Bella no cio parece uma cuíca fora do tom. De repente ela se cala, atordoada com o bramido da vizinha de cima, gemendo I shot the sheriff sobre a gravação de Bob Marley - que provavelmente só não se remexe no túmulo se estiver sob uma plantação de cannabis sativa. A guria desafina aterradoramente, enquanto eu entôo um "Eu não mereço", seguindo a melodia e em ritmo de reggae, algo que ela ignora solenemente até me escutar e sair marchando do quarto acima do meu.

Essa vizinhança era tão tranqüila antes da chegada da menina, de seu irmãozinho, o querido Pônei, que trota pela casa sem qualquer movimento em prol da educação por parte dos adultos da casa. Tem ainda o botafoguense oligofrênico do prédio ao lado. A menina de cima quer bancar a adoradora de músicas moderninhas e totalmente destituídas de compromisso com o bom gosto. Ai, que saudade da época em que o andar de cima era ocupado por uma república de jovens estudantes, mocinhas lindas e bem educadas, que só faziam bulha uma vez a cada dois meses, quando davam festas tranqüilas.
Um amigo que morou no 200 da Barata Ribeiro, um edifício só de pequenos apartamentos, procurado, preferencialmente, pelas moças que militam no calçadão de Copacabana, dizia que bom é "prédio suspeito". Ninguém faz barulho. De dia, todo mundo dorme. À noite, estão na rua, dando duro. Fora uma batida ou outra da polícia, é tudo muito sossegado. Já prédio família é cheio de crianças e de mães ralhando com os filhos dia e noite.

Quem mandou eu ser família pacas?

Bella, coitada, ouve tudo silenciosa e atônita.