30.12.10

Segundo tempo

Botafogo estaria em silêncio quase total não fosse a papelaria vizinha ao meu prédio, que aproveita o dia morto pra consertos em geral. Além do batuque de martelos, há uma serra ou furadeira elétrica acionada com toda a exuberância que não convém a uma tarde cinzenta, abafada e que merecia ficar dolente, quieta em seu cantinho.
Atendendo a reclamos de duas amigas amadas, que lamentaram o abandono deste blog, penso neste 2010, um ano que passei na tentativa de reestruturar diversas áreas da vida. Nunca tive "um ano bom", de conquistas excepcionais. Estou perto de um ideal budista, aquela vidinha na pasmaceira, sem grandes júbilos, mas com as tristezas de praxe. Não posso dizer, jamais, que "aquela foi a pior fase de minha vida". Tive tempos ruins e outros bons, ocorrendo quase simultaneamente. Vivi dias maravilhosos, outros pavorosos. Foi sempre assim, ao longo desses 50 anos.
A exibição constante da vida que levamos, uma exigência da atualidade, aqueles sorrisos extasiados em qualquer reunião de amigos que estampamos no Facebook, nem sempre me parece reflexo do real, mas sim do que desejamos apresentar como a tal da felicidade. Houve um momento delicioso este ano, pra mim, quando festejei meu aniversário e me vi cercada de gente que fez parte de minha história. Outro instante bonito foi comemorar a entrada na vida acadêmica de meu filho mais velho e o encerramento da vida escolar do mais novo dos meninos. Além de observar o crescimento pessoal do segundo e as transformações de minha menina em bela jovem.
Trabalhei bastante, retornei aos estudos - o que foi interessantíssimo e me levou a ganhar novos amigos - a mais importante aquisição de 2010. Li um bocado, vi bons filmes, encontrei - pouco - os amigos queridos em almoços, jantares, bares e demais lugares. Flanei pela cidade, torci muito por esta terra - e não só no futebol. Sofri duas perdas nos dois lados da família, enquando acompanho o esfacelamento desses grupos e a formação de novos ajuntamentos de pessoas, não-aparentadas e tão próximas como se compartilhassem do mesmo sangue, dos mesmos segredos sussurrados, das piadas e casos que são contados de geração para geração.
Ganhei novas rugas, mais peso (!!!!) e novas melenas brancas. Não há jeito para nada disso, apenas formas de camuflar o aspecto que meus olhos se recusam a aceitar. A cabeça, em compensação, se expande, pronta a absorver mais e mais do planeta, dos homens, do que surge de novidade, e a guardar o que é tão precioso que não podemos esquecer. Desde criança sempre achei que a melhor fase da vida é a que estou atravessando. Continuo assim. 2011, 2012 - se der, né? - e o que vier depois trazem o brilho do olhar que precisamos para persistirmos neste mundo. Cinquentenária que sou, sei que meu segundo tempo começou.


......

Ah, sim, boas festas!!!!!!!

22.12.10

Resenha/entrevista sobre o interessantíssimo "Arte & Dinheiro", que saiu esta semana no Valor.

Valores :

A relevância do dinheiro no mercado de arte

Olga de Mello | Para o Valor, do Rio
21/12/2010

"Arte & Dinheiro"Katy Siegel e Paul Mattick. Tradução de Ivan Kuck. Zahar. 223 págs., R$ 89,00

Através dos séculos, dinheiro e arte estabeleceram um relacionamento delicado. Enquanto a arte pode gerar conforto, fortuna e prestígio para criadores e patrocinadores, o dinheiro, geralmente, é um componente que interessa à produção artística. Definir os limites dessa relação e quando o dinheiro passa a ser tema - ou se transforma em objetivo - da arte são algumas das reflexões suscitadas por "Arte & Dinheiro".

"Cada vez mais o julgamento do valor da arte contemporânea se assemelha ao comportamento do mercado financeiro. Os rumores definem valores. Alguns trabalhos acabam sendo avaliados a partir do preço, o que não é, originalmente, o propósito da arte", observa o economista Gustavo Franco, que assina o prefácio.

A relevância do dinheiro para a arte contemporânea pode ser resumida através da epígrafe escolhida pelos autores, uma citação do crítico de arte e historiador Paul Ardenne: "A principal preocupação de nossa época - a economia - é, para a arte de hoje, o que o nu, a paisagem ou o mito do novo foram, em seu tempo, para o neoclassicismo, o impressionismo e a vanguarda: tanto um estímulo à criatividade, quanto um tema ao gosto do momento". Segundo a crítica de arte Katy Siegel e o professor de filosofia e jornalista especializado em economia Paul Mattick, a volta à moda "ideológica da ideia de um mercado global autodeterminado e sem compaixão pelos fracassados", que teve especial relevância nas últimas duas décadas, garantiu à riqueza, ao consumo e ao prazer o status de valores publicamente aceitáveis. Entre os questionamentos invocados por "Arte & Dinheiro" está o caráter efêmero da produção de riquezas.

O uso de cédulas em trabalhos artísticos - como "Zero Cruzeiro", de Cildo Meireles - e aspectos menos concretos do valor do dinheiro surgem no livro, montado como uma exposição, com "salas temáticas" (capítulos) e um debate entre especialistas em arte no epílogo. A visão bem-humorada sobre a relação dos artistas com o dinheiro começa na capa, que traz o "Zero Cruzeiro" e a fotografia de cinco artistas dançando nas areias de uma praia das Antilhas, durante a chamada 6ª Bienal Caribenha. Promovido em 1999, o evento denunciou o vazio de reuniões semelhantes, que deveriam fomentar encontro de ideias e novas produções.

"A reunião no Caribe obteve patrocínio de diversas empresas, convencidas de que artistas de renome criariam obras destinadas àquele espaço, mas eles fizeram abertamente o que acaba acontecendo em eventos semelhantes. Passaram o tempo todo se divertindo e descansando", esclarece Franco, que sugeriu a inclusão de "Zero Cruzeiro" na capa da versão local, já que Cildo Meireles é o único brasileiro com dois trabalhos destacados no livro. A série de cópias de cédulas de cruzeiro é da década de 1970. Com efígies substituídas por figuras de índios e a assinatura do artista no lugar da chancela do presidente do Banco Central, as cédulas falsas tiveram uma grande tiragem, a fim de denunciar a alta inflação do período e também para diluir o valor da obra, "à semelhança do que o governo brasileiro estava fazendo com a moeda nacional", observam os autores. A instalação "Missão/Missões" (como construir catedrais) foi criada com 600 moedas, 800 hóstias e 200 ossos de boi, para remeter à violência da evangelização católica na América Latina.

As "salas" mostram grande variedade de atitudes e práticas artísticas, sempre refletindo sobre dinheiro, consumo, política e poder. Na sala "Negócios" estão agrupadas fotografias de comemorações de executivos pela fusão de empresas e outras mostrando pessoas nas filas de seguro-desemprego. A sala "Alternativas" tem trabalhos do cubano Felix Gonzales-Torres (1957-1996), que criava instalações com papéis de bala e incentivava os apreciadores de suas serigrafias a levarem um pedaço da obra para casa - sem nada cobrar por isso. Interagir com o público era a intenção do americano Rob Pruitt, que enfileirou uma carreira de cocaína sobre um espelho de cinco metros de comprimento no chão de uma galeria nova-iorquina, em 1998. Em questão de minutos os convidados consumiram a droga. Já o artista alemão Boris Becker trata de objetos ordinários que podem esconder a riqueza, ao fotografar quadros, sapatos e folhas de mata-borrão utilizados por traficantes de drogas colombianos para contrabandear cocaína.

Para Franco, a exposição proposta no livro ajuda o leitor a conhecer a arte contemporânea. "Há sempre um enredo para dar sentido às obras atuais. Esse sentido vai além do estético ou sensorial, não segue a lógica dos trabalhos dos velhos mestres românticos, clássicos ou renascentistas. Raramente se consegue compreender a arte contemporânea sem uma leitura, uma referência. Hoje, a discussão de conceitos se impõe, com temas que passam pelo fenômeno do valor atribuído a assinaturas em papéis, por exemplo. Muitos artistas estão discutindo um pouco do fenômeno da assinatura de um papel, que vale muitas vezes mais do que um trabalho artístico", observa o economista.

6.12.10

Do Rio para o Nordeste

Tô toda prosa, porque escrevi uma pensata pro Diário do Nordeste sobre nossa guerrinha urbana, que foi publicada no sábado. Um depoimento do ponto de vista da moradora desta cidade sofrida. Saiu com fotinha e ainda surjo como "especialista". Ah, a glória...
Brincadeiras à parte, a coisa é séria e dolorida. Segue aqui.

OPINIÃO DO ESPECIALISTA
O fim da guerra e a retomada da esperança

Em novembro de 1988, os moradores de Ipanema conheceram a barbárie. No asfalto da Rua Barão da Torre, onde fui criada, jazia a cabeça de um homem, atirada do alto do Morro do Cantagalo. O decapitado era imposto como símbolo do poderio dos déspotas que controlavam as favelas cariocas.
Como boa parte da população do Rio, sempre tive a favela como vizinha. Por mais de 40 anos, convivi com o Cantagalo. Meus pais, moradores de Ipanema, jamais temeram o propagado dia em que "aquela gente" da favela tomaria a cidade. Porque, para nós, "aquela gente" eram trabalhadores honestos que moravam encarapitados em casebres, sobrevivendo sob o olhar desconfiado das elites. "Aquela gente" tivera que se submeter às ordens de criminosos pelo descaso absoluto das autoridades constituídas.
A partir da década de 80, a banalização da violência cresceu, aterrorizando os moradores das favelas e amedrontando os "do asfalto", que desviavam o rosto, como se faz em relação a mendigos e aos meninos de rua do Rio. Tomadas de favelas por forças policiais assisti a muitas, sempre após batalhas entre grupos de bandidos. Os policiais entravam para solucionar crises, montavam postos de guarda no alto dos morros ou em praças no centro do aglomerado de casas, quando a favela era horizontal. E os moradores se rendiam tanto ao temor e às ordens dos criminosos quanto à truculência da Polícia. Casas eram invadidas por traficantes, portas arrombadas por policiais.
Chega um momento em que todos preferimos a ignorância das estatísticas para não sofrer mais ainda. A implantação das UPPs em algumas comunidades foi encarada com ceticismo por boa parte dos cariocas. Os traficantes eram alertados pelo governo e abandonavam a região, que tinha imediata valorização imobiliária - o que contribuiu para a aprovação das medidas pelas classes média e alta. A venda de drogas nesses locais continuava, discretamente, sem a exibição de armas. Outros negócios movimentados pelos traficantes e pelas milícias foram impedidos pela chegada das UPPs. A reação do tráfico era aguardada. Quando ela aconteceu, há duas semanas, imaginava-se a total desmoralização da política de ocupação. Mas isso não aconteceu. A diferença da recuperação do conjunto de favelas do Alemão para as ações anteriores é que, além do apoio das Forças Armadas, esta contou com o aplauso de quase 90% da população do Rio. Ela foi saudada não apenas por quem vive na linha de tiro, mas também pelos que se protegem em grades e vidros blindados. O momento é de euforia e expectativa, apesar de alguns ainda desacreditarem na ordem. Os cariocas, que insistem em amar seus cantos sofridos apesar das tragédias diárias, quer ter o direito de confiar no Estado e na Polícia. Espera-se para breve novas batalhas pela retomada dos muitos territórios onde os bandidos se aquartelaram. Ninguém pode prever o que acontecerá. Porque, definitivamente, alguma coisa mudou na praça de nossa guerra urbana de cada dia.

Olga de Moura Mello
Jornalista

26.11.10

Guerra urbana



As imagens que mais me impressionaram na batalha da Vila Cruzeiro, ontem, foram as que mostravam o contingente de traficantes subindo o morro, em fuga do confronto com a Polícia. Ao longo do dia, acompanhei a cobertura pela TV Globo (nem adianta: todo mundo gostou das imagens ao vivo, sim. São espetaculares, primorosas. E a culpa não é da imprensa pela situação mostrada, que é grave mesmo). E durante a tarde, troquei comentários no Facebook, que posto aqui porque eles exprimem o que fui percebendo, diante de réplicas às vezes raivosas, às vezes preconceituosas, às vezes apenas pueris.

Destilar o ódio ao pobre, preto e favelado não resolve a situação. O preto, pobre e favelado não é bandido. É pobre, por isso, favelado. Pregar o extermínio oficial dos bandidos também não elimina o problema da falta de padrões que levam as pessoas a tal meio de vida - curta, aliás.

Acredito, realmente, que boa parte da população está tão cansada com esta situação que se estende por tanto tempo que desabafa com raiva, criando uma bolha de exceção para os que ama. O mundo é habitado por nós e por "aquela gente".

Não digo que não tenho medo de bandidos. Tenho, e muito, claro. Mas não me dou o direito de decretar a morte deles em prisões superlotadas ou simplesmente exterminados. Igualar-se ao bandido é ser criminoso também.

Em tempo, acho que a Polícia está agindo de forma correta. Seguem, então, as observações diversas.

  • Ideia genial que acabo de ouvir: pegar as toneladas de maconha apreendidas ontem ou hoje, fazer uma fogueirinha na frente do Alemão pra ver se acalma a galera toda, só com a fumaceira da erva.

  • As vozes do obscurantismo já se fazem ouvir, bradando pelo extermínio da bandidagem, regozijando-se com a ação policial e torcendo para que se torne um banho de sangue. Acho tão perigoso quando nos vemos como imunes a tais justiçamentos, enquanto "os outros", ou seja, os pretos, pobres e, por isso, culpados pela própria natureza, ficam à mercê de julgamentos fora de tribunais.

  • Antes que comecem os brados de "Bandido bom é bandido morto", vale lembrar que o Estado brasileiro acredita e luta por isso há muito tempo! As condições carcerárias no Brasil são tão criminosas quanto os que estão nas cadeias. Em espaços mínimos ficam amontoadas centenas de pessoas, o que nos leva a imaginar um nítido objetivo oficial de levá-las ao confronto e morte. A gente mantém um Estado para desenvolver políticas de prevenção ao crime e de punição aos delitos, não de extermínio. Sei que esses caras são perigosos, sei que nada justifica a crueldade. mas ao Estado não cabe o papel de ser bandido com o bandido.

  • Já tive amigo assassinado por traficante. Já tive amigo assassinado por assaltante. Já fui assaltada. Já tive filho assaltado. Mas isso não me fez desejar a morte de todos esses bandidos. É uma questão de formação pessoal, de filosofia de vida. O discurso não está pronto, não. Eu o escrevo diariamente quando crio filhos que convivem normalmente com pessoas de etnias, categorias sociais e opções sexuais diversas. Ou quando peço, apenas, que a gente reflita sobre o que nos diferencia ou nos dá o direito de clamar pela morte desses bandidos.
  • Acabo de me deparar com comentários pavorosos sobre a situação da cidade e a arrogância carioca. Triste pensar que a cidade atravessa um momento desses e há quem destile seu ódio pelo Rio, chamando seu povo de ignorante, besta e, principalmente, culpado pelo que está acontecendo. Alegria do palhaço é ver o circo pegar fogo
  • Eu havia postado um comentário, dizendo que nosso Estado é realmente adepto do extermínio, vide nossas condições carcerárias. E isso foi motivo pra ser chamada de ingênua, copiadora de discurso pronto, ou instada a levar para casa cinco bandidos.
  • Só para esclarecer: não sou contra esta ação policial, que me pareceu, até agora, bastante cuidadosa. Entendo perfeitamente que a população esteja farta de lutar contra a violência urbana. Mas não que a desgraça acontecendo no Rio dê munição para os adeptos da pena de morte, que, exceto em tomada de poder por revoluções mundo afora, acabam atingindo os pobres de sempre.

22.11.10

Saint Pauly

Ih... cadê a Olga, que não teve tempo, grana nem como vir pro Morumbi me ver? Será que preferiu viajar até Bauru, onde o Kevin Costner brincava de roqueiro?
Ah, São Paulo, ah Sir Paul!!!!

11.11.10

D.Odilão Moura O.S.B (1918-2010)


Batizando Júlia - Oto, como sempre, aprontando lá atrás






Com Júlia e Mamãe, num Natal.


Neste novembro tumultuado por vestibulares, provas, aniversários de dois filhos, casamentos de duas primas, acabo de perder meu tio mais velho. Para os que o conheceram fora da família era D. Odilão Moura, monge beneditino, professor de Teologia e Filosofia durante muitos anos na PUC e na Santa Úrsula, especialista em Sto Tomás de Aquino.
Para mim era o Tio Telmo, o sacerdote da família nem tão católica assim, responsável por oficiar casamentos e batizados de irmãos, sobrinhos e sobrinhos-netos, celebrante de todas as missas.
Péssimo motorista, dirigia um fusquinha que Vovó lhe deu para facilitar as idas do Centro, onde fica o Mosteiro de São Bento, à Gávea. Por duas vezes, foi o piloto em viagens que fiz com ele pelo interior de São Paulo. Sentia sono na estrada (acordava diariamente às 4 da manhã e nos telefonava às 7h, mais que desperto, rindo porque a voz que o atendia tinha indícios de um despertar a contragosto), parava em postos de gasolina para dormir por dez minutos.
Adorava comer, um dos prazeres que precisou reduzir, velhinho, por causa da diabetes. Exatamente como minha mãe, tinha acessos de riso incontroláveis, que contagiava quem estava por perto. Não podia ver um mendigo na rua sem obrigar os irmãos a darem esmolas. Adorava crianças. Contava que fora uma peste em menino, fugia de casa, vivia de castigo de tão moleque. Meu filho Oto seguiu a tradição. Aos 12 anos, virou um erudito, estudante compenetrado. Tentou seguir Medicina, mas não conseguiu acompanhar dissecações de cadáveres. Fez alguns meses de Direito. Acabou entrando para o Mosteiro aos 19 anos, para revolta de uma prima mais velha. "Telminho é bonito demais", escreveu a parenta para minha bisavó, que retrucou: "Deus também gosta de gente bonita, ora". Mas Telminho, segundo minha mãe, logo botou óculos, ficou careca e engordou. Uma sina da família.
É estranho enterrar os parentes, mesmo velhinhos, mesmo sobrevivendo sem lucidez, como era o caso de Tio Telmo há pelo menos dois anos. Uma parte da formação de minha vida foi sepultada ontem também.

1.11.10


Quem diria, hein?

Sem carisma, sem uma família feliz a seu redor, sem beleza ou doçura, uma mulher que foi à luta e chegou mais alto do que jamais poderia imaginar.

25.10.10

O abandono

Esse negócio de voltar aos estudos não é para qualquer um, não. Tem uma fase ideal para isso na vida. Não é aos 50, entrando no segundo tempo da existência, com um monte de responsabilidades e vivendo a vida loucamente, sem carteira assinada, lutando literalmente pelo pão de cada dia.

O único jeito de açambarcar o mundo com as mãos é deixar de lado alguns hobbies, como este blog. Não chego a pensar em vida virtual como um compromisso. Assim fazem, já reparei, os internautas que passaram dos 60. Por quê? Ora, porque foram criados para levar a vida a sério. Gente que paga conta no dia certo, que telefona quando falta a alguma festa, que se preocupa em cativar o amigo. E têm a mesma atitude em relação ao espaço virtual.

Adoro este comportamento, mas encaro a vida na Internet por dois ângulos. O primeiro, o facilitador profissional. Por isso mesmo passo o dia ligada. O segundo, a terra aberta, a mata virgem por trás daquela praia de areias douradas, que atravessamos sem qualquer pudor ou temor, loucos para desbravarmos o que virá pela frente. Com essa desfaçatez de invasor, eu realmente não me sinto obrigada a postar ou a guardar um compromisso com meus fugazes leitores. Ando numa fase Facebook, onde o diálogo é constante e direto.

Mas não esqueço este cantinho, não.

É como a varandinha de minha casa, mais frequentada pelos gatinhos hoje, que foi, no passado, meu canto de ler jornal. Agora, leio jornal na tela, sem esquecer de regar as plantinhas que enfeitam a varanda.

Vez por outra, volto aqui para avivar este espaço, que, quem sabe, vicejará em todo o seu esplendor daqui a pouquinho?




E pra festejar a chegada aos 50 minutos de partida, cá estou eu, comemorando, na antevéspera, ao lado de meu passado e meu futuro: minha amiga Neydinha e Júlia.


Um festança, na véspera da eleição de primeiro turno, com comparecimento de amigos de todas as fases de minha vida: do colégio, da Cultura, do Coral, da praia, de profissão, e até o núcleo mais recente, o da PUC, onde curso pós-graduação. Naturalmente, dançamos, cantamos e pulamos para o total constrangimento dos filhos e deleite dos primos mais velhos.
Já estou planejando os festejos dos 60 anos.


23.10.10













































Só não reconhece Pelé como majestade quem é ruim da cabeça e doente do pé.

13.10.10

A Bastilha

Os principais argumentos contra Dilma Roussef na presidência da República que ouvi até agora são sua falta de carisma, sua inexperiência (em quê?), o passado guerrilheiro e pertencer ao partido que teria entronizado a corrupção no poder.
Por mais que eu ache as feições da candidatas muito estranhas no pós-plástica, desde quando carisma é quesito administrativo?
Alguém que já foi secretária de governo estadual e está há oito anos em dois dos principais ministérios do país é inexperiente?
Combater em guerrilha é indigno? Não que eu veja heroísmo em guerras, mas nelas se admite a tortura e o assassinato com o respaldo estatal. Imoralidades como a invasão do Iraque não provocam os mesmos espasmos de ira nos que atacam os ex-guerrilheiros brasileiros, que tentavam derrubar do poder quem não fora eleito para governar a nação.
Reconheço que o PT perdeu a aura santificada quando chegou ao poder e passou a utilizar os mesmíssimos conchavos, costurando alianças espúrias como TODOS os governos anteriores. Não que isso justifique a corrupção. Mas houve uma alternância na roubalheira. Exatamente como havia antes.
Há outros argumentos também. Um deles prega a alternância partidária no poder. Caramba, ficamos décadas sem presidente eleito e agora estamos doidinhos por alternância no poder? O "aparelhamento" do Estado, isso jamais existiu? O loteamento de cargos foi invenção petista? A diferença do PT para os demais partidos é que ele tinha princípios, cara, diferença dos demais agrupamentos. Hoje, é apenas mais um partido.

Doloroso, para mim, como cidadã, é perceber que aparentemente a redução da miséria e da pobreza agride tanto uma classe média que não perdeu nem empregos nem poder aquisitivo. Classificar como populistas programas efetivos de redistribuição de renda é o mesmo que considerar a pobreza e a ignorância opção de quem delas padece. Está na hora de percebermos que somos apenas os felizes resultados do acaso biológico. Por isso mesmo temos o dever de ampliar as possibilidades dos que não nasceram em berços esplêndidos, para que eles também tenham o direito a uma educação de qualidade, a serviços de saúde decentes e a uma vida fora da mais absoluta indigência.

Este olhar que menospreza o invisível, que odeia o pobre, que rejeita o que emana do zé povinho é tão anacrônico quanto os países de governos absolutamente autoritários. Dilma é perigosa porque vai trazer a ditadura do proletariado ao país? Ora, me poupem! Esta Bastilha imaginária não há de cair. Mas o pensamento discricionário, este sim, quem sabe, um dia desaparecerá.





7.10.10

Viva Vargas!!!!


Um Nobel de literatura latino-americano! Merecidíssimo.

1.10.10

Dilmei



Tony Curtis (1925-2010)



Tony Curtis era o galã escalado por Hollywood para o mesmo papel em todas as comédias: o garanhão que acabava se rendendo a alguma jovem belezura - que nem sempre podia competir com ele na aparência.


Teve alguns bons papéis dramáticos, mas ficará eternizado como o rei da sessão da tarde.



O solteirão convicto que se travestia ao lado de Jack Lemmon...



... para conquistar a deusa do sexo, Marilyn ...


... em tempos politicamente incorretíssimos, porém bastante divertidos.
E, inegavelmente, era um gato.



22.9.10

O discurso eleitoral

Tem eleição chegando - e meu cinqüentenário também. Como sou do século passado, posso usar trema sem qualquer receio. Pelo menos até 2012, quandoo acordo passa a valer e o mundo acaba.
Nesses quase 50 anos de vida, já passei por dois ou três fins do mundo anunciados.
Aprendi até a cantar o samba de Assis Valente, aquele que diz que anunciaram que o mundo ia se acabar e o malandro sai fazendo as pazes com a humanidade, beijando a boca de quem não devia, pegando a mão de quem não conhecia, o que, enfim, vai gerar barulho e confusão, porque o mundo não se acabou.
Nesses quase 50 anos de vida, já passei por mais de uma dezena de eleições enquanto sufragadora. Mas nesta, o desânimo me acompanha. Ontem, assisti a um debate dos candidatos locais na TV. Chatinho... Todo mundo dando pau no Serginho Cabral (eu o conheci quando jovem, magro e belo, trabalhando com o pai, o Sergião, eleito, então vereador, um doce de pessoa. Por isso chamo o governador de Serginho), que falava o quanto o estado se deu bem graças à aliança com o governo federal. Serginho está reeleito, resta saber em que turno. As UPPs - ou a tentativa de transformar a Zona Sul no principado de Mônaco, como disse um sociológo - são um sucesso. Eu voto no Gabeira, embora pessoalmente ache que perdemos um grande senador, cargo ao qual ele deveria ter concorrido, deixando de lado a campanha suicida em que se meteu.
No âmbito federal, vou Marinar, também sem qualquer esperança. Por mais que se jogue lama na Dilma, é difícil o Serra emplacar. Lula pegou o País numa fase áurea, abriu os cofres pro social e apresentou um belíssimo programa de construção e concessão de casas para os pobres. Sou realmente entusiasta do Minha Casa, Minha Vida, mesmo achando o nome do programa de um ridículo atroz. Faltou alguém bom de título na hora de batizar a proposta. As bolsas-tudo, as cotas, tudo o que faz estremecer algumas camadas da população, são mais que merecidas. É a previdência social operando no paralelo, porque vai tentar institucionalizar esses auxílios no oficial. Tem que, praticamente, convocar uma Constituinte para criar legislação e regulamentações que gerem despesas.
Mas não vim aqui fazer declaração de voto e sim falar do que eu mais gosto em eleição: a propaganda eleitoral. ADORO! Em plena ditadura, houve época em que a propaganda consistia na apresentação de três fotos do infeliz candidato, que se apresentava sorridente em uma, sério na outra, pensativo na terceira, enquanto uma voz em off enumerava seus feitos e biografia. "Felisberto Aires foi considerado o melhor síndico do condomínio Palhares, em Cachambi, por quinze anos consecutivos, merecendo a reeleição para o cargo todas as vezes em que concorreu. Estudou na Escola Municipal Amaral Peixoto, em Varre e Sai. Mudou-se para o Rio com os pais. Foi engraxate, office boy e vendedor de eletrodomésticos até abrir seu próprio negócio, o Bazar Aires, que hoje tem três filiais na região da Penha Circular. Como deputado, Aires vai lutar pela redução do ICMS, pela regulamentação da profissão de síndico de condomínio e por melhores condições de moradia, com gás de rua em todas as casas da Penha Circular".
Hoje é muito melhor, porque todos podem declamar o mesmo texto, com algumas variações. A frase inicial, dita com entusiasmo ou total apavoramento diante da câmera, quase sempre é "você me conhece". Daí pra frente vem "você sabe que o que eu digo, faço". E a plataforma: "para acabar com a corrupção/violência no trânsito/violência urbana/serviço militar obrigatório/pobreza/menores abandonados/desemprego/flanelinhas/táxis-pirata/camelôs/desmatamento/favelas/imoralidade/funk/poluição sonora/poluição ambiental/poluição visual/impunidade/evasão de impostos/evasão dos royalties do petróleo/evasão da renda dos jogos no Maracanã/tráfico de drogas/tráfico de armas/tráfico de influência/crimes de colarinho branco/sacrifício de animais em rituais de umbanda/filas/escova progressiva nos salões de cabeleireiro/pedras portuguesas nas calçadas". As realizações: "Autor da Lei que obriga os donos de papagaios a registrarem seus pássaros no Ibama / criou o horário exclusivo para a prática do frescobol nas praias cariocas/determina aos porteiros de edifícios que usem uniforme em serviço/exige que os motoboys façam cursos de direção defensiva/concede aos professores municipais uma semana de internação gratuita em clínicas de repouso/reserva aos maiores de 75 anos poltronas mais confortáveis em salas de espera de cinema/garante o direito a pausas para descanso a cada duas horas aos ascensoristas". E o arremate: "Pela ficha limpa/pela prevenção às drogas/pelo fim da impunidade/por Jesus/por Alan Kardec/pelo amor de Deus".

Eu lá quero saber de ouvir aquela lenga-lenga e troca de acusações dos que disputam eleição a sério. Quero mesmo é saber o que falam os que dificilmente chegarão a qualquer parlamento, mas que não estão nem aí se são alvo de zombarias. Eles, os que ficarão de fora do legislativo, pelo menos me fazem sorrir muito mais do que a campanha de Tiririca. Nada contra o legítimo direito de um artista querer fazer política. No entanto, não é o cidadão Tiririca que se apresenta candidato, mas o personagem Tiririca. Vai ganhar muito voto de eleitor revoltado com o establishment. Mas poderia ter um discurso menos imbecil.

17.9.10

TV Brasileira faz 60 anos



capa: A televisão brasileira faz 60 anos sob o fogo cruzado das novas tecnologias e exigências de um público em constante mudança de hábitos.

Em busca de sintonia

Por Olga de Mello | Para o Valor, do Rio

17/09/2010

Testemunha da história para uns, uma de suas protagonistas para outros, a televisão brasileira chega aos 60 anos neste fim de semana em meio a especulações quanto a seu futuro. Sua relevância ainda é incontestável como forma de entretenimento e instrumento de disseminação cultural - mesmo no momento em que a internet conquista um público ávido não apenas por novidades, mas pela escolha livre da programação. A perda da audiência para a rede, já registrada em pesquisas e acompanhada por especialistas, não assusta, no entanto, alguns homens de televisão, como o diretor J.B. de Oliveira, o Boninho, diretor da Rede Globo. À frente do "reality show" "Big Brother Brasil", ele aposta na fidelidade do público, embora ressalte a necessidade de inovações constantes: "A audiência está ali, pronta para se ligar, para assistir. Inovar sempre é uma obrigação".

As inovações já começaram a ser adotadas há tempo. Além de usar e abusar das redes sociais para divulgar a programação, a televisão cada vez mais sai de seus próprios limites, seja atingindo públicos fora das fronteiras domésticas, com seriados gerando filmes para a tela grande - como "Os Normais" e "A Grande Família" -, ou até invadindo a realidade do espectador por meio de perfis de personagens de telenovelas em blogs ou no Twitter.

"A nova forma da televisão é transmidiática. Já se pode comprar o brinco da personagem da novela pelo site da emissora que a transmite. E isso vem de processos iniciados na década de 1970, quando a teledramaturgia não se limitava a contar uma história, mas a direcionava para uma faixa de público específica, baseada em pesquisas mercadológicas", diz Igor Nascimento, um dos organizadores do recém-lançado "História da Televisão Brasileira" (Editora Contexto), que analisa os aspectos social, político, econômico, cultural, tecnológico, profissional e estético, entre outras características próprias da televisão no Brasil.

A autonomia na escolha da programação, fenômeno que só faz crescer a partir da internet 2.0, permanece restrita a uma pequena faixa da população brasileira, os cerca de 14 milhões que têm computador em casa. "O que a internet e as novas mídias possibilitam é abalar a figura do editor, criando mecanismos mais explícitos de contestação do conteúdo e reduzindo a passividade da audiência. Todavia, isso não elimina a moderação do material produzido por esse novo espectador", observa Marco Roxo, professor do departamento de estudos culturais e mídia do Instituto de Artes e Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense, e também organizador de "História da Televisão Brasileira".

Para Esther Hamburger, chefe do departamento de cinema, rádio e televisão da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, a ânsia de inclusão digital é forte no Brasil, mesmo esbarrando na precariedade da infraestrutura da banda larga oferecida atualmente. "A televisão ficou jurássica para os adolescentes, que praticamente já nem mais a assistem, e está perdendo audiência para ela mesma, para os aparelhos desligados. A tendência é haver uma interação, já que vai aumentar muito ainda o espaço tomado pela internet, gerando uma mudança na relação das pessoas com a televisão", observa Esther.

O público jovem não é uma preocupação específica de Boninho, que acredita na inventividade e na qualidade da programação para atrair espectadores de qualquer faixa etária. "A televisão é uma batalha diária de conquista. Será preciso pensar em qualidade, dar ao telespectador produtos inéditos, diferenciados. A pulverização das mídias será cada vez maior, vai ganhar quem tiver o melhor conteúdo. Na guerra pela audiência, muitas vezes as emissoras preferem popularizar, jogar o nível para baixo e isso é muito ruim. Nosso maior valor é o telespectador."

Apesar do inegável avanço do computador no entretenimento do brasileiro, a pesquisa "The State of Media Democracy", que ouviu, no Brasil, 1.346 pessoas que usam internet (ver quadro) identificou crescimento no número de assinantes de TV paga no país - um público menos passivo que o das gerações anteriores. A mudança de comportamento do espectador começou na década de 1990, quando o Brasil tomou contato com a internet, a TV por assinatura e os aparelhos de DVD."

Naquele momento foram modificadas as relações complexas que haviam sido estabelecidas ao longo de 50 anos. A televisão continua fazendo parte da vida brasileira, mas de forma diferente. O público ganhou uma autonomia que não existia antes", diz Esther Hamburger.

"A televisão ficou jurássica para os adolescentes, que praticamente já nem mais a assistem, e perde audiência para ela mesma"

Por maior que seja o impacto da internet nas comunicações, o rompimento dos telespectadores com a televisão no Brasil está longe de acontecer, afirma Beatriz Becker, professora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mesmo com um discurso elitista e tendo suas origens ligadas à necessidade de representação de uma classe urbana no país, a televisão brasileira seria o elemento agregador que permitiu a construção de identidade da nação, além de conceder visibilidade a uma população tradicionalmente excluída, acredita Beatriz.

"A televisão precisa escapar da visão de que é o depósito do lixo intelectual do mundo. O Brasil foi inovador na utilização da técnica de produção para massas, com projetos vanguardistas de estéticas renovadoras em narrativas televisivas, tanto na teledramaturgia, que levou a linguagem do teatro para a televisão, quanto na cobertura jornalística. A televisão brasileira pode reivindicar com propriedade seu papel como produto cultural, que tanto intervém quanto sofre influências da sociedade. É nessas interações que ela leva ao espectador a ideia de cultura brasileira", diz Beatriz.

O país muda e a telenovela vai junto

A importância cultural da televisão brasileira foi minimizada por quem contribuiu para transformá-la no mais acessível instrumento de divulgação de tendências e formação de plateias do país. Para alguns estudiosos, a contradição de um meio popular com uma produção elitista está na formação de seus próprios quadros. "Em todo o mundo, a programação de televisão é voltada para as classes populares. Aqui, ela não menosprezou o espectador. Os autores que escreviam para a televisão eram, em boa parte, esquerdistas com ambições intelectuais. No entanto, foram necessários 30 anos para a TV deixar de ser branca e elitista", afirma Esther Hamburger, autora de "O Brasil Antenado - A Sociedade da Telenovela" (Zahar).

É na teledramaturgia que a televisão brasileira tem seu principal produto cultural, que consolida o veículo como um empreendimento viável nas décadas de 1970 e 1980. Seus temas discutem a contemporaneidade, tratando do cotidiano de grupos como o Movimento dos Sem Terra e dos moradores das favelas, além de criar vínculos com espectadores que se reúnem para acompanhar o desenrolar de folhetins que podem abordar problemas sociais, desde "Beto Rockefeller", em 1968, quanto apresentar um Brasil fora do eixo metropolitano, com "Pantanal", em 1990.

"A telenovela é a verdadeira crônica de um país que procurava a modernidade. O ápice do gênero se dá em 1988, com 'Vale Tudo', de Gilberto Braga. As qualidades técnicas e artísticas haviam levado as novelas a conquistar um público heterogêneo, que só se dispersa depois da entrada da internet no Brasil. Talvez o didatismo das novelas de intervenção, que promovem campanhas para reduzir as exclusões, também tenha contribuído para esse afastamento dos espectadores", diz Esther.

A relação entre espectadores e televisão já foi mais estreita. Na década de 1980, programas de auditório vespertinos, como o "Aqui e Agora" e "O Povo na TV", dão voz aos problemas de uma população que se queixa do atendimento precário que recebe do poder público. "Muito se falou na exploração da miséria e no tom apelativo desses programas, que até hoje dominam o horário, com novos formatos, talvez um pouco menos dramáticos do que os originais", diz Marcos Roxo, autor do artigo "A volta do 'jornalismo cão' na TV", publicado no livro "História da Televisão no Brasil". O rádio, que foi a primeira referência para a televisão brasileira dos primeiros tempos, quando locutores apresentavam os telejornais, serviu de modelo para essa programação destinada a camadas populares.

"Aos programas seguiu-se um intenso debate sobre os limites do sensacionalismo e o jornalismo investigativo. Falava-se em processo de mexicanização da TV brasileira, em circo na TV. Essa programação foi estratégica para a consolidação do SBT. Hoje, temos uma TV bem mais popular do que há 20 anos, com 'reality shows' e muitos programas de auditório", observa Roxo.

A rendição ao popular foi lenta, mas constante. Nas décadas de 1960 e 70, a música que chegava à televisão era sofisticada, em festivais da canção que tinham Edu Lobo, Dori Caymmi, Tom Jobim e Chico Buarque entre os concorrentes, ou em programas como "O Fino da Bossa", apresentado por Elis Regina e Jair Rodrigues. Eclética, a Record também abriu espaço para Roberto Carlos e os representantes da Jovem Guarda, enquanto a anárquica "Discoteca do Chacrinha", na TV Globo, recebia figuras de proa do Tropicalismo, como Caetano Veloso e Gilberto Gil. Os gêneros mais sofisticados da MPB atualmente só aparecem bissextamente na televisão ou são relegados a programas especiais em horários de pouca audiência, enquanto manifestações "das periferias" ganham cada vez mais espaço em emissoras como a Rede Globo, que também já veiculou a série "Cidade dos Homens", sobre a vida de dois meninos em uma favela carioca.

"Depois do documentário 'Notícias de Uma Guerra Particular', de João Moreira Salles, em 1999, e principalmente após o sucesso do filme 'Cidade de Deus', de Fernando Meirelles, houve uma visibilidade da favela que a TV tinha se acostumado a apenas passar por cima. E o tratamento que essa realidade recebe na televisão é menos sensacionalista e espetacularizado do que no cinema. Isso reduz a discriminação social vinculada à violência", afirma Esther Hamburger.

O distanciamento entre a televisão e a realidade brasileira era bem maior até os anos 1970. O telejornalismo era calcado no noticiário das agências internacionais. O mais conhecido dos telejornais, o "Repórter Esso", pautava-se pelos temas de interesse do patrocinador, no caso a refinadora de petróleo americana Standard Oil.

"É com o 'Jornal Nacional' e a transmissão em rede que o Brasil se encontra como nação. As pequenas emissoras do interior tornam-se repetidoras das grandes redes, mas o telejornalismo começa a tomar outro rumo, mais ligado aos temas brasileiros. O conceito de rede não apenas consolida a produção para a TV, mas também integra o país", diz Igor Nascimento, organizador de "História da Televisão no Brasil". (OM)

16.9.10

Sobre blogs e narcisos


Ando tão desmobilizada para escrever blog...

E há algum tempo eu escrevi o texto abaixo, que era exatamente sobre a auto-exposição excessiva de alguns blogueiros. Mas aí, na hora de publicar, como ele andava guardado nos rascunhos, saiu na data de seu "salvamento". Coisas de computadores. Bem, então, repostei aqui, porque blog é isso, uma gaveta de guardados próprios.

Voltando à questão de hoje.

De um momento pra outro, o blog me pareceu mais narcisista do que convém a alguém que não é exatamente uma cultuadora do próprio ego.

Blogar, pra mim, foi a continuidade de um exercício desenvolvido há anos, de registrar acontecimentos, de expressar pensamentos. A expressão pública das próprias sensações - que tanto sou obrigada a combater e a evitar, profissionalmente - me fez bem. No entanto, tentei me preservar pessoalmente, quis manter uma observação da cidade que acabou se perdendo ao longo dos últimos anos.

E à medida em que surgiram mais e mais ocupações profissionais, fui deixando o blog de lado. Não quero decretar minha aposentadoria como blogueira, embora eu não seja daquelas cronistas que farão falta a uma multidão de leitores.

Mas preciso justificar este afastamento, nem que seja para a meia dúzia que vez por outra baixa por aqui.

Uma gratíssima surpresa foi descobrir que uma pessoa a quem recentemente conheci já havia caminhado por estas areias.

Blog é meio estranho dentro do universo carioca. Isso porque a gente conhece a população da cidade inteira por aqui. É praticamente impossível sair à rua sem encontrar algum conhecido por acaso. Ir ao cinema ou ao teatro é quase sempre ter a certeza de esbarrar em alguém - exceto se for na Barra, claro, porque lá é outra cidade mesmo.

Mas leitor de blog não é quem vai à praia ou vive em boteco. São pessoas que têm o hábito de ler - e hoje a gente encontra mais escritores que leitores, é certo.

Por isso, minha imensa surpresa ao conhecer uma leitora.

Um momento de autor que encontra seu público, sabe?

Meus quinze minutos de fama já aconteceram...

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Acabei de iniciar e desistir da leitura de Destrinchando, de Julie Powell, a autora de Julie & Julia, em que ela contava de seu projeto de cozinhar todas as receitas de Julia Child durante um ano, algo que relatou em blog e, depois, rendeu-lhe o livro, que virou filme com Meryl Streep.
Bom, minha vida pra lá de pueril não rende nem artigo de revista feminina, sequer um filme independente com Hope Davis. Só que Ms Powell decidiu abrir seu coração nas páginas, da mesma maneira que a deslumbradíssima autora de Comer, Rezar, Amar. Elas são as escritoras do not-really-misery-books ou sei lá como serão classificados esses livros.
Dão de contar a vida desinteressante delas, entremeiam com descobertas pessoais importantíssimas e ... presto! Eis que surge um novo candidato a best seller.
Peguei o livro com a maior das boas vontades, apesar de haver achado Julie bem fraquinho.
Depois de ler mais de 100 páginas sobre os dilemas da moça que quer ser escritora e que decide aprender a retalhar carne em açougue para focar-se em um novo projeto, enquanto vive uma crise matrimonial séria, dividida entre o amor pelo marido e a paixão pelo amante, desisti.
O que me espanta não é a falta de consistência do livro, repleto de receitas, pois parece que a moça só subsiste enquanto ser humano e pessoa se houver um fogão com panelas fumegantes a enfrentar. O que me espanta é essa faceta despudorada dos tempos d'agora, de abrir sua vida ao mundo inteiro, numa exposição de problemas íntimos, sem qualquer tipo de contribuição à Humanidade. O que me parece é que esta moça decidiu brincar de maluquete, seguindo projetos insólitos - cozinhar 300 pratos franceses, dessossar boi - ligados, de certa maneira, ao ato de alimentar os outros. Mas o que está ficando bem nutrido mesmo é o ego dela.

O primeiro livrinho ainda dava pra ler. O segundo só alimenta o tédio.

O jardineiro que eu queria no meu canteiro

Não é por nada, não, mas o Benício Del Toro, em São Paulo, de bonezinho do MST, brincando de Dia da Árvore, é uma alegria para a atriz que regou a plantinha com ele...
Quer apoio maior pro PT em ano eleitoral?

4.9.10



Meus olhos coçam, o dia amanhece. A madrugada durou tanto.
Quando clareia, a vida parece mais fácil.

1.9.10

Nota de falecimento

Todo mundo tem uma história com o Jornal do Brasil. Todo mundo do Rio, claro.
Tanto quem o fez como quem o leu.
Quando fui contratada pelo Globo, onde permaneci por dez anos, de 83 a 93, um ex-namorado se espantou. "Você? No Globo?". Uma amiga, na praia, se indignou: "Ah, sai do Globo, vai pro JB. Tem muito mais a ver com você".
Isso porque o JB era o jornal da Zona Sul. O Globo, conservador, era a voz da Tijuca, enquanto o Dia era dos subúrbios e Baixada.
Eu morria de inveja de quem trabalhava no JB porque sabia que a redação tinha, além de salários melhores do que os do Globo, na época, o que chamavam de "salário ambiente". Ninguém gritava. Todos eram sorridentes. O Globo era uma pedreira que só perdia para O Dia em tensão.
Em 1995, fui trabalhar, enfim, no JB, já em decadência. Os salários não atrasavam, mas haviam se apequenado. A Revista de Domingo ainda mantinha o charme do veículo, elegendo musas de verão. Só permaneci por lá durante um ano e pouquinho. Não conheci o JB da nostalgia. Gostei dele, claro, mas não era minha casa, embora continuasse sendo o meu jornal. Até quando estava no Globo eu assinava o JB.
Quando criança, eu preferia o Globo pelas histórias em quadrinho. Mas meus pais compravam os dois, porque eles queriam ler os colunistas do B - Carlos Drummond e Clarice Lispector, entre eles. Depois vieram muitos, entre eles Veríssimo - que passou pro Globo, como todo mundo.
O Caderno B era limpo, moderno, arrojado. Permaneceu assim enquanto pôde. Abria fotos descomunais, como na morte de Marcello Mastroianni, em 96, com a legenda "Ciao, Marcello" (a editora era minha amiga querida Regina Zappa). Um exemplo apenas, da memória que resta.
Meu pai foi da finada Última Hora, onde conheceu meu padrinho, João Ribeiro. Foi a primeira redação que frequentei, adolescente. Quando a Última Hora acabou, doeu em muitas gerações de jornalistas. Nesses quase 50 anos, vi morrerem outros veículos, diversas emissoras de TV (Rio, Manchete, Excelsior, Tupi), revistas (tudo da Bloch - quem se lembra da Amiga?-, além de Fatos e Fotos, Sétimo Céu, Realidade, Senhor... acho que até o costureiro Gil Brandão tinha uma revista). De jornal pranteado só me recordo do Correio da Manhã.
Do meu breve tempo no JB tenho boas recordações e grandes amizades. Lá conheci meu irmão e sócio Eduardo Graça, estreitei laços com Naná Ferreira, travei embates diários com meu agora vizinho Affonso Nunes, além de ter visto nascer uma geração que hoje milita pela redação do Globo ou de outros veículos. Não é deste JB que eu sinto mais falta, mas de um que já havia trocado de formato, em todos os sentidos.
A lamentar é que o jornal, como tantas outras empresas, não morreu pela concorrência, mas pela pouca competência de seus gestores.

30.8.10

Emmy 2010

O blog anda meio largado, mas domingo teve Emmy, com aquele desfile de trajes típicos do star system. Urge, então, que venham aqui minhas observações a respeito da festa, que transcorreu sem incidentes, com os mesmos sorrisos amarelos de todos os anos.
A cor da vez foram os tons de chumbo que os seres masculinos definem como cinza, mas que mulheres e gays chamam de grafitti, chumbo, carbono e demais designações comuns também a cores de esmaltes de unha. Aliás, uma curiosidade. Raras são as estrelas que combinam a coloração das unhas com a dos vestidos, em Hollywood.
Sobraram ainda as referências egipto-greco-romanas.
Sem grandes surpresas, mas com vestes surpreendentes. Como sempre.
Este post só existe devido ao auxílio e à argúcia de Sol, que sempre descobre pérolas do bem trajar enquanto acompanhamos o eveiiiiinto.




Por que abrir com George Clooney? Ora, porque além de charmoso, bonito, simpático e inteligente, ele foi bem arrumadinho, como manda o figurino. No passado, já teve mulletts, mas hoje é um senhor muito cioso de sua função, a de Cary Grant da atualidade.

Não sei quem é esta moça, invejo-lhe a beleza, o sorriso e a coragem de completar a embolação verde da parte inferior do vestido com o penteado Marge Simpson.

Ty Burrell e mulher, inspirados, certamente, em Rett Butler e Scarlett O'Hara.
Amy Poeler, num drapeado greco-monroeniano, e Will Arnett

Tina Fey, que quase sempre acerta.
Eric Stonestreet era uma zebra tão grande que sequer arrumou uma gravatinha para subir ao palco e ganhar seu Emmy.
Tem sempre alguém que se veste de panela. Desta vez foi Wanda Sykes.

Esta moça do Mad Men, é, como disse a Sol, uma Mad Woman. Todos os anos ela tenta ser a mais mal vestida das festas. Não conseguiu, mas caprichou no decote e nas peninhas.


Para compensar a ausência de busto, a jovem ampliou as ombreiras.



Glenn Close, verde acinzentado, digno.

Ainda bem que Toni Colette é muito mais atriz do que belezinha. Precisava dessas madeixas? Ou que o vestido (acinzentado, claro) tivesse este aspecto de sujo pela lama na qual a condenada chafurdou até o patíbulo?

Existe algum especialista em trajes em Hollywood que ODEIA mulheres gordas. Sempre, em qualquer dessas premiações, ele consegue enfiar algo nessas moças de modo a torná-las disformes, geralmente com uma refererência greco-egípcia.

Outra ninfa egípcia.
Scott Bakula - com a mulher aproveitando o vestido de noiva - e a gravatinha gaiata.
Alan Cummings, tranquilo porque Johnny Depp não apareceu para concorrer com ele como o mais mal vestido, digo, extravagante da festa.
Há quem insista no balonê, algo que só cai bem em crianças. Muito pequenas. Assim, fica uma odalisca mal resolvida.

A mocinha de Glee, bem Southern Belle.

Faltou exuberância natural na releitura pink de Marilyn Monroe no Pecado Mora ao Lado, envergada por Keri Russell.

Juliana Margulies, simplesinha e bonita.

Quem se veste assim, merece um repeteco.
Sofia Vergara, a mais bela entre as belas.

Lea Michelle, chatérrima em Glee, uma graça no tapete vermelho, com babados em profusão e um verdadeiro guardanapo de brilhantes no pescoço.

Claire Danes, solar.
Kelly Osbourne tentou ser mais do que punk, mas ficou parecendo que roubou o estofado do sofá.

Nada ou ninguém bateu January Jones. Com o bustier trabalhado em conchas, este vestido entra para a galeria das piores escolhas em roupa de todos os tempos, próximo ao hors concours cisne da Bjork. Um comentarista resumiu a respeito disso, com propriedade: "This doesn't work at all".

David Straithan, simplesinho.

Emily Blunt, bem... digamos assim... festa de formatura da década de 50, talvez? O marido, Jon Kasinski, usou a gravatinha borboleta da prom, pra combinar.

O vestido coral de Maura Tierney quebraram a hegemonia cinzenta. Cabelos curtinhos mais que justificáveis - ela está se tratando de um câncer.

Heidi Klum queria mostrar que estava em forma depois da quarta ou quinta gravidez.

A jovem esqueceu das calças do pijama.
Descabelada, desconsolada. Ouviu dizerem que o vestido era uma atrocidade.

O quesito Cortinado de Carro Fúnebre foi brilhantemente representado pela Emily Deschanels.
A noção de vida eterna, vampirismo, essas lendas, tudo vem do Egito, inspiração máxima para a roupa de Anna Paquin.
Jennifer Westfeld, também plúmbea.
Uma coisa eu admiro nesta moça - a coragem. O vestido é daquele comprimento apropriadíssimo para filmes situados nos anos 50 ou como um cisne negro no Lago dos Cisnes. O coque, que já foi moda, deveria ter sido extinto junto com o misógino que o criou.

Usei muito maiô inteiro "engana-mamãe". Na praia, cabe. Não combina é com longo de gala.

Sim, um pretinho básico pode salvar a vida de qualquer uma, mas não o da Eddie Falco, que estava completamente desenxabida envergando a veste de luto de rainha tebana.

Outra grega de branco.
Al Pacino levando mais uma estatuetinha pra casa, onde fez bronzeamento artificial para combinar com a negritude capilar.