21.4.06

MulheRio


A partir de segunda-feira, metrôs e trens terão vagões pintados de rosa, destinados apenas a mulheres, por força de lei, para evitar os tarados que adoram se encostar nas moças em ambientes apinhados de gente cansada, correndo pro trabalho ou voltando pra casa.
A partir de segunda-feira, haverá matérias em jornais, telejornais e rádios sobre os vagões cor-de-rosa. Algumas mulheres dirão que o vagão feminino é mais limpinho, mais cheiroso, mais festivo, mais barulhento. Homens afirmarão dirão que é um absurdo, que mulher que vai no vagão feminino é sapata enrustida. Homens lamentarão que tarados se aproveitem para tirar casquinha das mulheres nessas situações.
Enquanto os locutores falarem sobre a inauguração do vagão feminino com um sorrisinho no canto da boca, o povo estará preocupado em inventar um apelido para o vagão da mulherada. E os publicitários correrão para oferecer projetos de propaganda destinados ao público feminino, que serão anunciados em painéis em tons rosa ou pastel. O vagão terá som ambiente diferenciado dos demais. Música suave, new age ou de cantoras de MPB, entoando baladas e sambas românticos. Um leve aroma com sachês estrategicamente escondidos sob os bancos contribuirá para harmonizar o ambiente.
Na terça-feira, durante as viagens, já haverá uma mulher oferecendo jóias, outra, roupas íntimas, a terceira, produtos da Natura, a quarta, da Avon.
E o vagão da mulherada terá tanto sucesso comercial que serão criados ônibus só para mulheres, vans só para mulheres (sem contar as que levam velhinhas tijucanas ao teatro), barcas só para mulheres. Vendedoras de livrinhos de bancas (Júlia, Sabrina etc) estarão nas plataformas, oferecendo produtos de cortesia. No dia das Mães, todas as mulheres receberão uma rosa. Afinal, toda mulher tem vocação física - salvo exceções - para a maternidade.
Para evitar a entrada de homens distraídos no vagão do mulherio, agentes do Desipe convenientemente à paisana estarão alertas, prontas a expulsar os desavisados.
Os únicos seres masculinos por nascença aceitos no vagão serão menores de idade, acompanhados pela mãe ou responsável feminina. Jovens efebos constrangidos, que fizeram exame de fundo-de-olho, mas só fitam o chão mesmo, poderão entrar no vagão e ouvir a mãe explicar às companheiras de viagens o por quê da presença do menino na viagem. Assunto que não rende tanto quando a admiração de todas pelo colarzinho ou pela pulseirinha de tornozelo que a mãe exibe e suas explicações de "ah, isso? Nossa, é tão velha... Comprei numa liquidação da Sloper, se lembra da Sloper, a minha mãe adorava aquela da Nossa Senhora de Copacabana em frente ao Metro, onde hoje tem a C&A? ".
E os homens? Ah, eles ficarão esperando suas damas em casa ou nas estações, doidos para entabular uma conversa passageira sobre a decadência do futebol carioca com o moço que está ao lado.

13 comentários:

Jôka P. disse...

Que texto super legal !
Adorei mesmo !!!
Ah...eu me lembro da Sloper, sabia ?
Agora acho que virou uma livraria, né ?
E ontem mesmo fui na C&A...assim, en passant.Tava tudo mais pra adolescente-Malhação.
Só uso jeans, tenis e camiseta sem estampa.
Não tinha.
bj,
Jôka P.
:D

Anônimo disse...

Olga, sua crônica está deliciosa. Se a iniciativa é válida isso eu já não sei dizer.

Olga de Mello disse...

Menino, minha mãe tinha mania de Sloper. Minha tia falava "siloper", sabe? Mamãe vivia inventando de comprar tudo na Sloper, que tinha uns quatro andares, lembro-me bem. E o ar condicionado do Metro... não há C&A que supere...
Beijo!

Olga de Mello disse...

Sônia, também acho que a iniciativa até se justifica, é muito desagradável aquelas mãos bobas em condução lotada. Mas não vale pensar no que poderia acontecer a partir disso?
beijo

ipaco disse...

O que acho mais problemático é o moralismo à la americana que está sendo importado com essa lei. Nossa mania de copiar as coisas dos americanos é que vamos trazendo aquele puritanismo deles, que faz daquela uma sociedade rica, gorda e infeliz. Viva a mistura! se sou contra colégios só homens ou só de mulheres, não posso ser a favor disso... Mãos bobas? tudo bem, há muitos tarados por aí, mas as mulheres hoje em dia já sabem se defender muito bem.

Eduardo Graca disse...

Concordo com o PT. Abaixo a cultura segregacionista!

Olga, achei seu álbum de fotos. Lindas as imagens. Especialmente as com dona Guiomar. Você me emocionou. De novo. Danada. Saudades.

Olga de Mello disse...

Paulinho, também acho uma bobeira o puritanismo da coisa toda, mas sei o quanto é horrível a gente sofrer com tarado. Lógico que a minoria dos homens tem este comportamento ridículo, mas é muito constrangedor, até porque bom tarado nunca demonstra abertamente sua atitude (senão seria apenas mal educado, não um doente). Enfim, deve ser engraçado um vagão só de mulheres. Igual a clube inglês, sabe?
Saudades! Beijo!

Olga de Mello disse...

Mamãe era linda, não, Edu? Severa, caretésima, brabérrima, mas tão bonita...
Beijo,
Saudades imensas também! E viva a mistureba!

Anônimo disse...

Querida Olga

Não tenho comentários para o vagão cor de rosa. Afinal, passei os últimos 18 anos ensinando à Clara a maravilha que é a convivência entre os sexos. Mas se isso é motivo para vc escrever esse texto maravilhoso, vamos lá. Parabéns. Bjs. Consuelo

Olga de Mello disse...

Companheira albanesa, que alegria em lê-la! Na verdade, eu não sou nem contra nem a favor do vagão para as mulheres, mas acho tão pitoresco quanto os antigos clubes ingleses, só para homens, ou aqueles vagões de fumantes que a gente lia em romances do século XIX.
Melhor que isso, só sua visitinha...
Beijo!

BelowGrade disse...

Quando eu era pequenina (uns 5 ou 6 anos), viajando de onibus com minha avó, eu sentada na beirada do banco, minha vó na janelinha por causa dos calores da menopausa.Veio esse velho indecente se roçar no meu ombro. Comecei a espremer minha vó para me afastar do sujeito e ela, ao notar o que estava se passando, cautelosamente retirou de sua bolsa mágica a fatídica "sombrinha".Qando o cara estava ja a ponto de ejacular no meu ombro, minha vo tascou lhe a sombrinha no instrumento, com tamanha força, que o cara caiu no chão urrando.
Não fosse isso o bastante, minha vó começou a discursar alto, incitando o resto do pessoal no onibus a agir.
O pervertido teve que juntar as poucas forças que lhe restavam para, cambaleando, fugir correndo o onibus por que ameaçavam linchamento.
Por isso, parte de mim, aquela que sofreu com a trogloditisse do ser humano do sexo masculino em diversos níveis, leu com olhos sonhadores esse seu texto. Puxa, um mundo onde mulheres são respeitadas e reverenciadas!
Outra parte, a mais lógica, execrou a idéia. Segregacionismo nunca resolveu nada.
Como o amigo ali em cima citou, a experiencia estadunidense nos mostra que não se pode obter igualdade acentuando diferenças.
Grande parte dos homens não são tarados e assediadores de mulheres. E as mulheres não são vitimas frageis que precisem ser segregadas em containers especiais.
Que o diga a minha avó e sua fabulosa "sombrinha".

Olga de Mello disse...

Ai, ai, ai, e eu que só queria fazer graça com essa idéia doida...Tempos politicamente corretos são fogo!

BelowGrade disse...

Veja como eu sou tapada...
Primeira vez que li o texto achei que era brincadeira.
Dai li os comentarios do pessoal e... achei que parte era verdade.
Tou longe do Brasil... e leio cada coisa absurda que inventam por aí... vai saber.
E dai tem essa coisa de contaminação estadunidense de levar tudo a sério.
Putz... fica braba com eu não...
I need a life!