22.9.06

No Valor, hoje


Sobrevivente de uma idéia ousada
Quando o carioca Charles Cosac desembarcou em São Paulo, em 1996, após uma temporada de 15 anos na Europa, estava determinado a abrir uma editora de livros de arte. "Não procurava uma brecha de mercado, não pensava em ganhar dinheiro. Eu queria construir algo para mim e para o Brasil." Associou-se ao cunhado, o americano Michael Naify, e seis meses depois publicavam o primeiro livro, "Barrocos de Lírios", um cuidadoso volume sobre a obra do artista plástico Tunga.
Hoje, o catálogo da CosacNaify apresenta 500 títulos de história e teoria da arte, cinema, teatro, design, arquitetura, fotografia, dança, moda, literatura, filosofia, antropologia e crítica literária, todos seguindo um padrão requintado, de altíssima qualidade. "O que nos faltava em experiência administrativa, compensamos com ousadia e dedicação. A empresa cresceu sem planejamento algum. Ninguém nos dava mais do que um ano de sobrevivência."
Rapidamente, Charles Cosac descobriu que, apesar da carência de livros de artes visuais, firmar-se no mercado editorial brasileiro não seria fácil. "Na Europa, um livro de arte pode ter uma tiragem de até 50 mil exemplares. Aqui, é de apenas 3 mil volumes. O ciclo de um livro comum é de um ano e meio, desde a preparação ao tempo que permanece nas prateleiras. O livro de arte tem um ciclo muito maior, de cinco a seis anos. Eu imaginava que não encontraria concorrência, que era um ato filisteu brigar por um título no Brasil. Havia uma certa irreverência em lançarmos uma editora voltada para esse nicho dentro de um país onde nem os letrados têm o hábito de ler", lembra Cosac.
Reconhecendo que lhe faltava "uma visão panorâmica" da editora, há cinco anos se afastou da administração para se dedicar exclusivamente ao preparo das edições de livros de arte. "Acompanho tudo o que acontece na empresa, mas aprendi a descentralizar e garantir que a editora tenha vida própria, sem estar ligada a mim necessariamente."
A ênfase ainda é em arte, que responde por 35% do catálogo. Há espaço também para apostar em inovações, como a caprichada recente edição do clássico "Bartleby, o Escriturário", de Herman Melville. A capa é lacrada e as páginas, coladas, precisam ser abertas por uma espátula plástica, que acompanha o volume. Semelhante às edições da época de seu lançamento, em 1853.
Radicar-se em São Paulo foi uma decisão tomada a partir da criação da editora. "São Paulo é uma cidade dinâmica e referência para a arte no Brasil. Aqui havia mais chances de sucesso para uma editora de livros de arte", afirma Cosac. Ao chegar, não desanimou com a complexidade do processo para abrir um negócio no Brasil: "Levei um susto com o número de documentos exigidos para se alugar um imóvel. Na Europa seria bem mais simples. Mas eu não ia desistir. Queria fazer algo que não fosse efêmero, que sobrevivesse a mim, que ficasse para o meu país".
Dez anos depois, ele percorre a pé os dois quarteirões entre sua casa e a editora, em Higienópolis. Para garantir a paz de espírito, não quer enfrentar trânsito e evita ler os noticiários. "Prefiro a distância do que me angustia. Sou o homem mais rico de São Paulo, pois não preciso dirigir até meu escritório. Faço o meu próprio tempo, tive o privilégio de criar uma vida feliz para mim."

(Olga de Mello, para o Valor, do Rio)

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