30.5.05





A gente descobre que não vai morrer de amor quando os dias recomeçam mesmo se o outro não está do lado, acendendo a luz cedinho, desligando o despertador, tentando caminhar silenciosamente para não nos acordar. A gente sabe que vai sobreviver à ausência de quem viajou, dos mortos, dos que abandonaram o barco por vontade, por doença, por medo.
E aí nos sobra a dor, que sai do peito e se espalha pelos braços, imobiliza pernas, cerra os olhos, quebra os dentes, rouba a cor dos cabelos e o brilho da pele. A gente se encasula, se embota, se camufla nas paredes de casas sem forro, com buracos nos tetos, reboco descascando.
A vida continua à noite, nos sonhos, quando todos os desaparecidos retornam para cobrar a prestação de contas devidas que se embolam e destroem os vestígios do passado. De manhã, mais um dia começa desanimado e a ele se sucedem tardes infinitas, depois noites curtas, frescas, insuficientes para restaurar a energia de quem perdeu o alento.

3 comentários:

Anônimo disse...

Lindo isso. Denso e leve.

Anônimo disse...

Lindo isso. Denso e leve.

Olga de Mello disse...

Oi, cara, ainda não linkei sua página. Ando muito enrolada! Que bom que vc gostou. Volte sempre.