9.10.12

Fantasmagórica

Há dez anos escrevi um artigo para uma revista de circulação restrita. O artigo foi assinado por outra pessoa. Era minha primeira experiência em ghost writing - e a única dolorosa. Eu trabalhava como assessora de imprensa de uma respeitável instituição de saúde. A médica em questão não tinha tempo para escrever. Sequer me deu diretrizes do que abordar. E eu nem vi onde foi publicado meu texto malhando a indúsria do tabaco, comparando-a a governos que empregam assassinos de aluguel.
O cigarro, no artigo, era elegante, charmoso e letal como 007, que, por baixo do smoking (olha a outra associação lógica...), não passa de um agente da morte. E, como James Bond, o cigarro também ganhava um selo de aprovação da Casa de Windsor para ceifar vidas em nome da liberdade do mercado capitalista.
Metáforas pueris à parte, o texto ficou bom, a médica gostou e ele se foi. Senti-me como o personagem do Gene Kelly em Um Americano em Paris, pintor que vê suas obras serem negociadas e nunca mais deverá tê-las sob os olhos.
Não sei se é pior ver nossa criação premiar outrém ou ser alguém sem ideias próprias, laureado pelo talento que aluga. Fiz outros ghost writings de menor alcance ainda - dois livros pavorosos sobre terapias de vidas passadas. Não compreendo como alguém entrega seu próprio discurso a outra pessoa. No mínimo, tem que rascunhar seu pensamento e passar o texto final ao redator.
Eu morro é de inveja do que já escreveram antes de mim.

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