15.10.07

Elitismo no cinema

O mais incômodo em "Tropa de Elite" é ouvir aplausos ao fim da sessão. O filme é bom, bem feito, atores em excelente forma, a ponto de Wagner Moura não se destacar dos coadjuvantes. Talvez o destaque fique para Milhem Cortaz no papel do Capitão Fábio, corrupto até o fundo da alma, que lembra Nuno Leal Maia fazendo aqueles tipos brutos. A violência grassa solta, torturas, execuções perpetradas tanto por policiais quanto por bandidos. E assina embaixo do discurso que só a classe média faz passeata pela paz, enquanto compra drogas e financia o tráfico, enquanto existem diversos estudos que afirmam que algo em torno de 40% da droga ficam atualmente nos morros, para abastecer moradores que são dependentes. Não que isso justifique a utilização da droga pelo asfalto, porém é um dado.
Por que o espectador aplaude o extermínio dos bandidos? Porque onde o Estado não se faz presente, a barbárie impera, claro. O Estado omisso leva ao banditismo generalizado. Ou são eles ou somos nós, pensa quem está no foco da violência.
Nós, Zona Sul, brancos, do asfalto, estamos ainda a anos luz de distância do que sofre a classe média na Zona Norte e subúrbios. Mas corremos riscos. É fácil apontar a existência dessa violência e pregar a eliminação dela, pura e simplesmente. Jogar napalm nas favelas, mas tirando, naturalmente, a família da nossa empregada, é uma das soluções que já ouvi proferidas em alto e bom som, numa conversa com desconhecidos no Aeroporto do Galeão. Tive que me afastar, porque esse tipo de argumento nem merece resposta.
O filme é bom, repito. Vale a pena ser visto como cinema. A realidade é dura e eu jamais aplaudirei corrupção ou assassinato em massa, mesmo podendo ser morta pelo bandido. Os impostos não deveriam pagar o salário de pistoleiros. O filme mostra um Bope violentíssimo, justiceiro, com total desprezo pelo ser humano. Quem não vê isso na criação de José Padilha e Rodrigo Pimentel só quer enxergar um lado da história e aplaudir atitudes simplistas e criminosas que jamais serão uma solução para a violência urbana.

4 comentários:

Jôka P. disse...

Vi a cópia da cópia da cópia pirata. Gostei e não vou ver novamente no cinema como muita gente diz, mentindo, que vai. Ver um filme duas vezes, só a noviça rebelde quando eu tinha 12 anos de idade, e olhe lá.
Quanto a violência do Bope, mostrada no filme, é aquele papo de que bandido bom é bandido morto.
Só quem nunca sofreu nas mãos desses covardes pode pensar de outra forma.

Olga de Mello disse...

Ih, eu vejo filme de oito a quinze vezes...
Igual a livro, que releio diversas vezes, vejo e revejo filmes.
Quanto à violência sofrida, Jôka, só falta definir quem é covarde: o bandido ou o Estado. O bandido covarde é mais do que reprovável e deve ser coibido, claro. Não faço apologia da violência inocente, pois isso não existe. No entanto, o Estado violento se iguala no banditismo. A situação é horrível mesmo, absurda e surrealista. Mas há maneiras de mudar sem ser apenas pelo acirramento da agressividade.

Eduardo Graca disse...

boa, Olga! daqui de longe sigo menos espantado e mais triste com o fascismo instaurado na classe média brasileira. e parece que ela nem percebe o tamanho do buraco em que está se enfiando. às vezes certas reações conseguem ser ainda mais danosas do que a barbárie original. vejo o filme na semana que entra e depois te conto.

Olga de Mello disse...

Ainda acho que essa reação alarmante das platéias, Edu, deve-se ao estado em que as coisas chegaram. Se o Estado fosse mais presente e melhor preparado, não teríamos tal comportamento.
Não defendo o bandido, não, porém não posso admitir reações passionais como cidadã. É lógico que se alguém massacrar um filho ou um amigo meu, minha reação será impensada. Mas tornar isso uma regra, permitindo que a polícia ou que mineiras se arvorem o poder de julgar quem tem direito a vida é igualarmos toda a sociedade no mesmo nível de banditismo.