25.1.08

Esquentando os tamborins!

Fui uma boa foliã, dos 2 aos 24 anos. Ouvia batuque, já me aprumava. Pulava na rua, nos clubes, no Rio, em outras cidades, no Piauí. Era simplesmente alucinada por Carnaval. Não havia nem discussão em casa. Carnaval era a grande oportunidade que eu tinha de chegar às 6 da manhã, exausta, sem que pai e mãe se indignassem. Isso e Rock in Rio.
Mas aí casei com um anti-folião. Tentei animar meus filhos, arrastar pra Banda de Ipanema, pro Simpatia, pra Banda Boka d'espuma (em tempos botafoguenses, então - a Boka d'espuma sai tarde e passa pertinho de casa, enlouquecida, sempre). Participei de bloco do colégio, essas coisas. Depois, desisti de ser a foliã da família e sosseguei.
Toquei, então, um carnavalzinho nas leituras. Como se pode ver abaixo.

Um mergulho profundo no carnaval
Por Olga de Mello, para o Valor, do Rio


"Almanaque do Carnaval" - André Diniz

Zahar, 272 págs., R$ 39,90


Em lenta evolução, de cadência cautelosa como os compassos dos minuetos cujas coreografias tanto inspiraram cortejos e alegorias carnavalescas, começa a tomar corpo a literatura que estuda o carnaval brasileiro. Embora tenha representação exuberante na ficção, com referências em crônicas, contos e romances de autores consagrados, entre eles Machado de Assis, Jorge Amado, Manuel Bandeira e Mário de Andrade, a bibliografia com estudos e história do carnaval ainda é exígua, afirma o pesquisador André Diniz, que acaba de lançar "Almanaque do Carnaval". "Aos poucos vão surgindo mais e mais títulos, o que mostra que o carnaval assume um caráter além da festividade", diz Haroldo Costa, autor de quatro livros sobre o tema, entre eles o recém-lançado "Política e Religiões no Carnaval" (Irmãos Vitale, R$ 57,00).





Segundo Diniz, foi nos últimos 25 anos que o mundo acadêmico percebeu a importância antropológica do carnaval. "Mesmo assim, a informação pesquisada hoje vira artigo, crônica. Ela demora um mínimo de dez anos para chegar ao livro. É costume dizer que o Brasil pode ser mais bem entendido pelo futebol e pelo carnaval, porém persiste uma resistência à compreensão desses fenômenos", acredita Diniz, que relacionou 60 publicações no índice bibliográfico do "Almanaque do Carnaval". A mais antiga é "Música Popular: Teatro e Cinema", de José Ramos Tinhorão, publicado em 1972 (Vozes).


Para Haroldo Costa, o carnaval oferece aspectos inexplorados para os pesquisadores. Em seu livro, ele se detém sobre o registro da história por meio da crítica política e do misticismo pela menção a Deus e a orixás. "Os sambas-enredo, principalmente, se detêm sobre episódios pouco lembrados de nossa história, preenchendo a lacuna do ensino, que tradicionalmente ignorou figuras como Zumbi dos Palmares e Chica da Silva. As marchinhas, por sua vez, traziam conteúdo crítico, como o 'Bota o Retrato do Velho' ou 'Aonde Está o Dinheiro?', temas desenvolvidos há mais de 40 anos que continuam atuais. Quando se fala abertamente nos orixás na música podemos verificar tolerância e a queda dos preconceitos em relação aos cultos afro-brasileiros", observa.


Autor de "O Livro de Ouro do Carnaval Brasileiro" (Ediouro, R$ 84,00), Felipe Ferreira lembra que a valorização da festa começa com o modernismo. "O tema chega à pintura com exuberância. Ao mesmo tempo, Villa-Lobos se apropria de ritmos estranhos à música erudita, como a congada e o chorinho. Mesmo assim, só agora se percebe que o carnaval pode ser o corte para olhar o Brasil tanto pela economia quanto pela sociologia e até pela geografia", afirma. Já para Diniz, o modernismo via o carnaval por um ângulo estrangeiro: "Os modernistas lançaram as bases para uma visão por uma lente européia. Até um folclorista apaixonado pela brasilidade como Mário de Andrade usa instrumentos elitistas ao falar de carnaval. As produções recentes entendem o Brasil por elas mesmas."


O entendimento do brasileiro por meio do carnaval é defendido por Ruy Castro em "Carnaval de Fogo" (Companhia das Letras, R$ 40,50), no qual conta a história da cidade do Rio. Para o escritor, o caráter do carioca foi formado pela evolução e pela influência do carnaval sobre a vida da cidade. Nada mais natural, portanto, que a narrativa de "Era no Tempo do Rei" (Alfaguara /Objetiva, R$ 36,90), sua primeira incursão na ficção, comece no carnaval de 1810.


Divulgação

Os Filhos de Gandhy invadem Salvador: Adriana Falcão leva deuses gregos fantasiados de orixás às ruas da cidade na sua adaptação da comédia "Sonhos de uma Noite de Verão", de Shakespeare
"Dom João VI era um folião, assim como seu filho, Pedro I, e o neto, Pedro II, que, de acordo com os relatos históricos, se divertia com o entrudo e demonstrava bom humor em relação às brincadeiras da festa. Para contar as molecagens do menino Pedro, que passava sebo na escada para fazer José Bonifácio escorregar, eu quis mostrar essa família carnavalesca", conta Ruy.


Aproveitando personagens ficcionais, porém clássicos, Adriana Falcão também usou o carnaval como ambientação em sua adaptação da comédia shakespeariana "Sonhos de uma Noite de Verão" (Coleção "Devorando Shakespeare", Objetiva, R$ 26,90).


Para tratar de traição, farsa, romance e ciúmes, Adriana leva deuses gregos fantasiados de orixás às ruas de Salvador, sem os tons dramáticos e melancólicos ou francamente dramáticos que apresentam o carnaval na literatura brasileira.


Uma das mais antigas dessas menções é de Raul Pompéia, no conto "O Último Entrudo", publicado em 1883, no qual Pompéia fala nostalgicamente sobre os carnavais de sua mocidade. E sob o pseudônimo do relojoeiro Policarpo, na crônica "Bons Tempos", publicada em 1889 na "Gazeta de Notícias", Machado de Assis lamenta que o carnaval seja insuficiente para aliviar a cidade das aflições, tristezas e cóleras dos outros dias do ano.


Outros carnavais literários


- "O Bebê de Tarlatana Rosa", conto de João do Rio, conta uma paixão no carnaval.


- Em 1919, Manuel Bandeira publicou "Carnaval", com poemas sobre o romantismo e a sensualidade de relacionamentos fugazes.


- O desfecho de "Amar, Verbo Intransitivo", de Mário de Andrade, é durante um desfile de ranchos na avenida Paulista.


- "A Morte da Porta-Estandarte", de Aníbal Machado, descreve um assassinato no centro do Rio.


- O contraste entre o entusiasmo juvenil e a indiferença estão em "Antes do Baile Verde", no qual Lygia Fagundes Telles mostra uma mulher se aprontando para um baile de carnaval, sem ligar para o pai moribundo no quarto ao lado.


- Um concurso de fantasias de luxo e seus participantes são elementos importantes da trama de "Vastas Emoções e Pensamentos Imperfeitos", de Rubem Fonseca.


- "Conto de Verão nº 2: Bandeira Branca", de Luis Fernando Verissimo, mostra um romance de carnaval que atravessa décadas.

Um comentário:

Eduardo Graca disse...

adorei saber disso! quais as chances reais de vc recuperar seu lado folião comigo neste carnaval? vamos momar juntos? sim? SIM!