmente, as premiações de Hollywood são bem menos atrevidas em criatividade de figurinos do que as da música pop, em que os astros se esmeram na procura de apresentar a roupa mais pavorosa que alguém possa envergar. A entrega do Emmy foi uma das mais chatas de todos os tempos, com um apresentador pra lá de sem graça e uns modelitos tão sem imaginação que eu senti muita falta mesmo da Helena Bonham-Carter. Mas sempre houve atrocidades, algumas delas listadas abaixo.

Como o destaque da noite foi a paleta de cores, elas servem de divisória para meus comentários, fashionista que não sou. Igual aos anos anteriores, contei com o inestimável apoio e as observações de minha amiga Sol, que estranhou, de cara, a classificação enlouquecida de Heidi Klum de que a cor de seu esvoaçante vestidinho verde-água (que na impressão parece azul-bebê) era Sea Foam - Espuma do Mar. Espuma de mar, pelo menos aqui no Rio, é branca. E um sutiãzinho pegava bem...





Uma variação da espuma do mar, dentro da daltonia Klum, foi o vestidinho de sereia de Sofia Vergara, fazendo a linha J-Lo não pôde vir.  






Ainda no mesmo tom, mas com um ar mais primaveril-poltrona, Juliana Margolis.



O que imediatamente remonta a um dos mais pavorosos vestidos da noite, da Elizabeth Moss do Mad Men, uma das amalucadas que nunca falham, sempre buscando o inusitado, o bizarro. Também foi na linha decoração de interiores. A padronagem é de papel de parede para norte-americanos. Ou almofada. Detalhe: a bolsinha. Sem contar o modelo, que não fica bem em ninguém mesmo. Nem em artista de cinema.


Ainda no reino encantado da estamparia de cortinas, surgiu a roupa da princesinha Branca de Neve/Ginnifer Goodwin, cabelinho curtinho, arrumadinho, vestidinho mais curto na frente pra ficar bem esquisitinho. Com um cinto para marcar bem e um sapato de biqueira em couro e plástico transparente, para mostrar os artelhos. 



Entramos então nos tons avermelhados, cor que, geralmente, combina com todos os tons de pele. Alguns modelitos da noite, no entanto, eram inadequados às dimensões de quem os envergava como a mulher de peito abaixo, concorrente séria ao Troféu Jayne Mansfield. .


A moça abaixo eu não conheço. Mas o vestido, sim. Ficou lá no fim da década de 70, nos embalos de sábado à noite. Para combinar tanto desalento, cabelos completamente revoltos, no melhor estilo Woodstock. Totalmente vintage. E, claro, sapatos dourados.


E então, em coral, surge a veterana Jessica Lange, que já passou da fase em que não se deve mais exibir braços em público. Manguinhas, senhora, mesmo que sejam em filó, transparentes, ajudam a esconder as marcas desagradáveis da idade.



E aí chega a moça abaixo, que, eu não sabia, é um gênio, igual à personagem que ela interpreta em The Big Bang Theory. Adorei a cor, mas o modelo poderia ser menos baile de formatura da década de 80.


É, Jena Malone, eu também estaria emburrada se alguém me fantasiasse de coro greco-romano...


Já Julia Louis-Dreyfuss, que mal conseguia se locomover com o vestido cuja cauda se prendeu no palco quando foi receber seu prêmio, não estava nem aí. Na frente, até que tudo ia bem. Atrás, além de aumentar o derrière, apertava os joelhos e impedia longas passadas.

Tina Fey lembrando um balcão de teatro de ópera - qualquer um.


E Ashley Judd, sereia rosada, revigorando o penteado bolo de noiva, mostrando suas raízes na country music.

Kelly Osbourne também honrou a deselegância discreta de sua dinastia, combinando o tom lilás do vestido com o do cabelo - ou seria o contrário?


Como a concorrência estava fraca, o modelito mais pavoroso da noite foi este. Indesculpável. Olha a tristeza da Emilia Clarke.


A absoluta  Rainha do Botox, Nicole Kidman, etérea, altíssima, branquinha, em momento portelense homenageando She-Ra, a irmã de He-Man, com lacinhos no sapato. Melhor fez a Rita Wilson, madame Tom Hanks, num pretinho básico, continua recorrendo ao melhor cirurgião plástico de Beverly Hills, provavelmente o mesmo que fez parar o tempo no rosto de Susan Sarandon.






E aí vêm os azuizinhos. Tudo tão feminino, tão vestidinho de formatura, tão desmilinguido ...


.... tão esvoaçante, né, Zooey Deschanel? 


... tão amedrontador...



... ou tão encantador quanto este sari estilizado sobre o dourado!




Amarelo é minha cor favorita. Em pinturas. Tem que ser muito linda mesmo para se enfiar num vestido-guardanapo e ainda ficar bem como a Kelly Cuoco ou a grávida Claire Daines.



A maravilhosa Julianne Moore também aderiu ao tom de limão siciliano, num modelo pra lá de sem-graça.

Nada que se comparasse ao verde de irremediável neon de Julie Bowen.



Deu mais ou menos tudo errado no diáfano modelito de Emily VanCamp. A transparência ficou estranha, a cor pegou mal e a pulseira de brilhantes em forma de laçarote é atroz. O que vale é que a moça é uma gracinha, né?





O tom do traje de Emily Vancamp era parecido com o do apavorante macacão de Portia de Rossi, que, inexplicavelmente, enfeiou, enquanto Ellen de Generes fica a cada dia mais jovial.



Christina Hendriks, de Mad Men, jamaism me decepciona. Até que para os padrões dela, estava discreta. E, como sempre, vencedora incontestável do troféu Jayne Mansfield.


Finalista da categoria noiva gótica, Kate Mara perdeu...


... para Kristin Wigg, que conseguiu trajar algo feio, desconjuntado, medonho mesmo.





Também não gostei da Elegia ao Robocop, título da fantasia de Lucy Liu.









A combinação de preto e branco sempre dá certo? Não no trágico caso acima. O detalhe da transparência abaixo dos joelhos é pior do que a armadura de esgrimista para os seios.





 Eu, se fosse a Melissa McCarthy, pedia o telefone do costureiro da Kathy Bates, que sempre foi gorda e consegue se apresentar numa festa com uma roupa mais descontraída do que a da atriz mais jovem. Por que essa obsessão em marcar cintura de gordo? 



O prêmio Johnny Depp de mais mal ajambrado foi para Jeremy Davies. Não apenas pelo paletó curtinho e os sapatos marrons, mas, principalmente, pelos cabelos raspados em pontos da cabeça. Segundo Sol, é a composição do personagem que ele faz atualmente na TV. Custava botar um chapéu?