31.7.12

Clarividência


Seu Jorge, o pintor que me deixará ao fim desta semana, e seu Reinaldo, o instalador de ventiladores de teto, têm catarata.Semana passada, descobri que eu também tenho - ainda quase desprezível, a ser mantida em crescimento até a inevitável cirurgia, daqui a décadas.
Tirésias, na mitologia grega, era cego e profeta. Homero, o poeta, também não enxergava, assim como Borges, o escritor.
Ultimamente, vi muito Globo de Ouro que tinha Kátia, a cantora cega, como destaque.

Acendo uma vela para Santa Luzia e estamos conversados.


30.7.12

Digressões, diretamente do canteirão

Gosto de decoração. Um gosto que só surgiu depois que tive minha própria casa, já que meu quarto sempre foi co-propriedade de minha mãe, que chegou ao cúmulo de colar um poster do Chico Buarque no meu armário. Daí, talvez, venha minha percepção de Chico como um senhor que desperta fantasias eróticas em senhoras. Por mais que hoje eu seja uma senhora, para mim, Chico regula com o Niemeyer. Houve um tempo em que me apropriei de meu quarto, colando posters de artistas de cinema e astros do rock em todas as paredes possíveis. Depois, fiquei sóbria e limitei os recortes a um quadro de cortiça, elemento indispensável aos cafofos adolescentes de então.
Dos sites e blogs sobre decoração adoro os que mostram a casa das pessoas comuns, sem grandes artifícios ou projetos com assinatura de Phillip Starck. Meu amigo Ronny, arquiteto que atua no setor de interiores e faz projetos pra gente acima do meu parco cacife, me contou que está reformando um quarto ao módico preço de 300 mil reais. Caindo na real, gosto de blogs como o Dcoração, que mostra essas casas de quem vive contando os caraminguás. É tão legal que a autora hoje tem coluna em jornal popular.
No fim de semana, fui atrás de camas para meus pimpolhos, já que as deles se acabaram. E aí, encontrei caixotes "paletes", aqueles caixotes de transporte de frutas pra feira, que agora entraram na moda e custam... em torno de 400 reais!!!
Enquanto o Rio vive a fase de hipervalorização imobiliária, descobri um blog sobre apartamentos na Argentina. Não, não pretendo me mudar para Buenos Aires. O que me estarreceu foi perceber o empobrecimento demonstrado na decoração de cada casinha, sempre com móveis velhíssimos, adaptados ao momento. O blog é um encanto, as casas também. A ambientação tem muitos enfeites infantis, típicos da geração que hoje está com uns 35 anos, que "ousa" na imaturidade. Vintage é a palavra de ordem, marcando o constraste da sobriedade de móveis herdados da família com peças de origami. E há deliciosos jardins de inverno, cheios de plantas...
Claro que a gente sempre gosta de conhecer maisonettes de Paris, lounges de Nova York e casas apertadinhas em Londres, mostradas no maravilhoso The Selby, que vive no Brooklyn e percorre o mundo fotografando a casa de pessoas muitos interessantes. O desconjuntado que surge na Casa Chaucha também me fascina. Porque a casa da gente precisa de combinações nem sempre deliciosas. Precisa ser meio embolada, antiquada, contemporânea. Tudo junto e misturado.
E começa a quarta semana de trabalhos.
Na próxima, deve vir mais outro pintor. O seu Célio, o primeiro, que desapareceu, ligou no fim de semana pra dizer que a avó morreu, razão de seu sumiço. O atual, seu Jorge, é um doce, mas muito lento. Seu Flávio chega na próxima pra pegar a sala. E meu quarto deve iniciar a reconfiguração esta semana também. Ai, ai... tô mais desconjuntada que milongueiro porteño.

A casa ainda está mais ou menos assim. O amarelo das paredes deve ser substituído por um tom mais suave ao fim dos trabalhos. E Gal poderá passear tranquilamente entre as plantas, como gosta.

26.7.12

O desvario começou

Vou pintar a sala.
O problema não é o custo. O problema é transportar quase três mil livrinhos bem acondicionados em muitas estantes para outros cantos da casa. Porque livro tem esponjas dentro. Eles absorvem poeiras, traças, ácaros.
Uma veneziana clama por substituição. Está presa por pensamento positivo.
Começo a temer a falência pós-reforma.
Maldito Jac.


25.7.12

Canteiro de obras reaberto - Dia 24

É, deveria ser o 24º dia. Mas houve um longuíssimo intervalo de mais de uma semana. Perdi as contas, mas já vai pra um mês que a balbúrdia reina em meu desalinhado lar. Seu Jorge, o pintor, apareceu e começou a mexer no quarto dos meninos. Vai levar uns quatro dias, já avisou. Depois será a vez do meu quarto, o coração da casa. E, inoculada por Jaques/Jack, doravante aqui denominado por Jaque, é bem provável que eu mande pintar a sala também.
Ontem, fiz muitas contas. O custo é alto, mas ainda pagável, graças à devolução do Leão e à antecipação do 13º. Depois, a penúria me espera, mas de casa renovada.
Claro que também ressurgiu o Tiago, o eletricista. E vamos ter que dar uma remexida nos fios. Tem uma verdadeira teia de fios retorcidos, ressecados, parecendo arvoredo de caatinga, sob tetos e paredes. Jaque determinou uma revisada nisso.
Os olhos já estão doloridos, lacrimejantes e secos, por mais paradoxal que isso pareça. Nariz entupido e cabeça doendo. A poeira já impera, mas os ácaros de livros remexidos também se faz presente.
Ah, claro. A máquina de lavar quebrou.

23.7.12

Ainda no intervalo, com Jack ou Jacques

Talvez na quarta seu Jorge venha pintar algum cômodo desta residência. Enquanto isso, inquieta, peguei eu rolinhos e tinta e decidi pintar de branco uma estante que já passou por alguns proprietários. Chegou aqui verdinha, aposentada após anos carregando livros e brinquedos do filho de meus compadres. Antes, pertencia a um tio de meu amigo. Esse tio (que não sei se ainda é vivo) é daquelas pessoas referência na família dele. Na minha havia as "Mimitas". As Mimitas eram as filhas de Dona Mimita, amiga de minha avó. Não existia uma só conversa na família em que as Mimitas não fossem mencionadas. Porque todo mundo era conhecido, amigo, parente ou havia cruzado com as Mimitas uma vez na vida. Um dia, fui falar com um advogado indicado por uma tia. E não é que o cara era neto de Dona Mimita, um legítimo Mimito.
Enfim, a estante do Tio Mimito (não me lembro do nome dele, mas ele deve ter conhecido, namorado ou convivido com as Mimitas algum dia, porque isso acontece com toda a humanidade) acabou no quarto de Júlia. De verdinha, virou laranja, há cerca de dez anos, quando pintei uma parede da sala de telha. Agora,  transferida para a sala,  precisa de outra cor, mais adequada ao cenário. Me empolguei e comecei a pintar. Muito mal mesmo. Passa por pátina mal feita.
E enquanto a pintura não recomeça, eu contraí o Jacques, um estranho vírus que ronda quem faz reforma em casa, conforme minha amiga Rosana Lourenço havia me advertido. Os sintomas se manifestam quando o reformador olha algo que nada tinha a ver com o plano inicial e pensa"já que estou pintando tudo, que tal trocar o estofado do sofá?". Foi o que me aconteceu. Primeiro, decidi trocar uma janela - que há 20 anos merecia descansar no lixo, coitada. Agora, em vez de comprar outro sofá, resolvi reformar a cacarecada aos poucos - duas cadeiras de balanço que eram de minha mãe, umas cadeirinhas austríacas, outro sofá.
Mas Jacques/Jack não me containará mais. Senão, acaba virando o Estripador de minhas parcas reservas financeiras...


21.7.12

Intervalo

Eu havia me esquecido que toda a reforma em casa tem um período de interrupção. Até que estamos nos virando bem durante o intervalo, recuperando as forças perdidas para a alergia à poeirada. Hoje, vi meu novo sofá - que estava embalado ainda. Não vale a pena deixar fechado, já que o forrobodó só deve recomeçar - se isso acontecer mesmo - na quarta-feira da próxima semana.
Mais um pintor consultado e... só terá tempo de me atender em duas semanas. Eu vou mandar esses meus filhos esquecerem os sonhos profissionais e começarem agora a se especializar em reformas. O povo está super-ocupado...
Para me distrair, trabalho durante as férias. E posto fotos do Jeff Bridges. Por quê? Ah, porque a Marina W postou uma foto dele novinho - e a gente só se lembra dele agora, na fase Kris Kristofferson. Mas Jeff Bridges já foi um gato, antes de ser o "Dude" do Big Lebowski. Continua uma figura simpática, embora pareça ser quase da mesma idade que o irmão, Beau, uns oito anos mais velho.











19.7.12

O abandono

Não é que eu sofra de síndrome de rejeição. O pintor sumiu. Mesmo. Já veio outro fazer orçamento. O quarto orçamento. Deve começar na outra semana. Lá se foram minhas férias.
Não sei se choro ou rio, enquanto aguardo o moço da janela (sim, tem uma janela a ser retirada) vir buscar a entrada do serviço. Os homens não aparecem nem para receber dinheiro. Está na hora de abrir uma empresa de reformas, porque serviço não falta para esse povo. Só pode ser isso.


18.7.12

Sem canteiro, só caos - dia 17

Aquele momento em que a relação está complicada já começou. Talvez porque eu quis adiantar as coisas e chamei os artistas-pintores para arrumarem o quarto da Júlia, enquanto seu Célio voltava para uma obra já contratada, que duraria 10 dias, mas que poderia acabar antes desse prazo. Embora ele tenha me garantido que estaria hoje, aqui, às 8h. Não está. São 9h27m e ele não está!!!! Já telefonei. Mas o telefone está fora de área.
Liguei para dois Jorges. Um, novo, pintor também. Deve ser meu próximo. O outro, meu antigo empreiteiro, que só pode "quebrar seu galho, D. Olga, na virada do mês". Seu pessoal está totalmente ocupado até a "virada do mês". O que me leva a crer que realmente o futuro da economia está na reforma e construção de imóveis. Vai chamar um bombeiro hidráulico para ver o quanto terá que tirar das aplicações financeiras e ter o sifão de uma pia trocado...
Então deve ser assim mesmo. Uma relação breve e desgastante com diversos homens, cada semana um novo, estendendo-se indefinidamente por um bom período de meses. Foi assim em outras reformas, por que não seria agora? 
Melhor tirar férias decentes e deixar a obra acontecer quando for possível.
Entrei no estágio do conformismo. Zen stress. Tomara que dure. 

14.7.12

Diário do mezzo caos - dias 11, 12 ...

Perdi a conta. Acho que a obra começou na outra terça-feira. Hoje é o segundo sábado. Então estamos no 13º dia... Ou foi na terça....
Enfim, já tem é tempo.
Meu armário parece cenário de um programa deprimente de um canal a cabo, Os Acumuladores. Aqueles obsessivos-compulsivos que vão guardando um monte de tranqueira. Cada parte da casa em que a obra é concluída precisa receber o que fica guardado nos outros cômodos, que entrarão na faca, digo, na reforma. E, no afã de dar algum sentido lógico à bagunça, o jeito é enfiar tudo nos armários. Lógico que não cabe.
Acho que agora eu odeio obras.
Os artistas que cobram 1000 reais para pintar um quarto - e fizeram pela metade um daqui de casa - encerraram sua participação. Ficou razoável. As dependências de empregada estão fraquinhas. Júlia vai encarar os pinceis para pintar uma de suas paredes de salmão. Ainda faltam banheiros, corredor e dois quartos. Não me animei a encar a pintar a sala.
Estou de férias assalariadas após sete anos na informalidade/autonomia. E vou passar aqui, comandando a obra? Acho que vou interromper o furdunço esta semana e só retomar em agosto, quando voltar à labuta. Obra em etapas. Uma ideia...
Já temos interfone funcionando. E luz no quarto do Hugo, onde o Poltergeist sempre se manifesta, estourou, desta vez, toda a fiação do ventilador de teto.  O quarto permaneceu às escuras algum tempo, na tentativa de acalmarmos o espírito inquieto que vive por lá. Besteirol à parte, este edifício tem 72 anos e a fiação do apartamento era de pano, quando chegamos aqui, duas décadas atrás. Sempre que se tocava a campainha da porta acendia-se a luz da primeira sala (são duas, uma é um vestíbulo robusto, onde estão piano e muitos livros; tentei batizar de Sala de Música, mas o pernosticismo nunca pegou - virou sala do piano, ou, mais popularmente, "lá no piano"). E sempre acendia vagarosamente, evoluindo da penumbra para o brilho. A razão? A mesma fiação abastecia os dois pontos de energia elétrica. Outro fenômeno era que, ao bater a porta do quarto dos meninos (e aqui tem muita corrente de ar, é um bate-porta infernal), acendia-se a luz do corredor. Isso porque cada tremelique das portas reverberava na fiação.
Aos poucos fomos isolando os fios, mas, vez por outra, o espírito inquieto tenta nos assombrar. Acho que é meio Vadinho, da Dona Flor, meio Zé Pelintra, mas mais jovem, mais serelepe. Na Casa do Califa, livro que relata a reforma de um casarão em Casablanca por uma família inglesa de raízes asiáticas, a obra só vai pra frente depois que exorcizam o prédio todo... Será?
Os terceiros pintores contratados estão atrasados. Acho que terei alforria neste sábado...






12.7.12

Do canteiro - dia 9

Os olhos estão secos. Estou saindo para o trabalho, penúltimo dia antes das férias. Hoje vem um eletricista, colega de trabalho, recomendadíssimo. Vai religar o interfone, puxar energia em diversos cantos da casa, instalar novos pontos para tomadas.
Os pintores já chegaram e eu nem quero olhá-los nos olhos. Até amanhã preciso decidir se chamo o primeiro, que, olhando agora o serviço encerrado dele, na cozinha e parte de serviço, faltou capricho no arremate.
Preciso encontrar um carregador de celular no caos de tralhas que se espalham por todos os cantos da casa. A vontade é me livrar de metade das quinquilharias que acumulei na vida. Eu me lembro que, quando saí da casa dos meus pais para meu primeiro apartamento, já havia dois cômodos de quinquilharias, em que não entrava. Sempre tive uma "caixa de recordações", dezenas de cadernos de diários, guardo uma montoeira de agendas usadas em outros anos... Ainda bem que as novas gerações daqui de casa não têm esse amor por lembranças.
A labuta me aguarda!!!

11.7.12

Direto do front, digo, do canteiro - Dia 9

A desolação toma conta de meu ser. Passo em casa para almoçar, feliz porque havia chegado meu novo sofá da sala, pequenino, modesto, Tok & Stok mesmo, e, ao abrir a porta me deparei com a poeira. Muita poeira. Poeira demasiada para uma obra no quarto láááá atrás. Poeira sobre os livros da sala, sobre os móveis, sobre os gatos, sobre tudo.
Abri o caminho entre a nuvem que chegava à sala, seguindo o som de serra elétrica que não esperava ouvir em casa. Avançando pelo corredor, descobri, na soleira do quarto em obras, seu Augusto lixava, com uma lixadeira elétrica, a porta. Sem se importar em  isolar o corredor com um dos 10 mil metros de plástico preto que me pedira para comprar e que ele não está usando.
Agradeci ao Altíssimo a tranquilidade zen de meu filho, que recebeu o sofá novo e nem pensou em retirar a embalagem plástica de proteção. Pensei em sentar-me à beira da cama e chorar, mas resolvi perguntar a seu Augusto e a seu Mário, os pintores pirados, se haveria mais produção de poeira no ambiente. Os dois, muito vexados, reconheceram que falharam ao não isolar o local do crime do resto da casa, argumentando, no entanto, que bastava um buraquinho no plástico para a poeira invadir qualquer espaço livre.
Não respondi, suplicando apenas que ignorem as imperfeições na madeira. Que não pintem a madeira. Que deixem a vida continuar.Porque há dois mil livros na sala, todos cobertos de poeira branca. E quem vai limpar sou eu.





O bispo

Durante meus dez anos de repórter de Geral/Cidade do Globo, fui, praticamente, setorista de D. Eugenio Salles, o arcebispo do Rio. Como era sobrinha de padre e ex-aluna de colégio de freiras, conhecia termos que embatucavam alguns coleguinhas, entre eles "homilia". Praticamente uma especialista em assuntos eclesiásticos.
Dom Eugenio era magrinho, de sotaque nordestino carregado e nenhum laivo de simpatia. Profissionalíssimo, pontual e sempre pronto a falar com os jornalistas depois das celebrações religiosas. Nada de sorrisos fáceis. A gente se sentia menos carioca ao lado dele.
Com Dom Eugenio fui, pela primeira vez, a uma cadeia. Mais precisamente o Hospital Penitenciário, em Bangu, então um campo de extermínio de homens com tuberculose e Aids. Uma realidade incômoda, deprimente, que jamais esqueci. Ali, Dom Eugenio se mostrava em seu elemento, recolhendo cartinhas dos presos doentes, conversando com quem mal podia falar, abrindo para a imprensa locais que as autoridades preferiam esquecer que existiam.
E foi assim que levou a vida, denunciando sem grande alarde, acolhendo refugiados políticos, aproveitando o bom relacionamento com os donos dos jornais para denunciar a tortura nas cadeias da cidade, algo que a sociedade preferia não ver. E ainda prefere não ver.

A pombinha que se alojou sobre o caixão do cardeal não simboliza apenas o Espírito Santo, mas a paz que esta cidade merece e que o pouco cordial Dom Eugenio defendeu, com seu jeito sisudo, de tempos antigos de homens severos. Minha impressão era a de que a cidade gostaria de ter um bispo mais afável, mais extrovertido, mais "carioca". Mas coube ao Rio um bispo de feições duras, incômodas. E, inegavelmente, marcante.

10.7.12

No Canteiro - Dia 8

Tenho poeira até  na alma.
Os homens lixaram as paredes, emassaram, estucaram. E um pó branquinho circula pela casa. Meus olhos estão secos, a respiração curtíssima.
Já não gosto mais de obras...
A faxineira reapareceu com seu marido, que também é faxineiro e diz que conhece alguém que pinta paredes e faz instalações elétricas muito bem no prédio onde trabalha, sem cobrar 1000 reais por cômodo.
Nem vi os pintores hoje. Acordei Hugo, que fora dormir às 4 da manhã, comemorando com os amigos os 20 anos completados ontem (ai, meu Deus, o tempo tem a velocidade da luz...), pedi que esperasse os pintores e fui trabalhar, sem retornar para casa o dia todo. Dez horas depois, encaminho-me para a crise alérgica noturna.

9.7.12

Do Canteiro - dia 7

Da série 'Quem mandou morar na Zona Sul?": os pintores que já havia contratado para a obra de um dos quartos - que precisa tirar papel de parede, refazer um reboco, emassar, aplainar, pintar -, deram orçamento para os outros quartos. O quarto já em execução, o mais trabalhoso, custou R$ 600 de mão de obra. Os demais, que são um pouco maiores, porém não exigirão tanto trabalho de alvenaria ... R$ 1000 cada!!!
Agradeci, penhoradamente. E procuro, desesperadamente, o pintor anterior, que cobrou exatamente a metade por cada quarto.
Será que eu tenho cara de abastada?

8.7.12

Do canteiro - Dias 5 e 6

Não teve obra nos últimos dias, chegou o fim de semana, o que não significou descanso, ao contrário, já que no sábado foi o dia do maior evento promovido lá. De onde só saí depois das 23h, carregando uma tina com 5 quilos de salada de batata e mais uns três quilos de salsicha. Todo mundo ganhou salsicha ou salsichão. Sobrou muito, ia pro lixo e... bem, vou distribuir aqui entre os pintores que chegarem amanhã, porque não há colesterol que se mantenha incólume com tal dieta.

Comprei um sofá novo. Chega na quarta. Simplesérrimo.

Devido à penúria dos últimos tempos, curei-me do consumismo compulsivo compensatório das frustrações. Consegui entrar na Uncle K em liquidação e APENAS observar as bolsas (maravilhosas, claro). Não comprei nenhuma e tinha dinheiro para gastar. Isso me dá uma satisfação imensa. Desprezo os apelos desesperados do capitalismo selvagem. Um dia, quem sabe, conseguirei resistir da mesma maneira à comida em geral...

Por estar tão alienada do universo consumista, espantam-me os preços de certos artigos. Uma almofada a 180 reais numa liquidação.  É o que gasto num supermercado em dez dias, mais ou menos. Há anos comparo os preços com o dos itens básicos de sobrevivência. Uma almofada não pode valer a minha conta de eletricidade mensal.

6.7.12

Mantra


De hoje em diante vou modificar o meu modo de vida.


Quem sabe se, repetindo à exaustão, eu consiga me convencer, me converter e cuidar mais de mim...


Do canteiro - Dia 4

Acho que odeio o pintor. Não arrasta um móvel para o lugar e acha que poeira em chão sai por obra e graça do divino Espírito Santo. Há pegadas brancas por toda a sala.
Com o cheiro de massa corrida se alastrando por tudo quanto é canto, arrisquei-me a comprar um salgado na padaria que chamamos delicadamente de "ruim". Tem outra no quarteirão que identificamos como "a boa". A ruim não faz só um dos piores pães do Rio de Janeiro - e olha que esta cidade se notabiliza pela péssima qualidade das panificadoras, com honrosas e maravilhosas exceções para confirmar a regra. A Ruim faz também os piores salgadinhos do mundo. Há pouco tempo, mudaram os donos, gerentes, empregados. Só mantiveram a tradição que poderia lhes conferir o título de "a pior do bairro".
Hoje ainda tenho que comprar tintas para que a nova equipe de pintores comece na segunda-feira.
O atual, não sei se retornará, já que tem outros compromissos na próxima semana e eu não quero me apegar a mais ninguém...
Estou mal-humorada. Pensava que ficaria feliz com a obra. Não estou. Não hoje.


Do canteiro - dia 4



De olhos vermelhos, nariz entupido, fungando, lacrimejando, garganta coçando. O pintor garante que a poeira da raspagem do teto não estraga o assoalho de madeira. Mas atiça minha alergia - e como atiça! Estou pedindo um reforço de antialérgico a todas as farmácias do bairro. E ainda falta um bocado de parede, teto, rodapé, alizar e porta a ser lixado, emassado, pintado. Vou preparar uma bomba de oxigênio...
O pintor é razoável. Pratica preços de Ipanema e Leblon. Não sabe baixar a bandeira 2 ao chegar em Botafogo. Avisa que ficará dez dias, "mais ou menos", fora, em outro serviço já contratado. Não sabe ainda que, nesse período, entra outra equipe aqui, também com preços Ipanema/Leblon, para fazer o quarto, já orçado, de Júlia. Vou chorar um bocado e ver se eles abaixam o orçamento para os outros quartos.
No primeiro dia de obra, o pintor só chegou, olhou a gente tirando os móveis do quarto e foi-se embora. Tomava posse do pedaço. No segundo, ficou até quase 9 da noite. No terceiro, saiu às 2 da tarde. Hoje, diz que acabará  o que iniciou. Acho difícil. Vai adentrar noite até o sábado (em que eu trabalho).
Acho que não gosto mais de obras. E ainda tenho que consertar o interfone...
Os olhos estão ressecados e parece que tem poeira no fundo da minha garganta. Haja bombinha pra asma. 


5.7.12

Direto do canteiro de obras - Dias 1,2,3

Adoro obras. Dá uma sensação de recomeço maravilhosa. Acho que gosto mais da expectativa do que a reforma traz do que do próprio resultado. Igual a planejamento de festa, tantas vezes melhor que a celebração. 
E esta semana começou a pintura lá em casa pela área de serviço/cozinha/quartinho/banheirinho (não tenho mais empregada doméstica, não há como bancar salário + INSS + transporte + o que mais vier; convivo amigavelmente com uma diarista que mal faxina, mal passa, mal cozinha, mas é um amor de pessoa).
Gatos indignados com a troca de local de seus banheiros e comdouros, mesmo tendo sido transferidos das chamadas dependências  para a área social da casa, em uma das varandas e no lavabo. 
Para marcar o início dos novos tempos, o pintor cortou (não retirou, não deslocou, cortou mesmo) o fio do interfone. Não há mais comunicação com a rua. Pressinto que viverei dias confusos, enquanto gasto uma modesta fortuna. 
Quando criança, jamais imaginei que pintar a casa fosse uma obra, substantivo específico para quebradeira, derrubada de paredes, colocação de cerâmica, como os arquitetos se referem a azulejos. Hoje, obra é qualquer renovação que envolva a contratação de um profissional por vários dias e que levante poeira. 
Naturalmente, já estou com a asma em atividade constante. Naturalmente, minhas vias respiratórias já se obstruíram. Sim, estamos em reforma.