22.9.06


Um cinemaníaco de alma nômade
O primeiro filme a que Adhemar Oliveira assistiu era de Charles Chaplin, projetado sobre um lençol estendido na lateral de uma caminhão, em alguma cidade do interior de São Paulo. Não consegue se lembrar do lugar precisamente, nem da época. O pai tinha um parque de diversões itinerante e as viagens da família eram freqüentes: "Fui alfabetizado com sete cartilhas diferentes, uma de cada escola em que me matricularam", conta. Por conta das freqüentes mudanças, desenvolveu o espírito nômade na infância, quando também tomou gosto por cinema, o melhor programa para ele e os sete irmãos, nas matinês de domingo. Um gosto que o faz permanecer como diretor de programação dos filmes das 60 salas dos grupos Arteplex, Circuito Cinearte e Espaço Unibanco de São Paulo, distribuídas por sete cidades do País.
"Eu quero cuidar do que é bom, não me preocupar com ar-condicionado", brinca, embora quase não tenha tempo para assistir filmes no escurinho do cinema, exceto quando está fora do Brasil. "Em Cannes, eu me acabo. Vejo oito filmes por dia. Aqui, fico no DVD mesmo", diz.
Fundar uma rede de cinemas não passava pela cabeça do estudante de ciências sociais da Universidade de São Paulo, funcionário concursado do Banco Central. Depois de formado, queria continuar os estudos na Universidade Autônoma do México, onde pretendia ser aluno de Octavio Paz. Adiou o sonho ao se formar e pedir demissão do Banco Central para fazer a programação do Cineclube Bexiga, um dos raros cineclubes brasileiros que não estavam ligados a entidades.
A alma de cigano desse paulista de Jaboticabal voltou a se manifestar em 1982, quando rumou para o Rio de Janeiro, decidido a seguir de navio até o México. Acabou fazendo a programação do Cineclube Macunaíma, da Associação Brasileira de Imprensa. Três anos depois, integrou o grupo de oito pessoas que abria o Coper Botafogo, sala de um velho cinema no fundo de uma galeria ao lado da estação do Metrô de Botafogo. Nascia o empresário. O sucesso do Coper, pioneiro em tirar o chamado cinema de arte do circuito dos cineclubes, levou à criação do Grupo Estação - do qual Adhemar e as sócias Patrícia Durães, Eliane Monteiro e Lúcia Houaiss se desligaram em 1996 -, do Espaço Unibanco de Cinema, do Circuito Cinearte e, finalmente, do Arteplex, que colocou lado a lado os chamados filmes de arte e os comerciais.
"Havia o temor de que a platéia envelhecesse junto com a gente", explica. "Foi uma estratégia para ampliar o público, tão importante quanto as ações culturais que desenvolvemos." Entre essas ações culturais estão sessões abertas para alunos de escolas públicas em várias cidades e para os 10 mil sócios que integram o Clube do Professor.
Atualmente, o Arteplex é a empresa brasileira que mais abre cinemas no país. Até o fim do ano serão inauguradas três salas em Santos (São Paulo) e quatro em Tubarão (Santa Catarina). Em 2007, o Arteplex terá cinemas em Recife (oito salas) e Salvador (cinco salas). "Ainda estamos longe dos 3.500 cinemas que o Brasil tinha na década de 70 do século passado. Mas já foi bem pior. Hoje existem cerca de 2 mil salas", comenta Adhemar, que gostaria de ver uma rede de microcines por todo o país, como acontece na Espanha, onde 90% das cidades têm cinemas. "

(Olga de Mello, para o Valor, do Rio)

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