19.8.09

Recordações de uma menina de apartamento



Quando a gente imagina que nossos políticos não têm criatividade em suas propostas, eis que surge o projeto do deputado pedetista Paulo Ramos que determina ao Estado do Rio de Janeiro a criação de pipódromos, locais seguros onde a população seja instada a soltar pipas.
Fui uma criança de apartamento. Não brinquei na rua, mas ainda peguei trânsito interrompido em Ipanema para a molecada jogar futebol nas travessas menos movimentadas. Embora menina, sempre quis soltar pipa. Nem em ventilador, consegui. Um dia, arrumei linha, umas varetinhas, e fiz uma pipa, com papéis pautados, de caderno. Tentei soltar, sem qualquer sucesso, na janela.
Muitos anos depois, um conhecido se acidentou gravemente no Aterro. Passava de moto, num fim de semana, e teve o pescoço envolvido por umna linha com cerol. Sofreu um corte violento, foi levado para o Souza Aguiar onde tomou 54 pontos - internos e externos, creio.(Naquela época, o Aterro era aberto aos fins de semana para lazer, mas motos podiam trafegar.)

Meu encontro definitivo com a atividade veio quando fui escalada para a cobertura de concurso de pipas, patrocinado pelo Globo, claro, no Museu Aeroespacial, na Zona Oeste. Aquelas roubadas de plantão, que cumpríamos temendo que surgisse um crime nas cercanias, levando a um deslocamento que tomaria algo em torno de seis horas da vida.
(ZOeste era aquela área cinzenta na cabeça das chefias de reportagem da década de 80, sempre acompanhada pelas expressões "aí pertinho" ou "aí ao lado", que considera vizinhos Bangu e Mangaratiba. A infeliz equipe percorria Campo Grande e recebia um chamado no rádio para dar um pulinho em Curicica, "que é aí, ao lado". Na Zona Oeste não existe "aí pertinho". Tudo fica, no mínimo, a 15 quilômetros do primeiro ponto.)
Deu tudo certo naquela tarde. Céu limpo, sem cheiro de nuvens, famílias de pipeiros se esmerando em manobras, pipas coloridíssimas que fizeram a festa do fotógrafo e nenhuma conclamação radiofônica para abandonar aquela tranquilidade. Um pipeiro, ao saber de minha total inexperiência no setor, me levou a empinar uma pipa - impressionamente fácil, apesar das puxadas dos ventos.
Do alto de minha parca experiência na atividade, e embora consciente a respeito do perigo da exercê-la próxima às linhas elétricas, acredito firmemente que pipa é igual a peteca ou frescobol. Não é preciso muita regra, apenas disposição para empiná-las. Pandorgas, papagaios, pipas, tomem os céus livremente, sem regulação! Deixem a molecada subir morros e, mais libertário ainda, invadir o viaduto São Sebastião, que liga o Santo Cristo ao Catumbi, perto do Sambódromo, para arranhar os céus com seus pedaços de papel! Pipas são gritos de liberdade.



(Os papagaios sumiram das areias de Copacabana?)

2 comentários:

Jôka P. disse...

Menina, baixou uma cabocla blogueira !
Quantos posts novos !

AOS QUARENTA A MIL disse...

Olga,

levo meus meninos a praia direto para soltar pipas. É muito bom, porém temos um acordo. Em função do meu trabalho tenho acesso a fotos de acidentes com crianças com queimaduras em rede elétrica por causa de pipas e garanto, são muitos.

Então peço que não soltem pipa (cafifa aqui em SG) nas ruas, nem tão pouco corram igual a uns alucinados atrás delas , pois é outro fato causador de inúmeros acidentes com fraturas sérias e óbitos. Em troca , me comprometo a levá-los em qualquer lugar que seja apropriado para isso.

Seria de grande utilidade se as companhia elétricas fizessem uma parceria em torno deste projeto , a idéia do Paulo Ramos é excelente e o seu post show de bola.

Vou indicar este post no meu blog como forma de alerta,se você permitir. Adorei!

Um grande abraço!