27.11.17

Sabores e poses

Feirinha de comilança em prol dos refugiados que se abrigam no Brasil. Sábado de sol lindo na Província, uma monte de gente branquíssima se enfileirando para comprar comidas "exóticas" e beber cerveja artesanal. Fora o discurso sobre o aroma frutado e tom ácido da bebida, uma delícia, o chope bem carinho, mas palatável, assim como o lanchinho indiano, que dispensou a bula, porque a vendedora tinha mais do que 40 anos de idade. O chá da moda também só é vendido depois de muita informação sobre odores, sabores e efeitos colaterais benéficos para quem comprar uma garrafinha.
Tem artesanato boliviano confeccionado por nativos que vivem à beira da indigência em suas aldeias andinas. Uma bolsa coloridíssima sai por meros R$ 200. A pequenina, pouco maior que um moedeiro, a R$ 80. Duas coroas se sentam em um banco onde uma jovem mãe amamenta o filhinho. Uma delas amigas faz festa para a criança e fala com saudade da época maravilhosa, do laço entre bebê e mãe. A jovem mãe não sorri. Parece dizer com o olhar sério que a maternidade é um ofício duro, sem alegrias, repleto de sacrifícios para o corpo que merecia descansar e não ter suas forças sugadas por aquele ser parasitário que ela cuida com desvelo, impedida de ingerir álcool ou desfrutar de prazeres garantidos a quem não tem compromisso com a criação de pessoas. Em frente aos bancos, um rapaz de coque ninja corta (mal, muito mal mesmo) cabeleiras de moças despenteadas. O resultado é ruim, mas combina com as roupas desbeiçadas, peles pálidas tatuadas.
Os velhos presentes comem muito. As crianças fazem cara feia para a comida, correm e não querem saber de recreadores que oferecem oficinas de desenho.
As amigas coroas gastaram, cada uma, em torno de 30 reais no lanchinho. Ficaram apenas nas iguarias árabes e indianas. Para experimentar os pratos argentinos, colombianos, nigerianos e peruanos, além de tudo quanto era pão, sorvete, café e docinhos brasileiros, teriam que gastar em torno de 90 reais por cabeça.
Como programa, perde para um dia de praia.
Como caridade, fica impossível para bolsos combalidos por tantas crises.
A causa é nobre, o dinheiro, infelizmente, curto. A pose, essa foi perdida junto com as ilusões.

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