25.1.05

Minhas vidas sem mim

Sempre me considerei espécime único. Quando criança, por ter nome de velha – toda Olga é neta de alguma Olga – só conheci uma xará durante os 14 anos de colégio e 4 de faculdade. Mesmo assim, a outra olga era Olga Cristina. Na adolescência, fui muitas vezes chamada de Olga Korbut, uma ginasta russa antecessora da romena Comaneci, anos luz antes da Diane. Havia mais quatro olgas referenciais: uma jornalista da Cláudia ou Casa e Jardim, Olga Krell, se não me engano, Olga Benário, “a mulher do Prestes que Getúlio mandou pro campo de concentração grávida”, conforme repetia minha mãe, uma tia avó, e, finalmente, minha terrível avó Olga.
Normalista, era chamada pelos aluninhos de Alga. Com o lançamento do livro “Olga”, passei a ser reverenciada por todos os comunistas conhecidos aos quais explicava que meu nome homenageava minha avó. A admiração pelo nome voltou com o filme e várias vezes tenho que informar a origem de meu nome.
Adulta, comecei a topar com olgas, algumas delas jornalistas, como Olga Curado, subeditora da Nacional do Globo quando eu era foca da Geral. Sabia da Olga porque ela dava uma risada estridente e muito característica, silábica, que era acompanhada por toda a redação. Ela começava “Há-Há-Há” e ia subindo o tom, enquanto o jogral engrossava o riso dela, que aí então é que ria mais ainda. Meu primo Sérgio se casou com uma Olga. Não deu certo. Eu também me descasei de um Sérgio, mas isso é outra história.
Bem, Olga não é um nome único. Mas Olga de Mello deveria ser. Não é. Não é mesmo. Bem que minha mãe queria que eu fosse Olga de Borba Moura Mello. Mamãe era Borba Moura. Meu pai, Mello, apenas. Coisas de catarinense. Ninguém na família dos meus avós tinha dois sobrenomes. Minha avó Júlia, que era Vieira e Lobo, ficou apenas Júlia Maria de Mello. Meu avô, Antero Antônio de Mello. Os filhos, portanto, só receberam o sobrenome Mello.
Lógico que Papai jamais teria homônimos, pois chamar-se Alinôr torna alguém quase único. Mas ele poderia ter sido mais generoso ao me registrar, dando mais alguns sobrenomes à filha. Além de consagrar-me aristocraticamente, não me traria surpresas ao vasculhar a Internet. Uma amiga resolveu procurar matérias minhas na Web. Digitou Olga de Mello e foi aí que descobrimos que eu ... fui professora de francês e tive um filho em 1922; tenho um neto engenheiro; sou mãe de uma jornalista paulistana; trabalho num órgão de informação sobre estrangeiros do governo federal; fui uma dona-de-casa indignada ao ser obrigada a aguardar a chegada da Polícia para entrar em uma agência bancária assaltada, em Joinville; e, finalmente, morri, en la paz del Señor, em 1º de março de 2003, deixando mis hijos Matilde Isabel, Miriam Lilyan, Vicente Ubaldo y Luis César Tapia e mis nietos, bisnietos y demás familiares con profundo dolor, em Montevidéu, tendo sido sepultada em um cemitério que tem estacionamento próprio, conforme informa o anúncio que a família consternada publicou.

E eu que me achava a única Olga de Mello.

Do Multiply - 21/12/2004

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