14.2.05

Feliz ano novo

Seu Jorge, meu mestre de obras, me telefonou na véspera para avisar que não retoma a obra, parada há três semanas, antes do fim do mês. "Não esqueci da senhora, não, mas surgiram urgências", informa, em um dos prédios onde ele comanda sua turma de pedreiros, eletricistas, bombeiros hidráulicos, homens que não podem faltar na vida de qualquer ser urbano. Fechar a cratera de uma infiltração já sanada de meu banheiro para o corredor do apartamento fica para depois. Pendurei um tapete peruano sobre a cova e procuro não respirar fundo próximo à caverna oculta.

Seu Luís, o pintor-encanador-pedreiro e vigia noturno de um edifício no Catete, faz-tudo da administradora do apartamento de cima, encarregado de pintar o teto de meu vestíbulo danificado pela infiltração que começou na cozinha do vizinho, também telefonou na noite de Quarta-Feira de Cinzas. Queria começar a obra no dia seguinte, mas Vanúzia, minha empregada, estava de folga e não havia quem o recebesse em casa. A obra vem sendo adiada - por ele ou por mim - há uns quatro meses. Ora eu tenho festa de criança, aniversário, Natal, férias, períodos que não combinam com raspagem de teto e pintura, ora é ele que não pode executar os reparos. Mais uma vez, o serviço é adiado.

Vanúzia chega atrasada, contando que ao voltar para casa, na véspera do Carnaval, parou em uma birosca e foi assaltada. Detalha o assalto, a arma na cabeça do dono da birosca, uma criança que dormia na cadeira, esperando o pai, a bolsinha de moedas que os ladrões levaram. Mora em Santa Isabel, arrabalde de São Gonçalo, segundo ela, uma roça, com pouca luz e muito matagal. O marido não quer sair de lá, diz que assalto tem em todo canto. Vanúzia está traumatizada e nada tenho a dizer para consolá-la.

Voltei a meu ritmo de sono sincopado, acordando a cada duas horas, esperando o toque o despertador. Tocou primeiro o relógio de Hugo, animadíssimo, entra em meu quarto para avisar que vai tomar banho. Júlia está sonada, mas, antes de meu despertador, o apito do guarda de trânsito soa, implacável às 6h15m. Não existe trânsito neste horário, cadê a lei do silêncio? Olha que eu moro de fundos, num apartamento da década de 40, com isolamento acústico melhor que em estúdio de som. Mas o apito do guarda municipal atravessa qualquer barreira. Jogo as cobertas para o lado. Neste verão maluco, dormi de edredom quase todas as noites e estou com a garganta doendo, do ventinho que entrou à noite pela janela. O ano começou!

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