12.2.05

Terra de Ninguém

Cada vez mais me falta a virtude da paciência. Mas não sem alguma razão. Há dias li uma crônica do Zuenir na qual ele falava sobre a total falta de respeito que assola as salas de projeção cariocas. É a mais pura verdade. Basta entrar num cinema de shopping para passar pela provação de aturar uma platéia barulhenta e, mais que isso, inconveniente.
Na verdade, o fenômeno se repete continuamente nas salas do Rio Sul. No Botafogo Shopping, embora haja programação preferencial pelo filme-pipoca, as platéias são mais comedidas. Falo do Rio Sul e de suas péssimas saletas porque caio sempre na esparrela de fazer compras diversas e aproveitar para pegar um cineminha. Eu trabalhei na Torre, então era comum sair do trabalho e dar uma passada num cinema em dia de semana. Mas está ficando muito difícil enfrentar a horda de futuros pitboys e marias tatame que se agrupam naquelas salas.
Tive a infeliz idéia de ir assistir “Em Busca da Terra do Nunca” lá. Filme bonito, tocante, porém arrastado, lindas interpretações, Julie Christie soberba, muitos casais, alguns pais com filhos crescidinhos, mocinhas – e balzacas, pós balzacas, o mulherio todo, enfim - suspirando por Johnny Depp, tudo correndo relativamente bem. Uma horda adolescente entrou, celulares em punho, fazendo algazarra discreta que, no decorrer da sessão, tornou-se bastante audível e irritante. Mais de uma hora de projeção passada, eu não agüentei e fiz um “psiu” bem audível. Eu estava numa das últimas fileiras, os bufões quase na tela, saindo e entrando sem parar. Próximos deles, muita gente também incomodada, que só se animou a pedir silêncio depois que eu fiz por onde. Eles se aquietaram um pouco, depois voltaram, mas o filme pegou ritmo e som que abafava o dos pivetões, que, a aquela altura, conversavam animadamente, alguns de costas para a tela, formando uma rodinha.
O artigo do Zuenir falava sobre a grosseria de quem conversa no celular e se porta no cinema como se estivesse em casa. Mais absurdo que este comportamento de absoluto menosprezo por quem estiver ao redor é o de quem não se insurge contra isso, intimidado pela falta de educação de pirralhos. Nesse cinema, o grupo barulhento não tinha mais que 14 anos. Em duas ocasiões, no mesmo Rio Sul, mandei outro tagarelas se calarem. E eles ficaram quietinhos, pois, quando algum tentou falar mais grosso, muita gente, então, mandou-os parar. O que me chocou desta vez foi a passividade dos adultos. Os barulhentos não queriam apenas fazer bagunça. Era mais que isso. Eles estavam à vontade, sem dar a mínima para o resto do público.
Temo que boa parte da sociedade esteja se tornando conivente com a falta de respeito, de modos, de tudo. Semana passada, no mesmo Rio Sul, fui assistir “Closer”, e vi os seguranças do shopping obrigando um grupo de jovens mulatos e negros se levantarem das mesinhas de um quiosque. Se fossem branquinhos, como os barulhentos do cinema, nada ocorreria.
Qual é a solução? Ir aos cinemas de rua e torcer para que outros pais e mães queiram ter o trabalho de educar os filhos, ensinando um preceito básico para os seres humanos de bem: que a liberdade de cada um acaba quando começa a do vizinho. E que o Capitão Gancho, com seus piratas e o crocodilo, persigam impiedosamente quem não souber aprender a crescer.

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