2.3.20

Copacabana não me engana

Há cerca de nove meses no Balneário, ainda me surpreendo com as confidências que ouço de absolutos desconhecidos. No Mundial, a vizinha de fila aponta um homem maduro que passa sem camisa. "Tem um aviso lá fora proibindo entrarem sem camisa, mas ele nem liga...", brada ela, enquanto eu, ser em elevação espiritual, toda imbuída de amor à Humanidade, justifico o descamisado, lembrando o calor infernal que fez o dia inteiro.
- Ah, mas nós, mulheres, temos que aguentar o calor, né? A gente também devia poder andar sem blusa.
Concordo, tentando não imaginar o bando de senhoras (sou, provavelmente, a mais jovem da fila inteira) em topless. E ela volta à carga:
- Olha, não sou racista, já fui casada com um preto.. mas vc repara que só preto anda assim, sem camisa.
- Não mesmo. Tem um monte de garoto marombado, pitboy de academia, que desfila sem camisa pela rua! - retruco, sorrindo, sempre amistosa para a não-racista, que continua.
- Nunca vi branco assim.
- É só olhar ao meu lado - aponto um senhor que passa por nós, ostentando um físico semelhante ao do Gerard Depardieu.
- É preto! Pode ver.
- Caramba, o cabelo dele é mais liso que o meu, a pele mais clara ainda...
Chegou minha vez de passar pela caixa e o papo minguou. Momentos antes, ouvi alguns funcionários do mercado em intensa conversação. Um falava: "Já disse pro meu filho que ele tem que respeitar, mas que não é natural, não, e que ele não pode se acostumar com isso. Só respeita, deixa eles pra lá". Pelos semblantes pensativos, parece que falavam sobre gays.
Em minha gestação como copacabanense Nutella - como diz um amigo, que é Copacabana raiz - ouvi pelo menos quatro desconhecidos externarem sem o menor pudor opiniões homofóbicas e racistas. Lá na Província não era assim, não.
(O Brad Pitt descamisado é só porque a gente merece...)


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