20.6.12

Dá um tempo?

Um dia, na remota década de 70, no século XX, quando cursava Magistério, almejando ser professora, me contaram que a ciência comprovara a necessidade de intervalos de tempo para o processamento de conceitos pelo cérebro. Aparentemente, só as mentes de gênios eram capazes de sugar informações novas e gravá-las sem repetição constante.
Uns dez anos depois, desistira do magistério e, cercada de filhos pequenos, comprovei que o aprendizado estava intrinsicamente ligado à repetição. As jovens criaturas só se habituam a tomar banho diariamente, a cumprimentar o porteiro, a mastigar de boca fechada, a calçar sapatos fechados nos dias de chuva porque são condicionadas a isso porque um bando de adultos repetem incessantemente esses comandos.
Então, no século XXI, a Internet decidiu apressar nossas vidas. Não há mais tempo hábil para nos acostumarmos com formulários, feitios, formas. Enquanto os estilistas de moda lançam duas coleções por ano, fomentando o consumo de novas peças de roupas que cairão em desuso na próxima estação, os gênios da Internet mudam o que puderem a cada semana. Não vou duvidar aqui do brilhantismo dos jovenzinhos que criaram a vida virtual. Eles facilitaram minha existência profissional - embora tenham contribuído para minha inércia e sedentarismo, que me levaram ao aumento de peso e a dores terríveis em todo o lado direito, arrebentado de tanto escrever e mexer em traquitandas como mouses. Só que esses jovenzinhos acreditam piamente que o mundo inteiro é de gente imatura que só se alegram se receberem doses incessantes de novidades.  Claro, porque se eles se apegarem a alguma imagem, se não considerarem tudo anacrônico, obsoleto, deixarão de consumir produtos com design mais apropriado ao fugaz momento atual.
Cadê o momento atual? Inexiste tanto quanto o etéreo espaço virtual.
Por causa da Internet, trabalho muito além do que já trabalhei em épocas de maior vigor físico. Aos 51 anos tenho jornadas diárias de 10 horas corridas, com poucos momentos de deslocamento para fora de minha poltrona. A Internet me distrai quando me canso da labuta em si. O telefone está ao lado para controlar a rotina da família, faço transações bancárias pelo computador.
Em casa, o computador se tornou o principal objeto de lazer de toda a família. Meus filhos se comunicam epistolarmente com os amigos. Ninguém sabe os telefones dos amigos de cor, ninguém se pendura mais por horas nos aparelhos, cuja utilização menor não reduziu as tarifas estratosféricas.
Por causa do Facebook, escrevo menos blogs, mas entro em discussões sobre ética profissional de assessoras de imprensa que já posaram de lingerie.
Continuo prezando sinceramente a confortável vida que a tecnologia me proporciona, mesmo sabendo que o tempo é cada vez mais escasso para aproveitar a convivência com os outros. Só gostaria que, vez por outra, quando decido fazer alguma postagem simples no meu blog, não encontrasse tantas novidades em formulários - geralmente atreladas a pedidos de registro de meu celular para que eu receba sabe-se lá o que por SMS - que me tiram o foco do que pretendia escrever. O que eu mais desejo é o que qualquer um, assoberbado pela pressa em capitalizar a vida quer hoje: dar um tempo!

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