28.8.07

Arenas e a Mídia

Este é um blog já publicado na grande imprensa!
Fazendo uma pesquisa hoje, encontrei esta matéria, do meu amigo-irmão e ídolo, Eduardo Graça, feita quando ele estava acabando de se mudar para Nova York. Aliás, o Eduardo é o padrinho do Arenas, pois foi pela inspiração dele, que criou o www.edudobrooklyn.blogspot.com, que eu decidi traçar minhas linhas na Web.
Então, segue aqui o texto, como sempre magnífico, do Eduardo, sob blogs e dramas pessoais.

Cerimônia do adeus
Por Eduardo Graça, para o Valor
24/06/2005





O anúncio foi feito no dia 5 de fevereiro de 2004 e comoveu uma legião de amigos de todas as partes do globo. "Candy Girl" acabara de falecer. Ainda emocionados, Meroë, Colin, Linda, Ernest e Rob postaram aquela que seria a última mensagem de Emma Candy em seu weblog "May I Be Frank?". Durante cinco intensos meses ela dividiu com íntimos e desconhecidos o cotidiano de uma mulher inglesa de 35 anos consciente de que tinha câncer no ovário. O nome do blog é uma homenagem ao cirurgião que deu a notícia a Emma, três anos depois de ela retirar um cisto. "Ele mudou minha vida", escreveu a designer de móveis.


Os "health blogs", diários de pessoas enfrentando problemas graves de saúde, são a mais recente ferramenta para os que buscam uma maneira de dividir suas experiências e documentar os mais diversos tratamentos médicos no que já é classificado por médicos e pesquisadores como 'web therapy'. Ao mesmo tempo em que produzem um banco de dados extremamente valioso para futuros pacientes e seus familiares, os 'blogueiros da saúde' também se dedicam a uma espécie de auto-terapia, em uma versão eletrônica do velho e bom desabafo.


A página www.healthdiaries.com, por exemplo, aqui dos EUA, já reúne nada menos do que 176 diários, selecionados por tópicos que vão de doenças auto-imunes e síndrome de pânico a disfunção alimentar e alergias. Um deles é o de Keron Williams, 31 anos, que vive em Buffalo, no estado de Nova York. Ela sofre de lupus, fibromialgia e, nada surpreendente, depressão.



Em uma passagem por seu blog logo se descobre que Williams cria sozinha uma criança de 9 anos, é negra e trava uma batalha kafkiana com o sistema de saúde pública dos EUA. No inverno ela foi informada de que não receberia mais medicamentos para combater a fibromialgia, agora excluída da lista de doenças assistidas pelo Estado. "Vários médicos me disseram que, de qualquer forma, não vou precisar dos remédios mesmo. É engraçado, porque penso de maneira totalmente diferente e não tenho como não levar em conta que nenhum dos meus médicos sofrem de fibromialgia. Alías, muitos deles já me disseram que esta não é nem mesmo uma doença de fato, que tudo está na minha cabeça. Então, pergunto: quantas pessoas que estão lendo o meu blog simplesmente param de tomar remédios contra a dor?"


Em poucos minutos, outra mulher, que se identifica apenas como Lisa, decide responder ao desabafo de Williams. "Vivo o mesmo problema. Tenho lupus e ontem fui diagnosticada com fibromialgia e síndrome de Raynaud´s. Entendo exatamente o que você está passando e sei como é aquela coisa de pensar 'por que isso foi acontecer só comigo?' Bem, não é só com você e me deixe dizer uma coisa: sou branca, caucasianíssima. Se você quiser conversar com alguém que passa pelos mesmos problemas, por favor entre no meu site, escreva no meu blog, vamos trocar e-mails".


Diretor do Hospital do Câncer II, uma das unidades do Instituto Nacional do Câncer (Inca), centro de referência da doença no Brasil, o dr. Reinaldo Rondineli acredita que esta comunicação entre os pacientes é uma ação quase sempre positiva. "Não conheço nenhum paciente aqui do Inca que mantenha um blog, mas acho a idéia extremamente saudável. Tratamentos bem-sucedidos, por exemplo, tendem a ter um efeito extremamente positivo na troca destas experiências", diz. Ele também conta que no Inca, que fica no Rio de Janeiro, já há um projeto em desenvolvimento para que o paciente possa ter a oportunidade de conversar com as diversas equipes de saúde envolvidas em seu tratamento.



Olga de Mello foi durante anos assessora de imprensa do mesmo Inca e travou a batalha de lutar contra o câncer de cérebro que consumiu sua mãe. Hoje blogueira de mão-cheia no delicioso "Arenas Cariocas" (www.arenascariocas.com.br), a jornalista diz, no entanto, que não poderia ter feito um diário sobre o período em que enfrentou a doença de sua mãe. "Eu acho que é uma experiência extremamente pessoal. Uma vivência que eu só conseguiria dividir com a família e os amigos mais próximos. Acho os "heatlh blogs" muito interessantes, mas não são uma opção para mim".


De fato, as noções de privacidade e intimidade parecem cada vez mais nebulosas no mundo contemporâneo dos reality shows, da notoriedade instantânea e do grande espelho de face dupla da internet. Quando a BBC anunciou, em fevereiro, a morte do jornalista Ivan Noble, 37 anos, especialista em ciência e tecnologia, nada menos do que 300 mil pessoas entraram em seu blog para ler seu último 'post'. Noble mantinha o diário desde agosto de 2002, quando foi diagnosticado um tumor maligno em seu cérebro. Em sua derradeira mensagem, no dia 30 de janeiro, ele deixou claro que 'não se sentia um derrotado'. E que, mesmo nunca tendo detectado um talento especial pelo jornalismo em primeira pessoa, se seu "health blog" 'ajudou duas ou três pessoas a largarem o cigarro e não contraírem qualquer tipo de câncer em sua vida, então sinto que minhas mal-digitadas linhas já valeram a pena".


Inúmeros internautas deixaram mensagens de conforto para a família de Noble, citado como inspiração e motivo de orgulho dos britânicos. Mas muitos outros passaram pelas páginas do blog sem deixar maiores marcas. Curiosidade mórbida ou solidariedade silenciosa? A jornalista Natalie Hanman, do jornal britânico "The Guardian", autora de uma extensa pesquisa sobre o tema, acha que, assim como na sociedade 'real', há de tudo um pouco no mundo da blogosfera. Em geral, na maioria dos "health blogs", a prática é escrever regularmente sobre os desafios vencidos - ou não - no contato direto com a doença ao mesmo tempo em que se responde a e-mails de curiosos e conhecidos sobre sua rotina. A rotina acaba se transformando em um 'quase-emprego', que, na descrição de vários blogueiros, os mantém 'vivos, lúcidos e com mais vontade de viver'.


Um dos blogueiros mais impressionantes do grupo estudado por Hanman é Davey Boy, de Toronto, Canadá, que descobriu há alguns anos ser soropositivo para o vírus HIV. "Eu precisava encontrar uma maneira de dividir o que eu sentia com outras pessoas, então resolvi criar um espaço na internet que poderia ser uma espécie de 'network social' em que eu pudesse também fazer um trabalho mais ou menos educacional voltado para outras pessoas lidando com a Aids", conta em seu blog, que tem o corajoso título de hiv-aids.blogspot.com e oferece links para inúmeros serviços de ajuda a portadores do vírus da aids.


Quanto a Candy Girl, em sua última entrada no blog ela contava que começava a ficar impossível comer e já elaborava um plano para usar pirulitos como uma espécie de catalisador de sabor e excitante de apetite. Dez dias depois, os amigos entraram no blog para comunicar a morte de Emma. Contam que ela morreu em paz, ao lado da família, mostram uma última foto de Emma, passeando feliz, dias atrás, à beira do Tâmisa, e encerram o blog, ainda aberto na internet, como um documento vivo de sua autora, desta maneira: "Este blog foi uma das coisas que mantiveram Emma feliz nos últimos meses. Ela adorava escrever seus 'posts' para todos. Seria genial se as pessoas pudessem sempre dividir seus pensamentos com os outros. Nós sabemos que Emma gostaria de agradecer a todos vocês pelas palavras de apoio, sempre".


Lista de Blogs:


www.mayibefrank.typepad.com


www.healthdiaries.com/blogs/


www.guardian.co.uk/online/weblogs


www.news.bbc.co.uk/1/hi/health/ 4211475.stm


www.arenascariocas.blogspot.com

3 comentários:

Anônimo disse...

Uma vez fui parar em um blog de uma moça que descrevia minuciosamente a luta contra a leucemia de seu filho de 3 anos, e cheguei lá justamente no post em que ela dizia que ele tinha acabado de morrer, com detalhes como "o corpo roxinho no caixão" etc e tal... era uma coisa impressionante como aquela jovem podia escrever diariamente um blog estando naquela situação. Haviam centenas de mensagens por post.

Acho que todo blog é meio "healh", ou meio "help".
O meu, de alguma forma, é.

Olga de Mello disse...

Ah, não mesmo, Jôka. A gente até que se expõe, mas de maneira contida.
Eu não conseguiria abrir de tal maneira a minha vida, não.
Comemorar, brincar, até falar na tristeza, na frustração, vá lá. Mas com uma certa cautela.
bem, assim sou eu. Compreendo bem quem usa o blog para desabafar. Uma vez li um de uma mulher feliz pacas, que dali a uns posts dizia que sua vida era infernal, que vivia sendo espancada pelo marido maravilhoso de posts atrás.
A vida é muito doida mesmo.

Jôka P. disse...

O que mais se vê são blogs de "emagrecimento", você já viu essa "linha editorial" ? São gordas blogueiras em processo de regime que contam quantos quilos emagreceram, o que comeram, o que não puderam comer, se fizeram cocô mole, cocô duro, se tomaram iogurte Activia...