1.9.10

Nota de falecimento

Todo mundo tem uma história com o Jornal do Brasil. Todo mundo do Rio, claro.
Tanto quem o fez como quem o leu.
Quando fui contratada pelo Globo, onde permaneci por dez anos, de 83 a 93, um ex-namorado se espantou. "Você? No Globo?". Uma amiga, na praia, se indignou: "Ah, sai do Globo, vai pro JB. Tem muito mais a ver com você".
Isso porque o JB era o jornal da Zona Sul. O Globo, conservador, era a voz da Tijuca, enquanto o Dia era dos subúrbios e Baixada.
Eu morria de inveja de quem trabalhava no JB porque sabia que a redação tinha, além de salários melhores do que os do Globo, na época, o que chamavam de "salário ambiente". Ninguém gritava. Todos eram sorridentes. O Globo era uma pedreira que só perdia para O Dia em tensão.
Em 1995, fui trabalhar, enfim, no JB, já em decadência. Os salários não atrasavam, mas haviam se apequenado. A Revista de Domingo ainda mantinha o charme do veículo, elegendo musas de verão. Só permaneci por lá durante um ano e pouquinho. Não conheci o JB da nostalgia. Gostei dele, claro, mas não era minha casa, embora continuasse sendo o meu jornal. Até quando estava no Globo eu assinava o JB.
Quando criança, eu preferia o Globo pelas histórias em quadrinho. Mas meus pais compravam os dois, porque eles queriam ler os colunistas do B - Carlos Drummond e Clarice Lispector, entre eles. Depois vieram muitos, entre eles Veríssimo - que passou pro Globo, como todo mundo.
O Caderno B era limpo, moderno, arrojado. Permaneceu assim enquanto pôde. Abria fotos descomunais, como na morte de Marcello Mastroianni, em 96, com a legenda "Ciao, Marcello" (a editora era minha amiga querida Regina Zappa). Um exemplo apenas, da memória que resta.
Meu pai foi da finada Última Hora, onde conheceu meu padrinho, João Ribeiro. Foi a primeira redação que frequentei, adolescente. Quando a Última Hora acabou, doeu em muitas gerações de jornalistas. Nesses quase 50 anos, vi morrerem outros veículos, diversas emissoras de TV (Rio, Manchete, Excelsior, Tupi), revistas (tudo da Bloch - quem se lembra da Amiga?-, além de Fatos e Fotos, Sétimo Céu, Realidade, Senhor... acho que até o costureiro Gil Brandão tinha uma revista). De jornal pranteado só me recordo do Correio da Manhã.
Do meu breve tempo no JB tenho boas recordações e grandes amizades. Lá conheci meu irmão e sócio Eduardo Graça, estreitei laços com Naná Ferreira, travei embates diários com meu agora vizinho Affonso Nunes, além de ter visto nascer uma geração que hoje milita pela redação do Globo ou de outros veículos. Não é deste JB que eu sinto mais falta, mas de um que já havia trocado de formato, em todos os sentidos.
A lamentar é que o jornal, como tantas outras empresas, não morreu pela concorrência, mas pela pouca competência de seus gestores.

Um comentário:

EP disse...

Minha brevíssima passagem pelo JB se deu na sua pré-morte, em 1998. Agora foi só o fechamento do caixão.