20.3.13

Não vale o escrito

Um vestibulando escreve receita de miojo na prova do Enem e ganha nota classificatória pelo deboche - que o rapaz, já na Faculdade de Engenharia, informou ter sido apenas uma maneira de provar a ineficiência dos que corrigem as provas. Outro concorrente, que cursa Medicina, usou o hino do Palmeiras para encher linhas e linhas de uma redação fraquinha também. Outros candidatos fazem erros de grafia crassos e têm nota máxima.

Antes de me exasperar com a falência da Educação brasileira, deixo claro que os dois brincalhões são universitários que se comportam como boa parte da classe média brasileira. Agiram igual a menininhos, quando deveriam enfrentar as consequências de suas atitudes imaturas. Eles afirmam que pretendiam mostrar o descaso dos corretores das provas, embora, aparentemente, apenas preencheram o número de linhas necessário para que as redações passassem por examinadores. Por que algum estudante seria tão abnegado a ponto de perder um dia de folga para fazer uma prova? Por amor à Educação?

Deveria haver alguma exigência, alguma dignidade ao tratarmos de língua, de ensino, de conhecimento. Mas não há. Existe a superficialidade, a informalidade, o jeitinho que domina e mediocriza nossas vidas.Se a língua é dinâmica, esses rapazes não a transformam, mas apenas a ignoram. Pior que estudantes errarem pavorosamente na escrita é termos professores tementes a alunos, de tal maneira que fazem qualquer coisa para evitar a reprovação dos meninos. Não se ensina, nem se exige conhecimento. Tremo em imaginar que o pessoal das exatas também faça vista grossa para erros de cálculo que podem botar em risco as vidas de quem entrar em prédios mal projetados, por exemplo.

Brigada anti-PT/PCB/socialistas/comunistas/anarquistas/esquerdistas & Cia, nem se anime! Isso não é culpa do governo atual, não. É culpa de um desprezo absoluto com a educação e com a cultura no Brasil, que vem de administrações anteriores - e que a atual tem mantido, diga-se a verdade. Expressar-se bem é pedantismo. Qualquer tipo de requinte é anacronismo. Isso vale para qualquer campo da vida brasileira, pautada pela informalidade que, num raciocínio ilógico, estaria ligada diretamente à jovialidade, ao culto de um período efêmero da existência.

A desvalorização do professor brasileiro tornou-se uma tradição. Remunerações baixas afastam muitos da vocação de ensinar. A falta de respeito transformou salas de aulas em arenas onde alunos se apresentam mais pelo costume do que por necessidade de aprender. Vontade de aprender? Alguns têm, mas são poucos. Estudar é chato, é maçante. Criamos gerações para as quais o esforço não tem sentido algum. Isso vem de casa? Vem, sim, mas se alimenta da passividade das muitas escolas que tratam os alunos como clientes.

Os vestibulandos que se redimem das molecagens nas provas, afirmando querer chamar a atenção dos corretores, têm argumentação tão pueril quanto a péssima pontuação e acentuação. Eles atestam o vexaminoso estado da educação brasileira. O modelo do Enem é ruim, o modelo de colégio é ultrapassado, o desejo de buscar conhecimento é inexistente? A superficialidade continuará a imperar desde que a sociedade permaneça tendo no consumo e na ostentação seus valores máximos.

(Reproduzidas à exaustão em tudo quanto é jornal, as redações dos jovens comediantes apontam outra necessidade imperiosa nos colégios do País: aulas de caligrafia pra moçada! Caramba, é cada letra de meter medo...)

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