24.4.06

Meus santos




Eu estou vestido com as roupas e as armas de Jorge.
Para que meus inimigos tenham pés e não me alcancem.
Para que meus inimigos tenham mãos e não me toquem.
Para que meus inimigos tenham olhos e não me vejam.
E nem mesmo um pensamento eles possam ter para me fazerem mal
Armas de fogo, meu corpo não alcançarão
Facas e espadas se quebrem sem o meu corpo tocar
Cordas e correntes arrebentem sem o meu corpo amarrar.
Pois eu estou vestido com as roupas e as armas de Jorge

Meu primeiro contato com São Jorge veio através de Caetano Veloso, cantando "Jorge da Capadócia". Um santo simpático, que vive no mundo da Lua, comendo bolinhos feitos por Tia Anastácia, que salvou donzelas, matou um dragão. Padroeiro de tantos países, mártir da Igreja Católica, protegendo a Inglaterra (protestante). Hoje gosto muito de São Jorge, da festa nos morros, o foguetório, a Praça da República cheia de gente vestida de vermelho. E esta oração, lindas palavras aproveitadas por Jorge Ben no "Jorge da Capadócia".

Desligada de crenças, tenho carinho pelos homens santos. Por São Francisco, 'dono' do meu dia de aniversário, que gostava de animais (e eu também, claro), o santo favorito de meu pai, que também não era crente, mas gostava do que ele chamava "o primeiro hippie". De São Sebastião, o padroeiro de minha terra, um santo guerreiro como Jorge, protetor das matas na umbanda. Vim a saber que ambos, Jorge e Sebastião, são Oxóssi, um na Bahia, outro no Rio. Tudo bem, já disseram que sou filha de Oxóssi. São Judas Tadeu é o santo flamenguista e preferido de Maria, minha babá. E São José, o de minha mãe.

Não gosto de religiões. Mas essa gente santa, que não era santinha, pecava, lutava, brigava e amava, essa gente era muito boa, muito forte. São Jorge morreu de turrão, defendendo seus ideais. Algo que hoje pouca gente tem o brio de fazer. Conheço um pouco desses santos porque, quando repórter, era praticamente setorista de religião. Havia festa, lá estava eu, grudada no Cardeal, já que compreendia como poucos os ritos. Então, cobri a festa de São Jorge na Praça da República e em Quintino, era habitué da benção dos Capuchinhos, fazia procissão de São Sebastião, Dia de Santo Antônio e até o Círio de Nazaré (na mesma igreja dos Capuchinhos, na Haddock Lobo, cercada por barraquinhas de pato com tucupi). Embora as músicas sejam, geralmente, ruins e entoadas com uma desafinação estridente de fazer inveja às senhoras componentes das velhas guardas de escolas de samba, a festa é alegre, bonita. Gente que se veste com cores de santos, que acreditam na manifestação das entidades da umbanda de terço na mão, compenetrados, sem entender racionalmente o que os leva ao culto. Os santos são os embaixadores, os amigos, a família que cada um escolhe para ajudá-lo a enfrentar a vida material.

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