28.7.09

Almoço em Agosto

Filme italiano, família e boa mesa caminham juntos. Almoço em Ferragosto não foge à regra, acrescentando ingredientes delicadamente saborosos ao cardápio, pincelado com toques bem dosados de pequenas tragédias da vida real.
Estão lá os problemas financeiros de um solteirão de meia-idade que ainda vive na casa da mãe, o descaso com os idosos e a solidão de homens maduros, que recorrem uns aos outros em busca de apoio, sem reclamar da trabalheira que têm ao cuidar de pais velhinhos. Ou, no caso, de mães velhinhas.
O roteirista Gianni di Gregori, que ganhou o prêmio de melhor estreia na direção no último Festival de Veneza, baseou a história em um episódio semelhante que lhe aconteceu durante os dez anos em que cuidou da mãe. A inversão de papéis se apresenta docemente, com todas as dificuldades inerentes ao controle de que alguém mais moço sente ao se tornar responsável por adultos que lutam para reafirmar, a cada momento, o quanto ainda são independentes. Entre o preparo de refeições e muitas taças de vinho, o que fica é o extremo carinho dos filhos amorosos aos quais o destino não proveu de realizações fora do círculo doméstico.

24.7.09

Rindo à Toa

Algumas cineastas francesas vêm mostrando a infância e a adolescência femininas com um olhar delicado, sem concessões ao politicamente incorreto que caracteriza as comédias americanas contemporâneas.
O primeiro exemplo veio no maravilhoso A Culpa é do Fidel, de Julie Gavras; o segundo, em Stella, uma doçura assinada por Sylvie Verheide. O terceiro, chega agora, em Rindo à Toa, de Liza Azuelos, que enfoca a hora em que acordamos e aqueles seres adoráveis com quem dividimos o teto tornaram-se irritantes e mal-humorados. Para onde foram aquelas pessoas?
As respostas, mães e filhas em todo o planeta estão à procura.
Essas indagações pulam da tela para uma platéia específica: a dos adultos que lutaram pela liberação sexual e independência e a de seus adolescentes, que, como os pais, são armadores pela própria natureza. Esses pais atordoados com a própria caretice são representados por Sophie Marceau (ela, que surgiu fazendo o papel de pré-adolescente descobrindo o mundo, em La Boum, na década de 70), espantada por não acreditar que sua filhinha tem os mesmos ímpetos que ela, na juventude.
O novo momento das relações de família, em que pais temem invadir a privacidade dos filhos, que não entendem por osmose quais são seus próprios limites, está no filme, que começa desigual, mas vai pegando ritmo à medida em que os dois grupos mostrados são identificados pela platéia. Uma comédia destinada a públicos determinados, mas que consegue abranger dois universos paralelos - o dos adultos e o dos jovens que estão saindo da asa da mãe -, mediados pela complacência dos velhos - que assistem a tudo de camarote, com a irresponsabilidade típica dos avós.
(Ah, sim, nossos filhos não bebem, não fumam, não fazem sexo. Têm o mesmo comportamento de vestais que o nosso, na idade deles. Iguais a nossos pais.)

23.7.09

Cantinho do Consumidor

Na outra encarnação eu fui daquelas funcionárias públicas que olhava o cidadão por cima dos óculos para presbiopia, com cigarro nos lábios e um ar de total desdém pela causa apresentada. Só isso justifica meus padecimentos com operadoras de serviços que não são prestados condignamente.
Na verdade, todos têm um pecado comum no qual incorri: atraso de pagamento. Atrasei, paguei fora do prazo, o telefone foi cortado para ligações por um dia, avisei que já havia pago e recebi o prazo de religação em 4 horas. Se nada acontecesse até então, que eu informasse à empresa.
Assim o fiz. E aí soube que:
1) o processo de religação já fora iniciado, mas por erro do sistema, interrompido;
2) quando o processo é interrompido por erro de sistema, o prazo é automaticamente estendido para mais quatro horas;
3) um supervisor fará a religação em dez minutos, se tal não ocorrer, o prazo é automaticamente estendido para mais 24 horas a partir da abertura do processo;
4) o sistema não consegue desbloquear contas do Oi Fixo se o assinante tem um Oi Conta Total;
5) o Oi Conta Total não tem como entrar nas contas do Oi Fixo;
6) a equipe técnica é que resolve esses problemas;
7) a equipe técnica não tem nada a ver com tais problemas do sistema acionado automaticamente por computador;
8) abre-se um pedido de reparo técnico de qualquer maneira;
9) se o seu aparelho é sem fio (não é), ligado em rede (não é), utiliza Velox (não utiliza), tem identificador de chamadas (não tem) pode impedir a religação da linha;
10) doze telefonemas e vinte horas mais tarde, o telefone volta a funcionar perfeitamente.

A verdade? Eu caí no buraco negro das reclamações de consumidores brasileiros, aqueles que precisam de uma imensa pachorra para alcançar um estágio de alma elevadíssimo e não se importar com o desconforto de depender da tecnologia de ponta.

Perguntas? Muitas. Entre elas QUAL É O TIPO DE TREINAMENTO QUE RECEBE ESTE PESSOAL DE ATENDIMENTO??? Para obter alguma resposta que faça sentido, a gente pena.
Eu tenho certeza que o inferno é administrado por algum ex-gerente da Telemar. Ou da Net.

20.7.09

No mundo da Lua


Não tínhamos televisão, meus pais eram uns intelectuais xiitas contrários à máquina de fazer doido em casa. Então, nos agrupamos em frente ao aparelho de nossa vizinha, a excêntrica dona Margarida, que gostava de fazer faxina no apartamento durante a madrugada.
Na hora em que Armstrong deu o pequeno passo para o homem, eu já havia capotado de sono, após intermináveis momentos de imagem escura mostrando algo que poderia ser a Lua. Maria, minha babá, acompanhava a transmissão falando que aquilo era truque em estúdio, que ninguém estava na Lua. Eu pensava no coitado do Collins, que não poderia descer em solo lunar.
E no dia seguinte, o mundo continuou igualzinho, 40 anos atrás.

18.7.09

Sempre free

Quando eu comecei este blog, ele era um back up de crônicas escritas e restritas ao Multiply. Lá havia retorno direto e muita conversa em torno do que refletia aqui. Mas ao sair do berço multiplaico, fiquei solta no universo e desprotegida, sem os amiguinhos da rede.
O blog foi perdendo características iniciais, tomando outras, mas continuou meio como a minha sala - uma confusão sem projeto de decoração.
Para organizar minha vida, criei outros, onde posto textos a respeito de temas definidos. Em casa sempre há núcleos de organização: livros, roupas, sapatos, brinquedos, louça - isso sempre consegui ordenar. O que não se limita a locais estanques são papéis. Ou pensamentos.
Neste blog jamais pretendi me expor livremente, como muitos fazem. Aqui, como diz bem o Jôka, somos personagens. Um pouco da gente sempre é vislumbrado. Abrir a alma, no entanto, é difícil. Não sou artista nem adolescente para gostar de tanta evidência.
Há surtos de inspiração e pupulam as mais diversas observaçoes frente ao mundo. Ultimamente, porém, a vida se fez mais intensa e exigiu minha presença.
Por isso mesmo, concluo, não sou artista. Tenho uma vida a levar. Meu público é restrito, porém, sabe que não pode contar com explosões criativas. Escrever, para mim, é fonte de prazer. Comunicar-me, uma necessidade.
Entã0, volto amanhã, hoje à noite, semana que vem, no outro mês. Sem obrigação, sem vínculos.
Free demais (esta é para quem viveu nos alegres e breguérrimos anos 80).



Descubro que envelheci mesmo ao perceber meu interesse por uma entrevista do ex-ministro João Lyra sobre a eleição de Tancredo Neves, Sarney assumindo o cargo, e a Constituinte. Um recordar é viver básico, sábado de manhã. E sentir saudades daquela época de inflação estratosférica e uma tremenda mania de ter fé na vida.

10.7.09

Hã?


Depois da pretensa conferida básica do Obama no derrière da carioca de Santa Cruz, sob o olhar divertido de Sarkozy, os olheiros das revistas masculinas já devem estar alvoroçados com a menina.
Há quem diga que o Obama olhava para os próprios pés, descendo o degrau, enquanto Sarkozy apreciava o cenário. Há um vídeo, mas não me convenceu, não. A foto é ótima!

Defesa do Consumidor

Há muito abandonei aqueles tapetes atoalhados de banheiro por tapetinhos feitos em tear. Alguns são mais grosseiros, outros mais elaborados, todos com cores exuberantes. Alegram banheiros e cozinha, além de guardar pouca poeira, serem fáceis de lavar etc e tal.
Vez por outra, renovo o estoque dos tapetinhos nos camelôs ou em lojinhas de artesanato bem simples (as mais sofisticadas devem cobrar 20 reais por peça).
Há algum tempo, descobri uma loja de móveis de Tiradentes que vende por 12 reais cada três tapetinhos, com tramas mais delicadas. Corri, então, à minha antiga fornecedora, uma senhora que tem uma daquelas pavorosas barraquinhas no metrô de Botafogo, para conferir o preço dos tapetes dela, que, por meus cálculos ingênuos, deveriam estar em torno de 5, 6 reais.
Mas os preços subiram acima do razoável. Hoje, ela pede por cada tapete 8 reais. Quando percebeu minha surpresa, perguntou agressivamente: "Está achando caro? Não é caro, não!". Falou de um jeito que eu dei a desculpa de estar sem o suficiente para comprar tais preciosidades.
A inflação ronda os camelôs. E vai alcançar os panos de chão.

5.7.09

Uma mulher foi assassinada esta madrugada, a metros de minha casa.
Soube hoje de manhã.
Professora universitária, especialista em computação.
Manobrava o carro, foi abordada por três assaltantes e morta a tiros. Policiais mataram um dos bandidos e feriram os outros.
Leitores do Globo On Line pedem a esterilização de pobres e o extermínio dos bandidos. Como se isso fosse resolver essa violência que tentamos não enxergar, a cada dia, a cada esquina, a cada silêncio da noite.
A mulher morreu quando eu adormecia. Sua morte choca porque é na Zona Sul e aconteceu com uma "de nós".
Enquanto isso quantas mulheres morreram esta madrugada, na Baixada?
Mortes lamentáveis, evitáveis.
E que continuam se sucedendo, sem qualquer ação consequente das autoridades. O momento não é de discussão, mas de ação.
Medidas discutíveis, porém eficientes, têm sido adotadas fora daqui. Restrição à venda de álcool após determinados horários é uma delas. Disciplinar uma sociedade que se desacostumou a regras é difícil e vai além do recolhimento de carros cujos proprietários não pagaram impostos extorsivos como o IPVA.

Coragem

Ao contrário da maioria da humanidade, não admiro modelos-manequins-toplindas.
Tenho aquela visão antiquada de que exploração da beleza é uma forma de dominação machista. Naturalmente, reconheço a beleza e a fotogenia dessas pessoas.
Por isso mesmo sinto-me mais que confortável ao elogiar Luíza Brunet, que, aos 47 anos, aparece assim na Época On Line. Cara limpa, pele calejada. Envelhecer é difícil e La Brunet reclama do excesso de photoshop na vida atual.
Corajosamente bela - apesar do preenchimento labial.

1.7.09

Sessão da Tarde

As mulheres ainda são ínfima minoria na direção cinematográfica. Pouco a pouco, elas avançam numa área de expertise natural, a comédia romântica. A evolução do gênero - de cinema, não de sexo - porém torna tais filmes cada vez menos cômicos e infinitamente mais românticos. Seria a direta influência das mulheres diretoras?
A última comédia romântica que me fez rir muito foi Alguém Tem Que Ceder, de Nancy Meyers (que depois cometeu o bobinho O Amor Não Tira Férias), que seguia a cartilha histriônica dos duelos entre Cary Grant e diversas leading ladies nas décadas de 40/50/60, ou as perseguições entre Doris Day e Rock Hudson. Mas era exceção. A Proposta, de Sandra Bullock, deveria, de acordo com a divulgação do filme, renovar o gênero. A atriz não queria mais atuar em comédias, mas gostou do roteiro, aderindo entusiasticamente à sua primeira cena de nudez na carreira (muita gente na platéia gostaria de participar também, tal eram os profundos suspiros ouvidos na sessão para a imprensa carioca - lotada- durante o striptease de Ryan Reynolds).
Seguindo a trama tradicional de Megera Domada por um Petrucchio moderno - e mais jovem -, o filme não difere em nada dos últimos exemplares da espécie, incluindo um final La Bullock é uma editora-agente literária-gerente de comunicação prá lá de eficiente, que atemoriza seus subordinados, entre eles o assistente bonitinho, praticamente seu escravo. Como ela está prestes a ser deportada para seu Canadá natal (a propósito, país de origem do galã, na vida real), decide se casar com o assistente. Para não darem vexame na entrevista com o serviço de imigração, vão passar o fim de semana na casa da família do rapaz, no Alasca, onde as diferenças se acentuarão e as afinidades aflorarão, fazendo surgir o amor.
Lindinho, não? Igualzinho a tudo o que se viu antes, não? Anne Fletcher fez melhor em Vestida para Casar - ou seria o efeito de eu ter assistido na TV, o veículo ideal para A Proposta. De preferência, numa tarde chuvosa, acompanhado por sanduíches de queijo e presunto e refresco de maracujá preparados por mãe da gente. Delícias de Sessão da Tarde.